//​Labour 2030, o futuro do trabalho chegou. Estamos ou não preparados?

​Labour 2030, o futuro do trabalho chegou. Estamos ou não preparados?

Vai ser um robot a dar as boas-vindas aos quase 500 participantes na 2.ª edição do Labour 2030, que decorre a 19 e 20 de setembro, na Alfândega do Porto. É apenas um sinal dos temas que vão dominar “a maior discussão mundial sobre o futuro do Trabalho”, como se lhe referem os organizadores do Congresso: perceber o que já está a acontecer no mundo do trabalho, as mudanças que se esperam e como é que se pode antecipar o futuro das relações laborais.

Os robots vão ficar com os nossos empregos? Se calhar, alguns

O trabalho do futuro terá cada vez mais domínio da robótica e da inteligência artificial e menor participação humana.

Mas atenção: os robots podem ajudar o Homem, mas dificilmente o poderão substituir naquilo que é a sua essência humana, que tem a ver com a inteligência emocional, alerta Eduardo Castro Marques, membro da Law Academy, uma das entidades responsável pela organização.

Em entrevista à Renascença, o jurista diz que devemos olhar para esta nova era e sentirmo-nos “homens com superpoderes, ver os robots como um auxílio que prestam ao Homem para que este tenha mais capacidades e competências do que tinha no passado”.

E confirma a pergunta que muita gente faz quando se fala destes novos “elementos”: como é que vão ficar os nossos empregos? Eduardo Castro Marques recorre aos estudos e à História (por exemplo, a Revolução Industrial) para argumentar que “no final, o saldo é positivo”. Ou seja, “vamos ter mais emprego do que tínhamos antes, mas não há dúvida que há empregos, sobretudo os relacionados com tarefas mais rotineiras, que podem ser rapidamente substituídos por robots ou por determinado software.

Portanto, para os trabalhadores, o desafio é claramente o de se adaptarem e requalificarem para as novas tarefas que lhes são exigidas. Ou acabam, inevitavelmente, no desemprego. “Há quem vá sofrer muito com este processo, mas também há uma franja cada vez maior que vai aproveitar, ter novos e melhores empregos”.

É preciso ter direito a desconectar-se da trela eletrónica

A realidade mostra-nos como uma espécie de novos escravos, agora das tecnologias: o computador tornou-se um instrumento obrigatório, não largamos o telemóvel, dormimos com ele à cabeceira e sentimo-nos perdidos quando o esquecemos em qualquer lado; estamos permanentemente conectados.

Em muitos casos, as tecnologias sobrepõem-se às relações pessoais e familiares. “Sempre que aparece uma tecnologia, usamo-la sem freio, sem balizas”, argumenta Eduardo Castro Marques. Nas relações laborais, tem mais aspetos negativos do que positivo s por que “não se pode concluir que o trabalhador com a trela eletrónica seja necessariamente mais produtivo. E é por isso que hoje já se discute o Direito à Desconexão”.

O especialista em Direito do Trabalho sublinha que já há empresas que, no seu regulamento interno, preveem a desconexão. Regulam a forma como os seus trabalhadores devem usar, por exemplo o e-mail, proibindo-os de fazer envios durante os fins-de semana e feriados ou num determinado horário. Há outras que estão a avançar com a desinstalação do e-mail nos telemóveis profissionais. “Causam uma pressão e uma tensão enormes sobre os trabalhadores que, muitas vezes, é desnecessária”.

Para Eduardo Castro Marques, a intensidade com que desempenhamos as tarefas no nosso universo laboral exige uma permanência de contacto que interfere naquilo que devia ser a tranquilidade das nossas relações familiares e sociais. Um desafio difícil de resolver porque “a médio prazo, com a tal trela eletrónica, a relação laboral acaba por se deteriorar”.

Ainda assim, o advogado não é partidário de novas alterações à legislação do trabalho no sentido de equilibrar a relação entre este uso intenso de tecnologia e os direitos dos trabalhadores. Defende antes uma mudança de paradigma “porque já existem várias leis inscritas que só precisam de ser cumpridas” e considera que a ACT – Autoridade para as Condições de Trabalho – pode ter um papel importante a nível pedagógico e de fiscalização.

Uma nova geração à procura de felicidade no Trabalho

“Em muitos casos, passamos mais tempo no trabalho do que com a nossa família ou a realizar os nossos hobbies pessoais, com os nossos amigos, etc. Se passamos a maior parte do tempo a trabalhar, então passa a ser importante que nos realizemos, que sejamos felizes no trabalho que temos”, conclui Eduardo Castro Marques.

Alerta que, para as novas gerações, as preocupações já não são a precariedade ou os baixos salários, mas sim a realização pessoal no trabalho, a conciliação da vida pessoal e familiar.

“Hoje, a prioridade não é ter emprego para a vida e fazer sempre a mesma coisa; é, antes, escolher bem onde se trabalha, a experiência, a realização, o crescimento profissional, sem nunca abandonar as prioridades pessoais”.

Doenças oncológicas e crescimento dos riscos psicossociais exigem respostas legais

As doenças oncológicas e o aumento das doenças profissionais e psicossociais também estão na agenda do Labour 2030.

“O mundo empresarial ainda não encontrou uma resposta para esta nova realidade”, afirma Eduardo Castro Marques. “Saber se um trabalhador recuperado, sobrevivente de cancro, deve ou não ter um horário diferenciado; que tipo de tarefas? Como se adequam? Como é que o trabalhador vai executar as suas funções num estado de degradação progressivo relativamente à doença? São alguns dos exemplos referidos pelo especialista em Direito do Trabalho, sublinhando que o objetivo do Labour 2030 é trazer o tema para a discussão: levar a estudos e investigação, emissão de opiniões e “pressionar” o legislador a olhar para estas questões. “O legislador deve perceber que os desafios, hoje, são outros”.

Falar do futuro do trabalho em véspera de eleições… com partidos a discutir alterações à legislação laboral

Eduardo Castro Marques rejeita o “ajuste” da data do Labour 2030 à época eleitoral. “Foi uma casualidade positiva, não queremos fazer política, mas se pudermos contribuir para determinadas soluções, ótimo!”

Por isso, há um painel de debate com os principais partidos candidatos às legislativas de 6 de outubro, assim como com os parceiros sociais.

O ponto de partida vão ser as recentes alterações à legislação laboral, mas para ir mais além, avisa o jurista: ainda discutimos o prazo dos contratos a termo, o período experimental. “Não digo que não seja importante, mas há outros temas que já preocupam mais os trabalhadores. E o legislador também devia adaptar-se”.

Labour 2030: dois dias, 150 oradores de 30 países e muito debate

A Alfândega do Porto recebe o Labour 2030 a 19 e 20 de setembro com dois dias intensos de trabalho, em grande parte do tempo, com sessões paralelas.

Novas tecnologias, robotização, inteligência artificial e o impacto no contexto laboral. As novas formas de trabalho, as startups, cibersegurança, proteção de dados ou propriedade intelectual.

Mas também o futuro da legislação na União Europeia, as novas tendências reivindicativas a nível transnacional e as competências para os trabalhadores no mercado de trabalho da indústria 4.0. Não menos importante, as respostas a dar em casos de doenças oncológicas e o crescimento dos riscos profissionais e psicossociais. São alguns dos temas.

Estão inscritos cerca de 500 participantes para ouvir 150 oradores, oriundos de quase 30 países.

A organização do Labour 2030 é da Law Academy, em parceria com a Sociedade de advogados Cerejeira Namora, Marinho Falcão e Associados; OIT – Organização Internacional do Trabalho, ACT – Autoridade para as Condições de Trabalho, Associação de Jovens Juslaboralistas; Cielo Laboral – Comunidad para la Investigación y el Estudio Laboral e Ocupacional, APODIT – Associação Portuguesa de Direito do Trabalho e o IPOJUR – Instituto Brasileiro de estudos e Pesquisas em Ciências Políticas e Jurídicas.

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