//“A Inteligência Artificial vai proporcionar avanços na qualidade de vida”

“A Inteligência Artificial vai proporcionar avanços na qualidade de vida”

Esta semana, a Confederação Empresarial Portugal apresentou um estudo onde se revela que a região Norte será a que mais vai sofrer com a entrada progressiva dos robôs e da inteligência artificial no mercado de trabalho em Portugal, estimando-se o desaparecimento de mais de 400 mil empregos.

Um outro estudo, agora da Oxford Economics, prevê que cada robô industrial vá eliminar 1,6 empregos – e quem perde o seu posto de trabalho tenderá a mudar-se para outras áreas… também elas sujeitas à “invasão” das máquinas.

Em entrevista à Renascença, o presidente do Instituto Superior Técnico admite que nenhum setor será poupado. Mas nem tudo são más notícias. E Arlindo Oliveira fala em “transformação”.

Com a evolução da tecnologia os empregos estão de facto em risco ou vão adaptar-se?

Eu acho que vai haver uma transformação. Muitas posições vão ser substituídas progressivamente por tecnologia, mas também vão ser criados novos empregos, nem tudo é negativo.

Mas estes novos empregos serão suficientes para substituir os que são destruídos?

É uma pergunta a que ninguém sabe responder, mas admitamos que vai ser criado o número suficiente de empregos. A segunda pergunta é saber se as pessoas que vão deixar de ter empregos e vão ser substituídas pelas tecnologias têm as competências certas para irem para os novos empregos. Aqui a questão é menos óbvia, porque há muitas pessoas que não terão as competências certas, não poderão ir de condutores para web designers, ou de varredores de rua para gestores de redes sociais. Há um esforço grande de formação e adaptação das competências que, como sociedade, temos de encarar.

O ensino já está adaptado ou aqui também ainda há ainda muito a fazer?

O ensino formal, secundário e universitário, é bastante bom e, embora possa ser adaptado, não é aí que se notam as grandes deficiências.

No ensino menos tradicional, na formação ao longo da vida, na adaptação das pessoas a novas competências, de pessoas que já estudaram há 10, 15 ou 20 anos e precisam de aprender novas tecnologias e também mais jovens que não seguem a universidade mas precisam de ter uma formação sólida — esta segunda parte pode ser executada por outras instituições, desde os politécnicos até outras escolas.

“Qualquer tarefa que seja muito repetitiva e que tipicamente até não dá muito gozo às pessoas é a mais ameaçada, a que é mais fácil de ser substituída”

Na parte da formação ao longo da vida acho que é importante que todas as universidades e muitas instituições se posicionem para fazer isso. No Técnico lançámos há um ano o “Técnico +”, que são os recursos ao longo da vida de formação avançada de executivos, mas também formação para especialistas, reconversão e novas tecnologias. Estamos a tentar cumprir uma missão de dar formação avançada a todas as pessoas, em qualquer fase da sua vida.

Em termos de setores, quais diria que estão mais ameaçados neste momento?

Regra geral, os setores mais ameaçados são aqueles onde existe muita repetição das mesmas tarefas. No outro dia, numa conferência, um senhor dizia “se o seu trabalho é aborrecido, provavelmente vai ficar desempregado”, e isto pode ser desde um rececionista até uma pessoa que processa formulários e os põe num computador, ou uma pessoa que olha para câmaras de vídeo para ver se existe algum problema de segurança. Portanto, qualquer tarefa que seja muito repetitiva e que tipicamente até não dá muito gozo às pessoas é a mais ameaçada, a que é mais fácil de ser substituída. Por exemplo, a profissão de condutor é relativamente repetitiva, embora exija sofisticação e competências. Por outro lado, quanto mais criativo for o trabalho, quanto mais inovação exigir, mais seguro está, porque a tecnologia vai demorar mais tempo a chegar lá.

Na banca, por exemplo, aquilo a que temos assistido é que os funcionários estão a ser substituídos pelos próprios clientes, com instrumentos como o homebanking…

Porque muitas dessas tarefas eram relativamente repetitivas. Os caixas foram quase os primeiros a ser substituídos – receber a pessoa, identificá-la e dar-lhe dinheiro, foram substituídos pelas ATMs [multibanco]. Mas depois há muitas outras tarefas parecidas, como descontar cheques, que passaram para os clientes, que fazem isso com muito pouco trabalho, ir a um ATM é muito mais prático do que ir a uma caixa onde havia uma fila. Pedir um empréstimo num telemóvel é muito mais prático do que ir a uma agência e ter alguém a analisar o empréstimo. É verdade que muito desse trabalho foi passado para os clientes, e os clientes fazem isso num minuto ou dois, em vez de gastarem uma hora no banco a falarem com uma pessoa.

Os supermercados são outro exemplo já visível.

Nos supermercados, embora curiosamente tenham resistido mais do que eu até estava à espera, continuamos a ter grandes filas nas caixas. Eu pessoalmente ou uso o home delivery ou a caixa self-service.

Nós somos muito conservadores, não queremos adotar as novas soluções, mas parece-me claro que mais tarde ou mais cedo, e à medida que as novas gerações vão ganhando mais, vamos vendo uma maior adesão aos novos modelos, onde as pessoas que estão na caixa são menos importantes e até mesmo o próprio processo de gestão de stocks e de reposição das prateleiras poderá vir a ser parcialmente automatizado, pelo menos no futuro não muito distante.

O consumidor acaba por ter um papel essencial na substituição dos funcionários, não se trata apenas de tecnologia e automatização, o cliente assume algumas funções do trabalhador.

Quando conseguimos pôr a inteligência no sistema de interface, seja numa app no telemóvel ou numa interface na web, o próprio cliente pode fazer uma componente grande do serviço, em vez de ficar dependente do funcionário. As empresas têm um incentivo grande para fazer isso, uma vez que poupam custos e os clientes também estão dispostos, uma vez que tipicamente também poupam tempo.

A Inteligência Artificial ainda é considerada uma ameaça para muitos, uma ajuda e um grande salto na qualidade de vida para outros. Qual é a sua opinião?

Eu sou otimista, penso que na maior parte dos casos a Inteligência Artificial e as suas diversas aplicações vão proporcionar avanços na qualidade de vida. Isso não quer dizer que a tecnologia em si não vá ser usada pelas empresas também para cortar custos e despesas. Desse ponto de vista, pode constituir-se como uma ameaça, na tal componente de redução de custos com redução de empregos. Mas, de uma forma geral, vejo a IA como uma coisa positiva.

“As notas vão desaparecer rapidamente, as moedas talvez se aguentem um bocadinho mais, é uma coisa prática. Acho que na próxima década vamos assistir a uma grande redução da utilização do dinheiro físico”

Por exemplo, num telemóvel estamos a usar IA, todo o processo de comunicação com as torres usa métodos adaptativos que são uma forma de IA. Acho que, neste momento, já não conseguiríamos viver sem Inteligência Artificial.

Como imagina a nossa vida, o nosso quotidiano, dentro de 30 anos?

É difícil responder. Se andarmos 30 anos para trás estávamos em 1990, a internet era quase inexistente, eu por acaso já usava mas era uma coisa absolutamente nascente. Se imaginarmos que, nos próximos 30 anos, vamos ver tanta evolução como nos últimos 30, algo que não é inteiramente certo, é realmente difícil antever.

Acho que vamos conviver com sistemas muito mais inteligentes do que agora, desde carros a agentes com quem falamos, assistentes a quem pedimos coisas, vai haver mais inteligência nos sistemas digitais, nos computadores, nas coisas com que interagimos, as casas vão ser mais inteligentes, os frigoríficos se calhar vão mandar vir do supermercado os ovos quando faz falta.

Se teremos coisas muito mais radicais do que isso, se teremos agentes inteligentes, que veremos quase como equivalentes a seres humanos em alguns aspetos, é um bocadinho mais difícil de prever, porque não sei se vai acontecer em 20, 30 ou 50 anos, ou se nunca vai acontecer. Depende da evolução tecnológica e é difícil de prever a esta distância.

E o dinheiro físico, vai terminar?

Estou convencido que sim. As notas vão desaparecer rapidamente, as moedas talvez se aguentem um bocadinho mais, é uma coisa prática. Mas acho que é sempre mais prático passar o telemóvel ao pé de um ponto qualquer e ser tudo transferido.

Qual é a previsão para isso acontecer? Até quando vamos pagar em notas e moedas?

Não tenho uma previsão, mas acho que na próxima década vamos assistir a uma grande redução da utilização do dinheiro físico.

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