Apesar dos prejuízos causados pelos bancos aos contribuintes nos últimos anos, Carlos Albuquerque considera que se tem feito um bom trabalho na vigilância da banca. O administrador executivo da Caixa Geral de Depósitos e antigo diretor de supervisão prudencial do Banco de Portugal (entre novembro de 2014 e janeiro de 2017) lançou o livro Os bancos portugueses e o Mecanismo Único de Supervisão, em que faz uma análise ao que mudou com a União Bancária.
Mas, afinal, com as decisões sobre a banca a estarem nas mãos do Banco Central Europeu, a supervisão é atualmente mais eficaz do que quando era responsabilidade exclusiva do Banco de Portugal? Carlos Albuquerque considera, em entrevista ao Dinheiro Vivo, que “com um mecanismo desta natureza, temos as melhores práticas aplicadas a todos os países que fazem parte da União Bancária”. Mas defende que “Portugal tinha práticas muito boas, que no resto da Europa não existiam. Portugal estava tão ou mais avançado do que os outros países europeus”.
Mas, se era assim, como foi possível acontecer casos como os do BPN, BES e Banif? “A supervisão não é perfeita nem infalível e nunca o irá ser”, justifica. Sem querer abordar casos específicos, Carlos Albuquerque defende que “em termos gerais diria que a supervisão tem feito um bom trabalho”. Questionado sobre se entende que essa também é a perceção da opinião pública, o antigo responsável do Banco de Portugal reconhece que “as pessoas gostariam que não acontecesse nada”.
Contrafactual “impossível”
Carlos Albuquerque realça que crises em bancos não aconteceram apenas em Portugal. Foram “situações parecidas ao que aconteceu em Espanha, com as cajas económicas, em Itália com bancos também em dificuldades”, diz. Mas se no passado o supervisor financeiro em Portugal tivesse as ferramentas que tem atualmente seria possível evitar colapsos como os que aconteceram no BPN, BES e Banif?
“É impossível medir isso. Não podemos encontrar o contrafactual de algo que foram casos concretos. Se calhar a probabilidade era menor do ponto de vista sistémico e global, não estou a falar de casos específicos.”
O antigo responsável do Banco de Portugal defende que “os instrumentos que existem hoje [à disposição dos supervisores] são bastante mais potentes do que no passado”. No entanto, ressalva que isso não implica que a supervisão em Portugal não tivesse qualidade antes da União Bancária. “Acho e continuo a achar que a supervisão em Portugal era uma boa supervisão e ficou ainda melhor com o Mecanismo Único de Supervisão”, diz.
A “supervisão intrusiva”
Carlos Albuquerque calcula que desde 2007 os bancos portugueses assumiram entre 45 mil milhões e 48 mil milhões de euros de imparidades. “O período mais intenso foi entre 2011 e 2014 com quase seis mil milhões de euros de imparidades”, avança o especialista.
Utiliza estes valores para tentar demonstrar que os bancos portugueses não demoraram, durante a crise, a reconhecer as perdas de forma a adiar aumentos de capital. “Um dos temas que abordo no livro é sobre esse tema específico. Na altura colocavam-se duas formas de agir, uma que era conhecida como a solução irlandesa e outra, a que adotámos, de uma absorção continuada dos prejuízos”, explica.
Carlos Albuquerque detalha que a “solução poderia implicar, se calhar, a nacionalização de toda a banca”. Estima que “se todos os bancos tivessem querido fazer uma limpeza, todas as necessidades de capital seriam entre 40 mil milhões e 50 mil milhões”, valor que teria de ser pedido à troika. Já sobre se o valor da operação de recapitalização da CGD em 2016 foi excessivo, como defendeu Paz Ferreira (antigo presidente da comissão de auditoria do banco), não quis fazer comentários.
Na banca portuguesa há quem se queixe de que as autoridades europeias são mais duras para as entidades nacionais. No entanto, Carlos Albuquerque diz que não encontra diferença na “supervisão europeia entre os bancos portugueses e o resto dos bancos da União Bancária. A supervisão é mais intrusiva e exigente. O representante da associação de bancos alemães diz o mesmo”.
E não receia que exista uma espanholização da banca portuguesa devido à União Bancária. “O objetivo é que no futuro todos os bancos europeus sejam domésticos”, defende o administrador da CGD. Realça que os bancos espanhóis têm maior dimensão do que os portugueses e que, como aconteceu em outros setores, “é muito natural que as empresas espanholas se expandam para Portugal”. Exemplifica com o caso da Zara que teve no Porto a “sua primeira operação internacional”.
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