E, especificamente, no caso dos recém-licenciados?
Em Portugal os salários médios são muito baixos, comparados com o resto da Europa. Como temos recursos bem qualificados, bom talento na nova geração e um bom sistema de ensino superior que forma excelentes profissionais, muitos deles acabam por sentir-se atraídos por uma carreira internacional onde têm melhores condições.
Isso não é necessariamente mau, se for dentro de uma certa medida e se houver incentivos para regressar. Porque, uma pessoa que faça uma carreira lá fora, que ganhe rede internacional e que passado dez ou 15 anos regresse, traz para o país uma mais-valia.
Eu, por exemplo, estive 15 anos no estrangeiro, na Universidade de Stanford, a fazer o doutoramento e depois 12 anos no INSEAD, como professor de empreendedorismo, e quando voltei para Portugal, em 2015, tinha de facto uma rede de contactos e uma experiência que me valeu muito no regresso a Portugal e que me tem ajudado a contribuir para o país.
Temos é que conseguir atrair talentos internacionais, jovens e carreiras “mid-level”, para virem para Portugal. Se houver de facto mobilidade, em que alguns talentos vão para fora, eventualmente alguns regressam, e talentos de fora vêm para Portugal, eu acho que não há problema. O problema é quando o movimento é apenas de êxodo sem entradas.
Portugal e Lisboa, em particular, têm condições para ser um hub de talento a nível internacional e tem que haver uma aposta forte nisso.
Isso é uma tarefa do Governo ou também das empresas?
Começa no Governo, por criar um contexto económico e fiscal favorável para atração de talentos internacionais. Falamos não só de condições económicas e de impostos, mas também, por exemplo, uma melhoria dos serviços de imigração e fronteiras, porque muitas vezes a obtenção de um visto acaba por ser um bloqueio grande à mobilidade dos alunos.
O Governo tem que fazer a sua parte e a administração pública, em geral, tem que acolher bem os internacionais.
A sociedade portuguesa é acolhedora. A indicação que nós temos é que os alunos, o staff internacional, sente que Portugal tem uma sociedade acolhedora e há várias dimensões em que funciona muito bem, noutras, algumas burocráticas e fiscais, menos bem e é um desincentivo.
E o papel das empresas?
As empresas respondem muito a incentivos e oportunidades. Se houver incentivos e oportunidades de atrair talento internacional para vir para Portugal para criar centros de competência, criar mais startup ou para investir em filiais portuguesas, acho que as empresas vão responder a essas condições.
As universidades propõem por ano a abertura de cerca de 300 novos cursos. Não faz mais sentido apostar no aumento de vagas em cursos como Medicina, Enfermagem e Gestão, setores que têm manifestado dificuldade em recrutar?
É fundamental que haja uma boa adaptação da oferta de ensino superior ao mercado de trabalho. Por exemplo, talvez seja importante valorizar o ensino técnico profissional, porque muitas das vagas que existem hoje em dia nas empresas ou em certas áreas de serviços são de caráter mais técnico do que de ensino universitário.
A Católica abriu o ano passado um curso de Medicina porque havia, de facto, uma oferta muito limitada para a procura e para a necessidade de médicos em Portugal. Aí, o setor privado colmatou alguma ineficiência e alguma rigidez do sistema de ensino público na área da Medicina. E, claramente, em certas áreas de Gestão. Nós, na Católica, temos empregabilidade de 100% dos nossos graduados, tanto os de mestrado como os de licenciatura.
O mercado tende a absorver em certas áreas. Mas tem que haver também um cuidado de não sobredimensionar a oferta, em particular do setor público, face à demografia que vamos ter. Vamos ter um número mais reduzido de alunos para o ensino universitário nos próximos anos.
Agora, com o PRR está a haver um aumento muito grande de cursos aprovados e um inchar da oferta do ensino superior público, de novos cursos e novas áreas, isso pode ser apanhado em contrapé face à demografia e ao número de alunos que vêm para o ensino superior. Há aqui um equilíbrio que tem que ser pensado em termos de sistema, que é importante.
Apoia a possibilidade dos politécnicos concederem doutoramentos?
Se o mercado de trabalho requer um aumento de pessoas qualificadas com ensino técnico-profissional, não sei se a aposta nos doutoramentos dos politécnicos é a resposta, quando já há uma oferta muito grande de doutoramentos ao nível das universidades.
Em relação ao país, temos um problema de gestão? Faço esta pergunta a pensar em situações como o caos na saúde ou a eterna indecisão sobre o novo aeroporto. Há política a mais e gestão a menos nos órgãos de decisão?
Há falta de organização, às vezes sistémica, em Portugal. A falta também de capacidade de decisão, de ouvir todos, decidir e avançar com essa decisão, sem mudar a meio do caminho.
A questão do novo aeroporto é um exemplo disso, andamos há 20 anos a pensar no novo aeroporto, enquanto outros nesse período de tempo já construíram dois ou vários. Tendo em conta que uma das áreas competitivas de Portugal é o Turismo e que este chega ao nosso país periférico através dos voos, a capacidade aeroportuária é fundamental e essa deveria ser uma prioridade.
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