Um ano excecional. É desta forma que as agências de viagens qualificam 2023. “Foi, provavelmente, o ano em que os portugueses mais viajaram e mais pagaram para viajar”, diz à Renascença o presidente da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT), Pedro Costa Ferreira. Esta quarta-feira é Dia Mundial do Turismo.
Tendo em conta o peso que estas empresas têm no fenómeno global de viagens em Portugal e na forma como os portugueses viajam, Costa Ferreira arrisca dizer que, provavelmente, nunca se viajou tanto, nem nunca se pagou tanto para ir de férias, como neste ano, no país.
Apesar de este balanço ir só até ao final do verão, o líder da APAVT acredita que o mesmo não será muito diferente no final de 2023. Até porque a operação em volume e em preço para o fim de ano está em linha com os primeiros nove meses.
Costa Ferreira acredita num crescimento de dois dígito no volume para as agências de viagens, que pode corresponder a “mais de 10%”, e no preço pago que pode variar em média “entre os 7% e os 8%”.
O mercado é, em relação ao valor, muito heterogéneo. “Quanto ao aumento do preço, depende muito dos destinos trabalhados. Há destinos que tiveram aumentos superiores a 15% e há destinos onde o aumento do preço quase não se fez sentir devido à concorrência”, concretiza.
Um exemplo deste fenómeno, detalha, são as Caraíbas, onde a forte concorrência entre agências não permite que os preços subam muito.
Novas tendências
Em relação às preferências dos portugueses, o presidente da APAVT sublinha que o mercado nacional é eclético e diverso, mas tem já alguma “senioridade”. Ainda assim, este ano trouxe novidades, como um voo charter novo para a Sardenha, na Itália, outro para o Zanzibar e a consolidação “do Senegal como destino”.
Sem apontar qual o país ou região para onde os portugueses mais viajaram este ano, o líder associativo adianta que o sucesso aconteceu em geografias mais clássicas como a Tunísia, Marrocos, Caraíbas, Cabo Verde, ilhas espanholas, Espanha continental, Açores e Madeira.
O sucesso deste ano para o setor das viagens não surpreendeu as empresas, porque “era expectável” desde o início de 2023. A causa foi “o movimento de reservas antecipadas”, que o responsável ressalta como “absolutamente extraordinário”. “Indiciou-nos que ia correr muito bem”, lembra.
Ainda assim, nem tudo são rosas. No horizonte, Pedro Costa Ferreira vê “a chegada da inflação à vida dos portugueses, através da subida das taxas de juro e a perda de poder de compra” como nuvens no horizonte das empresas.
“Mais cedo ou mais tarde são questões que se vão colocar nas nossas estratégias. O setor das viagens geralmente é muito, muito, sensível às variações do poder de compra”, sublinha.
O que mudou com a Covid-19?
Passada a pandemia da Covid-19, com o fim decretado pela OMS, há alguma coisa que tenha mudado de forma estrutural na forma como os portugueses viajam?
Pedro Costa Ferreira acha “que não houve grandes alterações de tendências de consumo, mas naturalmente houve uma aceleração dessas tendências”.
“O que mais noto que mudou foi a confiança nas agências de viagens, se calhar é por isso que nós estamos a alcançar estes resultados tão importantes”, sublinha.
A explicação, acredita, é que durante a pandemia as agências de viagens “se destacaram não apenas pelo modo como resolveram os problemas de quem precisava de viajar, mas também, e se calhar, sobretudo, pelo modo como resolveram o problema dos reembolsos das pessoas que tinham reservado e que não puderam viajar”.
“Isto em contraste com muitos outros setores de vendas na internet e nos grandes sites”, contrapõe.
O presidente da APAVT diz que o mundo está mais incerto e inesperado e isso tem representado uma boa oportunidade para as agências de viagens.
“Em agosto deste ano, as agências de viagens bateram o recorde de emissão de passagens aéreas em voos regulares, incluindo as low-cost. Foram mais de 80 milhões de euros”, remata.
Receitas dos hotéis aumentam sem crescimento das dormidas
Do lado da hotelaria, o balanço é positivo. Contudo, o crescimento das receitas não foi impulsionado por um crescimento das dormidas em hotéis, mas sim pelo aumento dos preços, de acordo com o presidente da Associação de Hotelaria de Portugal (AHP), Bernardo Trindade.
“Neste segundo semestre temos um efeito planalto, em que os níveis de ocupação são sensivelmente os mesmos um pouco por todo o país, podendo, obviamente, diferir mês após mês, mas com uma melhoria do preço médio, e isso, levou a que, do ponto de vista da receita, tivéssemos um comportamento globalmente positivo”, explica o representante do setor.
Os resultados positivos são ainda causados pelo “trabalho que Portugal desenvolveu” quanto à visibilidade do país, permitindo “a recuperação de um conjunto de mercados muito importantes para Portugal” como o dos Estados Unidos da América, do Canadá e do Brasil. Tudo isso possibilitou uma “recuperação mais rápida” do turismo em Portugal.
Ainda sem números concretos das taxas de ocupação durante o verão, Bernardo Trindade aponta para a Madeira como líder da evolução positiva. A única região onde o comportamento das dormidas foi pior, nos meses de junho e julho, em comparação com 2022, foi o Algarve.
Bernardo Trindade admite que os aumentos de preços podem ter tido impacto na procura de clientes portugueses, mas elabora duas hipóteses: ou os portugueses “optaram por fazer férias noutros destinos portugueses”, fora de hotéis, ou “noutros destinos estrangeiros”. A pista, diz, é o crescimento dos gastos dos portugueses nas importações de viagens e turismo.
Para 2024, “há um cenário de estabilidade”, mas o presidente da AHP diz que é necessária prudência nas previsões.
“Os sinais externos são ainda sinais preocupantes. Nós estamos a viver uma guerra e as previsões do Banco Central Europeu apontam para um quadro recessivo no final de ano e no próximo ano em determinados países”, aponta Bernardo Trindade.
O representante do setor da hotelaria reconhece ainda o impacto destes indicadores na atividade turística, que “depende muito do comportamento dos mercados externos”.
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