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O primeiro passo para acabar com a discussão que dura há mais de meio século está dado. A Comissão Técnica Independente (CTI), mandatada pelo governo para avaliar as opções estratégicas para aumentar a capacidade aeroportuária da região de Lisboa, apresentou o veredicto depois de um ano de estudos. Construir um aeroporto de raiz no Campo de Tiro de Alcochete (CTA) e manter, entretanto, o Aeroporto Humberto Delgado (AHD) em operação é a melhor solução para responder à falta de capacidade aeroportuária da capital a longo prazo. A solução dual deverá funcionar até que o aeroporto no CTA consiga funcionar sozinho e assumir o palco como hub de Lisboa.
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“O modelo dual é inevitável. O AHD só pode fechar quando houver uma pista com capacidade de o substituir. É, portanto, a solução dual que terá de avançar em primeiro lugar, com um aeroporto complementar no local onde haja capacidade para se tornar aeroporto único com proximidade à cidade de Lisboa”, afirmou ontem a presidente da CTI. Durante a apresentação da versão preliminar do relatório de análise estratégica e multidisciplinar do aumento da capacidade aeroportuária da região de Lisboa, que decorreu nas instalações do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), Maria do Rosário Partidário garantiu que “um hub intercontinental funciona melhor também com um aeroporto único”. Sobre o tempo necessário para ser construída a primeira pista em Alcochete, a coordenadora da área de planeamento aeroportuário da CTI, Rosário Macário, afiançou que “dificilmente” estará pronta em menos de sete anos. Já a segunda pista poderá levar “entre oito a nove anos a estar concluída”e, nessa altura, a Portela poderá, então, ser desativada para que Alcochete funcione sozinho.
Mas é certo que o AHD feche portas? A coordenadora da CTI respondeu que “o futuro o dirá”. “Dependerá de várias circunstâncias e incertezas. O AHD deve fechar do ponto de vista de saúde pública, mas é um ativo financeiro fortíssimo. Dependerá de alguma maneira daquela que for a evolução das incertezas. O contrato de concessão perspetiva também o AHD como aeroporto único e por isso deve fechar”, justificou. O relatório preliminar, que pode ser consultado na plataforma aeroparticipa.pt, defende que “as razões ambientais e de saúde pública justificam o fecho ou uma redução significativa de movimentos no AHD, admitindo que a evolução tecnológica permitirá mitigar, a prazo, os atuais efeitos mais negativos do aeroporto”. Mas aponta, por outro lado, argumentos para adiar o encerramento. “Por razões de acessibilidade, menores distâncias e, portanto, menor pegada carbónica, e por razões económicas e financeiras, uma vez que se trata de uma infraeaestrutura já existente, poderá fazer sentido prolongar a vida útil do AHD no curto/médio prazo”, lê-se. Ainda assim, contratualmente, “a previsão do procedimento do Novo Aeroporto de Lisboa (NAL), sendo seguida, conduz ao fecho do AHD, porque o NAL está concebido como aeroporto de substituição do AHD. Portanto, esta decisão terá que ser tomada no futuro, quando existirem condições para o encerramento do AHD, o que obriga a que a nova infraestrutura esteja então a funcionar em pleno”, indicam as conclusões da CTI.
Já no capítulo dos custos, a obra no CTA carecerá de um investimento de oito mil milhões de euros. “Todas as opções são financeiramente viáveis, não sendo necessário financiamento público para a construção do novo aeroporto”, sendo este realizado através das taxas aeroportuárias, clarificou também Rosário partidário.
Vendas Novas em segundo lugar
É também na Margem Sul do Tejo que está a segunda opção mais bem classificada pela CTI: a solução dual que combina a Portela com Vendas Novas. Também aqui, a ser escolhida, o objetivo é que Vendas Novas se torne na única infraestrutura aeroportuária progressivamente. Mas, apesar de bem classificada, há desvantagens face ao CTA. Para a CTI, Alcochete surge na primeira posição, acima de Vendas Novas, apresentando mais vantagens pelo facto de se tratar de “um espaço público e Vendas Novas envolver expropriações” e pelo fator de proximidade.
Já a solução dual Portela+ Montijo ou Montijo sozinho como um hub “não são opções viáveis por razões aeronáuticas e ambientais, bem como por razões económico-financeiras devido à sua capacidade limitada para expandir a conectividade aérea”. Relativamente à solução Portela+Santarém ou Santarém como aeroporto único “não são opção por razões aeronáuticas (de navegação aérea)”, indica o documento. “Santarém tem um problema de capacidade de navegação aérea e como hub teria uma capacidade quase inferior à da Portela, já para não falar da distância a Lisboa”, justificou Maria do Rosário Partidário. Pelo caminho ficou a opção Rio Frio+Poceirão. que chumbou por razões ambientais.
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Em estudo estiveram nove opções estratégicas: as cincos iniciais presentes na RCM (Montijo+Portela, Portela+Montijo, Campo de Tiro de Alcochete, Portela+Santarém e Santarém) e mais quatro acrescentadas pela CTI (Portela+Campo de Tiro de Alcochete; Vendas Novas+Pegões; Portela+Vendas Novas – Pegões e Rio Frio+Poceirão). A segurança aeronáutica, a acessibilidade e território, a saúde humana e viabilidade ambiental, a conectividade e desenvolvimento económico e o investimento público e modelo de financiamento foram os cinco fatores críticos de decisão que integraram o quadro de avaliação estratégico para a análise das opções em estudo. No total, foram 24 os critérios de avaliação e 88 indicadores.
Futuro aeroporto está nas mãos do governo
O relatório preliminar ficará agora em consulta pública por um período de 30 dias, até 19 de janeiro. Findo esse prazo, a CTI, “avaliando a racionalidade, o mérito, a oportunidade e a pertinência técnica de cada um desses contributos, à luz dos fatores críticos para a decisão”, elaborará o relatório final, integrando nele os contributos dessa consulta pública, dando por concluído o mandato que lhe foi conferido. O documento final deverá estar pronto no início próximo ano, mas terá de aguardar pelo novo governo e só depois de 10 de março é que se saberá qual o futuro do relatório. O presidente da Comissão de Acompanhamento (CA), também líder do Conselho Superior de Obras Públicas (CSOP), reiterou a esperança de que o próximo executivo dê seguimento ao trabalho realizado neste último ano, e que foi agora apresentado. “Não me passa pela cabeça que isto [o relatório] não venha a servir para nada. Tal seria de descrédito para quem tem responsabilidades de decidir e para as portuguesas e portugueses que se dão ao trabalho de participar em consultas públicas. Não podemos adiar mais processos destes”, apelou Carlos Mineiro Aires durante a sua intervenção inicial na 3.ª Conferência da CTI.
Já a coordenadora dos trabalhos sublinhou que, apesar de a CTI ter sentido “muitas pressões de muitos lados e muitos lobbys“, da parte do governo não existiu “nem uma pressão”. A responsável garantiu ainda que “não existiu qualquer contacto a não ser, obviamente, de natureza administrativa”.
A CTI, liderada por Maria do Rosário Partidário e mais seis coordenadores, foi mandatada, no final de 2022, pelo governo, através de Resolução do Conselho de Ministros (RCM), para avaliar as opções estratégicas para aumentar a capacidade aeroportuária da região de Lisboa e coordenar e realizar a avaliação ambiental estratégica (AAE). O objetivo é que o relatório fosse entregue até ao dia 31 de dezembro, prazo que irá derrapar para janeiro, devido aos atrasos nas contratações públicas que aconteceram no início do ano. “Há um ligeiro atraso mas, para quem teve um atraso de seis meses, estar com um atraso agora de um mês foi uma recuperação rápida”, destacou Mineiro Aires.
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