//Banca com medidas “ainda insuficientes” para gerir o risco climático

Banca com medidas “ainda insuficientes” para gerir o risco climático

Com os termómetros cada vez mais altos, o risco de incêndios é hoje mais significativo. “O aumento da frequência e da intensidade destes eventos acentuam o potencial impacto negativo sobre a atividade económica e, consequentemente, o risco do crédito concedido a empresas e particulares”, defende o “Relatório Anual sobre a Exposição do Setor Bancário ao Risco Climático – 2025”.

“O ano de 2024 foi o mais quente a nível global de que há registo, superando o anterior máximo observado em 2023. Foi também o primeiro ano em que a temperatura média global registou um desvio superior a 1,5°C face à média do período pré-industrial (1850–1900), referência no Acordo de Paris”, acrescenta.

Este trabalho quantifica e localiza a exposição do crédito concedido em Portugal ao risco de incêndio, tipifica as empresas mais vulneráveis e analisa o impacto dos grandes incêndios de 2017.

Em 2024 e 2025, o Banco de Portugal determinou um conjunto de atividades de supervisão, “reconhecendo que estão em curso transformações significativas no contexto de negócio dos bancos que requerem uma resposta estrutural e continuada”. Entre elas, “novas exigências regulamentares para as instituições de crédito, relativas aos riscos ambientais, sociais e de governação (ESG), reforçando os poderes dos supervisores no acompanhamento destes riscos”.

Nos maiores bancos, o BCE tem apontado para um “progresso gradual”, mas permanecem situações de “deficiências severas que necessitam de ser endereçadas no curto prazo”. O banco central admite apertar a supervisão para “incentivar a integração efetiva e abrangente dos riscos climáticos e ambientais na gestão bancária corrente”.

Nas instituições menos significativas, o Banco de Portugal regista “progressos generalizados”, mas “as medidas implementadas são ainda insuficientes”, para assegurar uma adequada identificação e gestão do risco climático e ambiental.

Os autores concluem que no crédito a particulares, “a exposição aos riscos físicos é muito relevante”, sobretudo no crédito à habitação, “dada a sua importância na carteira do setor bancário português”. Contas feitas, corresponde a “27% do total do ativo do setor bancário em dezembro de 2024”.

Este ano o relatório tem também em conta a localização dos imóveis. Com esta informação, “os resultados apontam para uma exposição reduzida do crédito a particulares à perigosidade de incêndio rural, por via dos colaterais imobiliários”.

Ou seja, apesar de serem imóveis expostos ao risco de incêndio, a perigosidade está contida. “As classes de perigosidade de incêndio rural “alta” e “muito alta” correspondem a 1% do total de empréstimos hipotecários a particulares”. Esta área de perigosidade aumenta para 3%, se forem incluídas as zonas contíguas.

Na mesma linha, no crédito às empresas os dados “apontam para uma exposição direta limitada do setor bancário aos níveis mais elevados da perigosidade de incêndio rural”. A perigosidade “alta” e “muito alta” representam 1,8% do total de crédito às empresas. Com as áreas adjacentes, o peso destas categorias “mantém-se reduzido em 3,5%”, revela o Banco de Portugal.

Este ano os dados apurados são mais específicos, porque incluem a localização das empresas. Um trabalho que ainda tem muito espaço para melhorar, admitem os autores, que consideram também importante incluir na análise as coberturas de seguros, as cadeias de valor das empresas, a perda de ecossistemas centrais para as empresas e medidas de mitigação do impacto dos incêndios.

Incêndios de 2017 – um caso de estudo

Foram também avaliados os grandes incêndios de 2017 em Portugal, em junho e outubro, e os efeitos deste tipo de eventos na situação financeira das empresas.

“Para além dos seus devastadores efeitos em perdas de vidas humanas, tiveram um impacto material na atividade das empresas e na perceção de risco pelas instituições financeiras, o que se refletiu no pricing das operações de crédito à habitação”, lê-se no relatório, que cita o trabalho de M.Lopes e I.Póvoa.

Este estudo identificou “um aumento na probabilidade de incumprimento das empresas diretamente afetadas pelos grandes incêndios de 2017, embora limitado a empresas de setores com atividade tipicamente mais sensível ao impacto de incêndios” (agricultura, silvicultura, indústrias da madeira e fabricação de pasta e papel). Apesar do aumento do risco, o incumprimento não se materializou.

Estes efeitos estão concentrados em 2018, logo após os incêndios, “não persistindo nos anos seguintes”. Este efeito temporário poderá estar associado aos seguros e aos apoios públicos, que não foram analisados.

O relatório de 2025 conclui ainda que há uma “relativa estabilização” da exposição atual do setor bancário aos riscos climáticos de transição. Nos últimos anos não se registou uma concentração excessiva em setores mais intensivos em carbono na carteira de empréstimos às empresas.

Enquanto supervisor bancário integrado no Mecanismo Único de Supervisão (MUS), o Banco de Portugal acompanha a evolução das principais vulnerabilidades e a identificação dos riscos materiais a que as instituições supervisionadas estão expostas. Os riscos climáticos e ambientais constituem uma das três prioridades prudenciais para o período de 2024 a 2026.

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