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O mercado imobiliário residencial está sobrevalorizado. A boa notícia, segundo o Banco de Portugal, é que esta subida dos preços não tem sido feita à custa do aumento do crédito à habitação. Ainda assim, o Banco de Portugal deixou ontem um aviso. “O crédito à habitação não deve transformar-se num fator determinante para a evolução dos preços no imobiliário residencial”, indica o supervisor no seu Relatório de Estabilidade Financeira. Deve prevenir-se “a criação de uma espiral entre crédito e preços neste mercado”, avisa a instituição.
Segundo o relatório, “nos últimos anos, o crescimento dos preços do mercado imobiliário residencial em Portugal tem vindo a ocorrer em simultâneo com uma evolução contida do crédito à habitação, ao contrário de outros países da área do euro”. Mas ressalva que “o stock de crédito à habitação acelerou no decurso de 2021 e em setembro cresceu 3,7% face ao período homólogo (3,5% excluindo o efeito moratória), registando-se uma subida acentuada das novas operações de crédito à habitação”. Frisa que “este crescimento tem vindo a aproximar-se do observado para a área do euro”. Aponta que, em dezembro de 2019, a taxa de variação anual do stock de crédito à habitação em Portugal situava-se em menos 0,1%.
O Banco de Portugal sublinha que o investimento imobiliário direto estrangeiro cresceu 8,2% em 2020, face à subida de 10% registada em 2019. No primeiro semestre deste ano caiu 12% face a período homólogo de 2019. Mas o investimento em bens imóveis, através do regime de vistos gold, “continuou a ser expressivo em 2020 e 2021, possivelmente antecipando o fim do regime nas regiões de Lisboa, Porto e Algarve previsto para o início de 2022”. E salienta que, desde o início do regime em 2012, este tipo de investimento representou 40% do investimento direto estrangeiro no setor imobiliário no país.
A escassez de oferta de habitação, traduzida na reduzida atividade de construção nos anos que antecederam a crise pandémica, tem contribuído para a subida dos preços do imobiliário residencial, nota o Relatório de Estabilidade Financeira do BdP.
“O crescimento do setor turístico nos últimos anos intensificou a procura por imobiliário residencial”, recorda o supervisor, frisando que, em 2019, os investidores não residentes representaram 13% do valor total das aquisições de imóveis em Portugal.
O aumento dos novos registos de alojamento local “contribuiu para a dinâmica do mercado, com impacto na valorização dos ativos imobiliários residenciais”.
Por outro lado, “a escassez de oferta de habitação, traduzida na reduzida atividade de construção nos anos que antecederam a crise pandémica, tem contribuído para a subida dos preços do imobiliário residencial”.
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Quanto ao setor da construção, “manteve-se resiliente ao longo de 2020 e 2021, evidenciando uma recuperação das licenças para construção de habitação”. O Banco de Portugal destaca que, “no primeiro semestre de 2021, o Valor Acrescentado Bruto (VAB) e o investimento em construção aumentaram 4,1% e 3,2% em termos homólogos, respetivamente (3,1% e 1,6% em 2020)”. “Apesar deste crescimento, o aumento dos custos de construção observado nos últimos meses, associado a uma escassez de mão-de-obra e materiais, constitui um fator adicional de pressão ascendente sobre os preços do imobiliário residencial, mas não de sobrevalorização”.
O administrador do Banco de Portugal, Luís Laginha de Sousa, disse, citado pela agência Lusa, que o supervisor irá continuar a “monitorizar e a ver se são necessários ajustamentos”. Falando na conferência de apresentação do relatório, no Museu do Dinheiro, em Lisboa, o mesmo responsável sublinhou que, caso esse seja o caso, o Banco de Portugal não deixará de “tomar decisões em conformidade”.
Riscos para a banca
O Relatório de Estabilidade Financeira aponta outros riscos para a banca em Portugal, num contexto de incerteza sobre a evolução da economia e dos efeitos de eventuais medidas do foro sanitário. Um deles é a eventual “deterioração da qualidade dos ativos e materialização do risco de crédito”. Destaca, por isso, a ” importância de um adequado registo de imparidades para crédito” por parte dos bancos.
Concretamente sobre a questão das moratórias no crédito, o relatório aponta que “com a reposição do serviço de dívida de todos os créditos, podem registar-se efeitos de contágio entre o incumprimento em empréstimos a particulares para diversas finalidades”. Acrescenta que, “não obstante, não é esperado um impacto significativo no incumprimento dos particulares e este tenderá a distribuir-se ao longo do tempo”. No caso das moratórias privadas que já terminaram, “o impacto sobre o acréscimo de incumprimento tem sido reduzido, dado que uma parte significativa dos mutuários terá aderido à moratória por motivo de precaução”, nota. No final de outubro encontravam-se ainda em moratória 424 milhões de euros de crédito a particulares. Estas moratórias, com maturidade máxima de nove meses, irão terminar até ao final de 2021. Em 30 de setembro terminou o prazo da moratória pública para a maioria dos créditos.
Outro dos riscos para a banca é a “materialização do risco de mercado decorrente de um aumento das taxas de juro de longo prazo”. Tal cenário teria um “impacto na desvalorização dos ativos financeiros em carteira, com destaque para a dívida pública”. Outra vulnerabilidade no horizonte é a “reduzida rendibilidade, num quadro de taxas de juro baixas, expansão limitada do mercado de crédito doméstico e concorrência acrescida em segmentos mais rentáveis”. Também eventuais “desafios associados ao processo de digitalização da atividade bancária, incluindo a vertente da cibersegurança, e a transição para uma economia sustentável” constitui um risco.
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