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As taxas de juro muito altas vieram para ficar mais um ano, pelo menos, até finais de 2024 ou meados de 2025, de acordo com várias análises feitas na sequência do aumento de taxas de juro ontem anunciado pelo Banco Central Europeu (BCE) e à luz das novas projeções do próprio BCE, que prevê que uma inflação ainda acima do limite de 2% daqui a dois anos, ou seja, um ritmo de preços que continua a exigir restrição por via dos juros.
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Ontem, quinta-feira, 14, a presidente do BCE, Christine Lagarde, explicou a sua décima subida de taxas de juro no contexto desta crise espoletada pela guerra da Rússia contra a Ucrânia (a inflação continua demasiado alta e rondará os 5,6% em média este ano quando a meta do banco é 2%).
Mas deixou uma nova mensagem, em jeito de boa notícia: se não houver mais surpresas nos preços (na energia, por exemplo), pode ser que o pico do ciclo de subidas tenha sido atingido.
Deixou também uma má notícia ou menos boa: “as taxas de juro diretoras atingiram agora os níveis que darão um contributo substancial para o retorno atempado da inflação ao objetivo”, mas isto só será assim “se esses níveis forem mantidos durante um período suficientemente longo”. Ou seja, o fardo dos juros altos não é para aliviar a breve trecho.
“Parece, claramente, que o BCE continua altamente preocupado com a inflação, não apenas com a inflação registada, mas também com a inflação futura, já que, por exemplo, as mais recentes projeções dos especialistas do BCE mostram que a inflação da zona atingirá 3,2% em 2024”, constata Carsten Brzeski economista-chefe para a área de macroeconomia no grupo financeiro holandês ING.
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“Olhando para o futuro, um maior enfraquecimento da economia europeia e uma maior força na tendência desinflacionista tornarão muito difícil ao BCE encontrar argumentos para mais um aumento das taxas antes do final deste ano”.
Para Brzeski, “a subida anunciada não é apenas um reforço da credibilidade do BCE, ela também será a última do ciclo atual”.
Fim da subida das taxas não significa fim da política restritiva
E por quanto tempo podem os europeus contar com estes níveis de aperto?
Para o gabinete de estudos do BPI, “o destaque desta reunião do BCE foi o sinal de que os níveis atuais (taxa de depósitos em 4% e de refinanciamento a 4,5%) marcam, provavelmente, o fim do ciclo de subida das taxas, após um aumento acumulado de 450 pontos base [4,5 pontos percentuais] desde julho de 2022).
Para o gabinete do BPI, este “eventual fim da subida das taxas não representará o fim da política monetária restritiva”.
Pelo contrário, “o BCE reiterou que, na sua luta contra a inflação, as taxas devem permanecer nos níveis atuais durante um período de tempo suficientemente longo”. “Suficientemente longo” foi o termo usado por Lagarde.
“Nas palavras de Lagarde, a inflação permanece demasiado elevada durante demasiado tempo (3% no final de 2023 e ao longo de 2024)”, o que dá argumentos para manter a pressão muito elevada na economia por via dos juros.
Em contrapartida, “a fragilidade dos últimos indicadores de atividade não conduziu a uma deterioração da visão do BCE sobre o crescimento económico: as previsões refletem uma atividade lenta para o resto do ano, mas sem cair em recessão e recuperando o dinamismo na primavera de 2024”.
Ou seja, a economia parece aguentar com o peso dos juros altos e durante muito tempo.
Com efeito, diz o BPI Research, “Lagarde utilizou de forma reiterada o adjetivo apático (sluggish) e evitou falar de recessão”.
Assim, “após a reunião de hoje, as expectativas implícitas nos mercados monetários são de que o BCE manterá a taxa diretora [depósitos] em 4% e a taxa de juro de refinanciamento em 4,5% até ao terceiro trimestre de 2024, altura em que poderá ocorrer uma primeira redução da taxa de juro (expectativas em linha com as nossas próprias previsões)”, refere o mesmo gabinete de estudos.
Na conferência de imprensa em Frankfurt, a seguir à reunião de taxas, Lagarde revelou que desta vez, ao contrário do que tem acontecido, não houve unanimidade na decisão de subir os juros, mas disse que houve uma “sólida maioria” a favor do aumento em detrimento da pausa, a opção defendida por governadores como Mário Centeno, de Portugal.
Não será o caso da maioria dos decisores alemães. Clemens Fuest, presidente e economista chefe do instituto Ifo, em Munique, elogia o aumento das taxas de juros por parte do BCE.
“O raciocínio por trás deste aumento das taxas é sólido. A inflação continua elevada, apesar da desaceleração económica, sendo que o BCE subiu a previsão de inflação para 2024 e, neste contexto, um aumento das taxas de juro é lógico”.
“Para a Alemanha, este aumento é doloroso dada a contração da economia interna, mas temos de ver que o BCE tem uma política monetária não apenas para a Alemanha, mas para a área do euro como um todo”, defende Fuest.
Tendo atingido um pico nesta fase, as taxas de juro do BCE devem assim ficar em níveis muito elevados (perto de 5%) durante “um longo período de tempo” pois, segundo as novas previsões, a inflação deve demorar bastante a ser aplacada, sinalizou Lagarde.
Esse “longo período” restritivo nos juros pode durar dois anos se o cenário central das novas previsões da autoridade se verificar.
Este diz que a inflação média vai persistir acima de 2% até 2025, inclusive, com a economia da zona euro a aproximar-se da estagnação este ano (0,7%), crescendo apenas 1% em termos reais no próximo, avançou o BCE, esta quinta.
Questionada sobre quão longo é o longo período de que fala, Lagarde disse preto no branco que “em 2025, não vamos estar na nossa meta na inflação total”. “Devemos chegar ao nosso objetivo de 2% [a meta oficial do BCE] apenas no terceiro trimestre de 2025”, avisou a banqueira central perante os jornalistas.
Portanto, talvez no outono/inverno do ano que vem os juros comecem a baixar dos máximos atuais. Se tudo correr menos mal, claro.
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