//BCE vai aceitar dívida ‘lixo’ no programa de compras contra o vírus

BCE vai aceitar dívida ‘lixo’ no programa de compras contra o vírus

O Banco Central (BCE) avançou esta quarta-feira com a decisão inédita de também aceitar ativos considerados de “não-investimento”, especulativos, os chamados ativos “lixo”, no jargão dos mercados, no âmbito do seu enorme programa de compras de dívida pública e privada (e outros títulos) detida pelos bancos da zona euro. Será uma medida temporária, em todo o caso. Até finais de 2021.

A medida é uma forma de arranjar o máximo de títulos disponíveis no mercado para alcançar a meta de 750 mil milhões de euros, o valor deste pacote especial e temporário de quantitative easing (QE) que pode travar a subida descontrolada das taxas de juro e o eventual colapso de soberanos e empresas mais endividados e dependentes do crédito.

A instituição presidida por Christine Lagarde diz agora que é uma forma de proteger bancos, empresas e governos contra eventuais cortes radicais nos ratings num futuro próximo, devido à degradação da situação económica.

Entre os soberanos, Portugal, Itália e Grécia podem vir a ser dos mais beneficiados com este QE já que são os países com maior peso de dívida pública face ao PIB, a medida seguida no Pacto de Estabilidade.

Recorde-se que na passada sexta-feira, a agência Fitch ameaçou Portugal quando cortou a perspetiva da dívida (outlook) de positiva para estável. A República continua com dívida classificada acima de ‘lixo’ pelas quatro grandes agências de ratings consideradas pelo BCE.

O Banco de Lagarde confirma agora que “adotou estas medidas temporárias para mitigar o efeito na disponibilidade de colaterais [títulos de garantia que têm de ser dados pelos bancos ao BCE] de possíveis reduções de ratings [notas das pelas agências aos títulos de dívida e outros] que resultem das consequências económicas da pandemia de coronavírus (covid-19)”.

Esta decisão vem “complementar o pacote mais abrangente de alívio nas garantias anunciado a 7 de abril de 2020”, no qual o BCE deixou cair o limite para aceitar linhas de obrigações de boa qualidade. Disse que vai aceitar tudo o que houver.

Faltam ativos para o QE dos 750 mil milhões, parece

Esta decisão de 7 de abril e a medida agora anunciada “visam garantir que os bancos têm ativos suficientes que possam mobilizar como garantia junto do Eurossistema e assim participar nas operações de fornecimento de liquidez e continuar a fornecer financiamento à economia da zona euro”.

No caso da dívida, até aqui o BCE só aceitava títulos (obrigações na posse dos bancos) com nota BBB- ou superior.

Com a nova decisão, aceitará tudo o que vier dos bancos, embora o BCE avise que vai impor haircuts na dívida, isto é, não vai aceitar a totalidade do valor mercantil dos títulos pois são mais especulativos ou arriscados.

É uma forma de se proteger contra uma bomba que pode detonar no balanço do BCE (defaults, incumprimento, por exemplo) se as coisas correrem pelo pior.

As medidas vigoram até setembro de 2021, diz a instituição baseada em Frankfurt.

Quando apresentou o pacote QE, o BCE explicou que o novo “programa de compra de ativos devido a emergência pandémica (pandemic emergency purchase programme) corresponde a um envelope de 750 mil milhões de euros até ao final do ano”, a ser usado em compras de dívida, sobretudo soberana, ao bancos comerciais da zona euro.

O reforço do quantitative easing (QE) cai em cima “dos 120 mil milhões de euros decididos a 12 de março”. Assim, “no conjunto, o montante disponibilizado ascende a 7,3% do PIB da zona euro” diz o BCE.

O esquema monetário vai permitir controlar o risco da dívida pública, dinheiro crucial para emprestar às empresas, aos bancos e às famílias, mas “é temporário e concebido para fazer face à situação sem precedentes com que se depara a nossa união monetária”, refere o BCE.

Este corona-QE “permanecerá em vigor” até que esta fase da crise do coronavírus chegue ao fim, refere Frankfurt.

(atualizado 22h55)

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