O Ministério Público (MP) considera que os arguidos Ricardo Salgado, Morais Pires, José Manuel Espírito Santo, Rui Silveira e Isabel Almeida deturparam e omitiram informação no prospeto de aumento de capital do BES, em 2014.
De acordo com o despacho de acusação relativo ao processo de oferta pública de subscrição de ações do banco, concluído na última semana pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e a que a Lusa teve acesso, “os arguidos atuaram cientes de que, com o seu comportamento, atentaram contra os interesses patrimoniais dos subscritores das novas ações do banco”, sob o objetivo de “criar um cenário destacado da realidade”.
“Bem sabiam os arguidos que o prospeto continha afirmações inverídicas, omitia informação essencial, e continha afirmações enganosas”, pode ler-se no documento assinado pela procuradora Olga Barata, sublinhando que “atuaram concertadamente, no logrado propósito de impedir que o mercado tivesse conhecimento dos factos de que cada qual tinha conhecimento”.
Este processo, que prosseguiu de forma autónoma no âmbito das investigações ao universo Espírito Santo, terminou com a acusação aos cinco arguidos (quatro administradores e uma colaboradora) dos crimes de manipulação de mercado e burla qualificada, em coautoria. Foi ainda deduzida aquisição contra o BES por um crime de burla qualificada.
“O prospeto foi elaborado pelo BES, sob a responsabilidade última de Ricardo Salgado, de José Manuel Espírito Santo, de Amílcar Morais Pires e de Rui Silveira, enquanto administradores com competências executivas, e sob a coordenação de trabalhos assumida por Isabel Almeida”, sustenta o despacho.
A acusação descreve as alterações que foram efetuadas para o prospeto – um documento exigido nas ofertas públicas, elaborado pela sociedade emitente e sujeito a aprovação da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) -, nomeadamente sobre os fatores de risco, como a real situação financeira da ESI, ou a relação patrimonial com outras entidades, tais como ESCOM – cuja informação apresentada foi rotulada “falsa” -, ESBP e ESFIL – estas últimas com informação “deliberadamente incompleta”.
“Foi sugerido falsamente que a ESI solvia dívida, incluída a colocada nos clientes BES, com a venda de ativos, ou desalavancagem. (…) Na realidade, a ESI via desaparecer parte do passivo identificado como estando colocado no segmento de retalho do BES com recurso a operações fraudulentas (…), que lesavam patrimonialmente o BES e também os seus clientes”, indica o MP, resumindo: “Essas operações prejudicaram o BES em 643.159.476 euros”.
O despacho aponta ainda a colocação de dívida das sociedades Rioforte e ES Irmãos por dinamização dos responsáveis do BES “com a ocultação da real situação patrimonial destas emitentes” e de uma forma que expunha o grupo “a contingências e riscos de perda patrimonial, decorrentes de danos reputacionais e de litigância”.
Reiterando que os arguidos “agiram, sempre, de forma consciente, livre, voluntária e deliberada”, o MP vincou os “interesses criminosos” impostos e a compra das ações pelos investidores “com base em cenários deturpados”, numa operação que antecedeu em apenas algumas semanas o colapso do banco. A resolução foi anunciada pelo então governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, no dia 3 de agosto desse ano.
“A identificação real das práticas lesivas perpetradas pelos arguidos contra os interesses patrimoniais do BES – que acabariam por conduzir esta unidade bancária a um inevitável reconhecimento de perdas graves – que foi impedida nos termos da informação prestada e não prestada no prospeto, condicionou necessariamente a perceção que teria que ser depreciativa do valor do negócio/risco do BES”, sustenta a acusação, considerando que as condutas dos arguidos “atentavam contra o regular, transparente e eficiente funcionamento do mercado”.
Por último, o MP pediu que seja declarada perdida a favor do Estado a vantagem obtida com a prática dos crimes imputados aos arguidos, num valor que ascende a 1.044.571.587,80 euros.
Deixe um comentário