//Constâncio acusa jornal de calúnias e falsidades. “A quem podem aproveitar?”

Constâncio acusa jornal de calúnias e falsidades. “A quem podem aproveitar?”

Vítor Constâncio acusa o jornal “Público” de publicar calúnias e falsidades sobre o seu papel no crédito a Joe Berardo.

“Participar numa reunião em que se aprova uma ata é apresentado [pelo jornal] como se fosse o mesmo do que deliberar sobre a matéria a que essa ata se refere”, começa por apontar.

“Vejamos uma segunda falsidade: desde a sua primeira notícia, o que o jornal fez foi confundir o pedido da fundação Berardo de uma não oposição a uma participação qualificada no capital do BCP, com uma autorização do empréstimo da Caixa Geral de Depósitos à fundação”, acrescenta o ex-governador do Banco de Portugal na audição desta terça-feira de manhã no Parlamento.

Ouvido na comissão de inquérito à recapitalização da Caixa Geral de Depósitos, Vítor Constâncio manteve que o banco central não aprova créditos e que não aprovou o crédito do banco estatal a Joe Berardo.

“Como deveria ser óbvio, tal nunca poderia ter acontecido. Uma concessão de crédito é um contrato de direito privado que vigora entre as partes, independentemente do que possa deliberar ou decidir qualquer outra entidade, incluindo o BdP [Banco de Portugal]”, afirmou

“O BdP não aprova créditos cedidos pela gestão comercial dos bancos e também não pode cancelá-los ou impedi-los de vigorar depois de terem sido celebrados entre as partes e nos termos que tenham sido acordados entre elas”, destacou ainda.

Na sua declaração inicial, o ex-ministro sublinhou ainda a independência do Banco de Portugal, dizendo que se coloca sempre à margem de qualquer disputa entre outras instituições bancárias.

“Cui bono?”

Durante a audição, os deputados voltaram a questionar Vítor Constâncio sobre o seu papel no reforço da Fundação Berardo no BCP, através de um crédito de 350 milhões de euros do banco estatal.

“Não cometi qualquer irregularidade e não revelei falta de isenção no exercício dos meus cargos”, garantiu.

“Estou totalmente retirado da vida pública, não tenho nem nunca mais terei quaisquer funções executivas, dedico a minha vida à investigação dando aulas numa universidade estrangeira e conferências em eventos internacionais. Porque persistem as calúnias e a quem aproveitam? Como é possível que, depois de explicadas as diferenças conceptuais mais básicas e documentados os factos mais essenciais deste caso, tais calúnias persistam? A quem aproveitam?”, questionou.

“Parece-me ser uma pergunta que deve ser investigada. Detesto, por temperamento, teorias da conspiração. Não me passaria pela cabeça falar aqui de uma teia urdida contra mim. Não quero saber se há ou não há alguém por detrás das notícias do Público. Mas não deixo de me perguntar: cui bono? A quem podem aproveitar?”, insistiu.

Vítor Constâncio ataca Filipe Pinhal e Joe Berardo, acusando o ex-administrador do BCP de ser um dos nomes que estão por detrás das notícias do jornal “Público”.

“Curiosamente, verifico que [as notícias] podem interessar a um vasto grupo de pessoas, por um lado, e a uma pessoa em particular, por outro. Falo aqui de um interesse objetivo. Não pressuponho, repito, que haja alguém por detrás das notícias do ‘Público’, mas, em primeiro lugar, as calúnias que elas veiculam podem servir de tentativa vingança de alguns que foram condenados e afastados do sistema e foram, de facto, muitos, como por exemplo o Dr. Filipe Pinhal, que aqui foi ouvido e que foi condenado, não só pelo Banco de Portugal, como pela CMVM e os tribunais criminais, pelos crimes que cometeu no BCP”, apontou.

“E existiram alguns outros autores de semelhantes crimes, que querem agora que os culpados seja o Estado, o regulador, o banco central e não aqueles que efetivamente os cometeram”, acrescentou.

Mas Vítor Constâncio apontou o dedo também ao empresário madeirense.

“As histórias que o ‘Público’ tem contado e que tanto o têm descredibilizado desde o dia 7 de junho servem o interesse objetivo de uma pessoa: o senhor José Berardo. Pois, em última análise, a quem interessa que se pense que o crédito concedido pela Caixa à fundação não tenha quaisquer garantias e, sobretudo, não tinha como garantia geral o seu património? A quem interessa que se diga que as únicas garantias eram as ações que iriam ser compradas com o dinheiro emprestado, como se fossem apenas fichas de um casino? Se isso fosse verdade, obviamente serviria o interesse de quem deixaria assim de responder ilimitadamente pelo seu imenso património”, sustentou.

O ex-governador do Banco de Portugal está a ser ouvido pela segunda vez na comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos.

Opor a reforço de Berardo não seria “independente e neutro”

Vítor Constâncio considera que, se o supervisor se tivesse oposto ao pedido da Fundação José Berardo de obtenção de posição qualificada no BCP, não seria “independente e neutro”.

Na opinião do ex-governador, isso “colidiria necessariamente com o enquadramento jurídico vigente” e “teria sido uma forma de não ser totalmente independente e neutro relativamente àquela matéria”.

“Não podia ser feito no quadro da lei”, defendeu.

O deputado do PSD Duarte Pacheco confrontou então Vítor Constâncio com o facto de precisar “de base legal” para agir no caso do crédito da CGD à Fundação José Berardo, mas não precisar dela para “reunir acionistas”, numa referência à reunião com acionistas do BCP no final de 2007.

Vítor Constâncio disse que a reunião aconteceu “no contexto da normalização” da situação do BCP à data, com base nas competências de “supervisão prudencial” e “face a pedidos de acionistas”.

Duarte Pacheco referiu então o artigo 118.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), que menciona que o Banco de Portugal pode “notificar” uma instituição caso detete atividade que não respeite uma gestão “sã e prudente”.

“Acha que é uma fonte de financiamento segura, legítima, querer comprar ações de um banco dando como garantia as ações do empréstimo que está a ser concedido?”, perguntou.

Vítor Constâncio lembrou que na sua primeira audição parlamentar, em 28 de março, já tinha dito que “não faria” as operações e que isso respondia à pergunta de Duarte Pacheco, e mencionou que “houve inspeções à Caixa, várias, houve pressão para as garantias serem reforçadas, e decisão para serem constituídas provisões e imparidades”.

Anteriormente, a deputada do CDS-PP Cecília Meireles já tinha mencionado o número 1 do artigo 118.º do RGICSF, que também diz que o Banco de Portugal pode notificar os bancos para “corrigir os métodos de gestão”, tendo Constâncio respondido que o supervisor “não pode imiscuir-se nas operações de crédito” e na “gestão” das instituições.

Ver fonte

TAGS: