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A crise pandémica da covid-19 custou mais de 800 mil milhões de dólares em salários perdidos por mulheres em todo o mundo. O cálculo é da Oxfam International, que parte dos dados da Organização Internacional do Trabalho, que mostra que houve 64 milhões de mulheres que ficaram sem emprego em 2020, para concluir que os rendimentos perdidos são os tais 800 mil milhões de dólares, ou seja, o equivalente ao produto interno bruto combinado de 98 países.
“As consequências económicas da pandemia de covid-19 estão a ter um impacto mais severo sobre as mulheres, que estão desproporcionalmente representadas em setores que oferecem baixos salários, poucos benefícios e empregos sem estabilidade”, defende a diretora executiva da Oxfam International, que acusa os vários estados de não darem a devida atenção ao tema. “Em vez de corrigirem a situação, os governos trataram os empregos das mulheres como dispensáveis, e isso custou, pelo menos, 800 mil milhões de dólares em salários perdidos”, defende Gabriela Bucher. Em causa está qualquer coisa como 661,5 mil milhões de euros.
Em comunicado, a Oxfam, uma confederação de 19 organizações e mais de 3000 parceiros, que atua em mais de 90 países procurando soluções para os problema da pobreza, desigualdade e da injustiça, sublinha que esta é uma estimativa “conservadora”, na medida em que não inclui os salários perdidos por milhões de mulheres com empregos informais, como trabalhadores domésticas e empregadas fabris, entre outras, e que “foram mandadas para casa ou que viram as suas horas de trabalho “drasticamente” reduzidas.
Lembra a Oxfam que as mulheres têm um peso significativo em atividades precárias e de baixos salários, como o retalho ou o turismo, os setores mais afetados pela pandemia. “Em todo o sul da Ásia, África Subsaariana e América Latina, a maioria das mulheres trabalha em empregos informais. As mulheres também representam cerca de 70% da força de trabalho na Saúde e Assistência Social em todo o mundo, empregos essenciais, mas muitas vezes mal pagos, e que as colocam em maior risco de contraírem a doença”, pode ler-se no comunicado.
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E, por isso, esta entidade não tem dúvidas: “A covid-19 desferiu um duro golpe nos ganhos da mão-de-obra feminina”, defende a Oxfam, que compara a situação da mão-de-obra feminina no mundo com os ganhos de multinacionais como a Amazon – que prosperou em ambiente pandémico, com uma capitalização bolsista que ultrapassou os 700 mil milhões de dólares – ou aos gastos do governo americano em armamento: 721.5 mil milhões de dólares em 2020, o “maior orçamento de defesa do mundo”.
E há, ainda, que ter em conta que a pandemia trouxe trabalho acrescido a estas trabalhadoras, designadamente ao nível dos cuidados familiares. “Para as mulheres em todos os países, de todos os continentes, além da perda de rendimentos, o trabalho não remunerado explodiu. Como as necessidades de cuidados aumentaram durante a pandemia, as mulheres – as amortecedoras de choques das nossas sociedades – intervieram para preencher a lacuna, uma expectativa tantas vezes imposta por normas sociais sexistas”, aponta Gabriela Bucher. A Oxfam calcula que, mesmo antes da pandemia, o trabalho não remunerado das mulheres e meninas por todo o mundo correspondesse a 12,5 mil milhões de horas por dia, com um valor global de 10,8 biliões de dólares anuais que ficam por pagar.
Para esta entidade, os efeitos da crise pandémica, que gerou “mudanças drásticas”, vão continuar a sentir-se de forma desigual nos próximos anos: estima-se que mais 47 milhões de mulheres em todo o mundo caiam na pobreza extrema, vivendo com menos de 1,90 dólares por dia em 2021. Nos Estados Unidos, 1 em cada 6 mulheres negras enfrenta a insegurança alimentar devido à pandemia.
Para a Oxfam, as medidas tomadas por diversos países para ajudar a mitigar estes problemas, como a injeção de 39 mil milhões de dólares da administração Biden no setor das creches ou a nova legislação na Argentina que concede horários de trabalho flexíveis para quem cuida de crianças ou de deficientes, são “positivas”, mas, globalmente, a resposta “continua a ser grosseiramente insuficiente”: Só 11 países introduziram jornadas de trabalho mais curtas ou flexíveis para trabalhadores com descendentes ou ascendentes a seu cargo, enquanto 36 reforçaram os valores pagos por baixas ou licenças parentais.
“À medida que avançamos das medidas de emergência para a recuperação de longo prazo, os governos em todo o mundo devem aproveitar a oportunidade para construir economias mais igualitárias e inclusivas para todos”, defende Gabriela Bucher, sublinhando a necessidade de investir numa recuperação económica justa e sustentável. “Não é possível recuperar da covid-19 sem [promover] a recuperação das mulheres”, frisa.
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