O fator climático está a transformar-se rapidamente num elemento decisivo nas avaliações de risco financeiro e nas decisões de crédito. No Dia Nacional da Sustentabilidade, destacamos cinco dados que demostram como este mercado está a mudar.
Podemos dizer que a avaliação dos imóveis inclui um novo critério, que, na verdade, já é analisado há algum tempo, mas só agora começa a ter efeitos práticos nas decisões de compra e venda: a sustentabilidade ou o risco ambiental.
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Apesar disso, esta não é uma preocupação da maioria dos que procuram casa em Portugal, dada a escassez da oferta e a crise no mercado.
Rui Lopes, diretor-geral da Simplefy, diz que há dois grupos, “aquele que procura de uma forma desesperada um imóvel para poder viver, um teto, e a questão da sustentabilidade não é tema. Depois temos outro grupo, talvez numa fase mais confortável da vida, que não encara as alterações climáticas como um risco futuro, mas uma realidade atual”.
Por norma, quanto mais caro o imóvel, maior a preocupação com os riscos climáticos por parte de quem compra. No entanto, os bancos penalizam ou premeiam de igual forma as escolhas dos dois grupos, em linha com os novos critérios de avaliação.
1. Risco climático pode pesar no spread
Os bancos em Portugal já têm em conta o desempenho energético dos imóveis no momento da avaliação, o que pode agravar as condições do empréstimo ou mesmo impedir o crédito. “O banco pode recusar a garantia, apesar do perfil de risco do cliente ser ótimo”, sublinha Rui Lopes.
Segundo o inquérito realizado pelo Banco de Portugal às maiores instituições a operarem no país, em julho de 2025, os cinco maiores bancos portugueses já aplicam critérios menos restritivos para imóveis com desempenho energético elevado. Quatro bancos reportam critérios mais restritivos para imóveis com fraco desempenho.
“Cada banco tem a sua política comercial, mas estamos aqui a falar, normalmente, em questões de spread, que podem ir até 0,1%, 0,2% de penalização”, avança Rui Lopes à Renascença.
Além de mexer com os juros cobrados pelo empréstimo, “as próprias seguradoras podem tornar o seguro multirriscos mais caro em zonas que estejam mais propícias a fenómenos climáticos, que possam colocar em perigo a garantia”, sublinha o consultor. É uma decisão comercial, do banco e da seguradora contratada.
2. Os três maiores riscos climáticos em Portugal
Na hora de escolher um imóvel a decisão de compra é determinada também por critérios como a localização, acessibilidades, ou a proximidade a escolas e outros equipamentos. “Mas, se daqui a 10 anos essa casa estiver numa zona de risco de inundação ou de incêndio, talvez tenhamos feito uma escolha menos acertada”, lembra Rui Lopes.
O consultor defende que é preciso ter em conta a localização ou a forma como foi construído o imóvel.
Neste momento, em Portugal, as inundações lideram os riscos identificados, seguidas dos incêndios e do risco térmico. Este último “não é um risco que afete diretamente o imóvel, é mais pela questão da eficiência energética, que impacta negativamente no final do mês, por exemplo, na conta da eletricidade e na conta do gás”, explica.
Segundo o Banco de Portugal, mais de 90% do crédito a empresas em Portugal está exposto a níveis médio, alto ou severo de stress hídrico, stress térmico e incêndios, e 39% a risco de inundações. São dados que sinalizam a vulnerabilidade do setor financeiro a eventos climáticos extremos e a necessidade de uma avaliação de risco mais rigorosa no crédito imobiliário.
3. Duplicação de edifícios em zonas de risco de inundação
De acordo com a Agência Portuguesa do Ambiente, em 2021 estavam registados 26.540 edifícios em áreas suscetíveis a inundações, um número que duplicou face a 2011. A APA identificava a existência de 63 zonas de risco, em 102 municípios.
A Simplefy, que reúne intermediários de crédito, considera este aumento “alarmante” e um sinal de “um agravamento do risco territorial que não pode ser ignorado”, nem por quem compra nem por quem financia e garante o crédito.
4. “Crédito Verde” em crescimento
Apesar da crise no mercado da habitação, que impõe uma recuperação lenta na construção nova, os maiores bancos a nível nacional indicam que “uma fatia significativa dos novos empréstimos para habitação já são ‘verdes’, entre 20% e 27%”. Ou seja, “um em cada cinco créditos já são feitos em imóveis com eficiência energética da classe A e classe B”, explica.
Estes dados apontam para um mercado em expansão, em linha com a procura por imóveis sustentáveis e por investimento em eficiência energética.
5. BCE introduz novas regras a partir de 2026
Em resposta à resistência às alterações climáticas, o Banco Central Europeu (BCE) vai introduzir um fator climático na avaliação das garantias bancárias, a partir da segunda metade de 2026.
A medida poderá reduzir o valor dos ativos com maior risco ambiental. Na prática, vai transformar a eficiência energética e a resistência aos riscos ambientais em fatores económicos concretos. Irá afetar diretamente as condições de financiamento dos imóveis mais vulneráveis.
Rui Lopes defende que o futuro do crédito e do mercado imobiliário “será cada vez mais verde e resiliente. A eficiência energética já não é só a poupança da fatura da luz ou do gás, mas também a poupança na prestação da casa”.
Acrescenta ainda que “esta sustentabilidade já não é apenas uma boa vontade, é um fator económico cada vez mais tangível, que pode significar o acesso ou a recusa de um crédito, a valorização ou a perda do bem patrimonial”. O diretor-geral da Simplefy aconselha todos a terem em conta “os perigos, a região e a localização” dos imóveis, “para mitigar potenciais riscos futuros”.
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