É hora de almoço, as mesas já estão postas e os funcionários olham para os ponteiros do relógio. O tempo vai passando e ainda há muitas cadeiras por ocupar.
Na Praça dos Poveiros, no centro do Porto, é visível o olhar de preocupação e a tristeza nos rostos de quem espera pela chegada de clientes. Um dos proprietários, Paulo Miranda, confessa, em entrevista à Renascença, que “a única coisa que nos mantém vivos são os estrangeiros. Os portugueses perderam a capacidade de compra”.
O gestor acredita que, “pelo menos no Porto, é difícil os portugueses terem uma vida condigna”.
Há restaurantes que verificam uma quebra no número de clientes em mais de metade. Desde o final do ano passado, que a situação tem vindo a agravar-se, e se não melhorar, há quem já pondere fechar portas.
É o caso de Justino Pinto que salienta o quão “a vida está cara”, o que o obrigou a “aumentar um bocadinho os preços e, mesmo assim, o número de clientes reduziu para metade”. Por isso, o responsável admite que “se continuar assim” pode ter mesmo de encerrar de vez.
O cenário não se altera muito se nos distanciarmos do Porto. Percorremos cerca de 40 quilómetros até Famalicão. Uma cidade mais pequena, com menos turismo, mas com as mesmas dificuldades na restauração. A fatura aos fornecedores aumentou e o lucro diminuiu.
“A nível de matéria-prima foi um crescimento dos preços absurdo e, em contrapartida, verificamos uma diminuição da procura dos clientes”, conta Cândido Oliveira. Mas, é de mangas arregaçadas que o proprietário admite que estão a fazer todos os esforços e ajustes necessários para que o negócio sobreviva, embora ainda estejam a “ponderar continuar ou não”. “O fecho de portas não é uma situação que esteja fora de hipótese”, reconhece.
Situação mais grave do que no tempo da “troika”?
Em declarações à Renascença, Daniel Serra, dirigente da Pro-var, associação que representa o setor, descreve uma “situação que está a ficar insustentável”. “Temos aqui em termos de custos fixos, comparado com 2019, valores que ultrapassam o dobro dos de então”, refere.
Daniel Serra lembra que “existe alguma restauração nos centros das grandes cidades que têm aqui alguma captação por parte do turismo e essas têm conseguido ter algum desempenho razoável”, mas este é um fenómeno circunscrito a Lisboa, Porto e “eventualmente Braga” e que não abrange sequer toda a cidade.
“Mesmo nestas grandes cidades, saindo do circuito turístico, o consumo interno caiu abruptamente. No decorrer do mês, na segunda quinzena fica realmente uma quebra bastante evidente e na última semana chega a haver restaurantes com dias a zeros”, descreve, acrescentando que “basta ir pelas cidades e começa-se a ver muitos espaços de restauração, cafés, a fechar e muita gente a ir para o desemprego”, assegura..
Este dirigente associativo considera que a situação pode ser, “equiparada aos tempos do período da ‘troika’, sendo que agora torna-se ainda mais grave, porque estamos a falar em custos fixos bastante elevados”.
“Era importante que se encontrasse aqui uma solução. Já não basta a redução do IVA da restauração e preciso encontrar outras: o apoio que tem a ver com os custos fixos e o adiamento ou a reestruturação das dívidas relacionadas com o período Covid”, sugere.
Daniel Serra remata afirmando que se “há uns meses atrás falávamos em tempestade perfeita, neste momento ela existe”.
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