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A Deco defende que, em Portugal, seja estabelecida uma regra para a oferta de taxa fixa no crédito à habitação, considerando que a falta de regulamentação não permite que as taxas sejam transparentes e, logo, não fomenta a concorrência entre bancos.
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Segundo Nuno Rico, economista da associação de defesa do consumidor Deco, a pouca existência de taxas fixas no crédito à habitação em Portugal tem razões históricas e económicas.
“Nunca houve uma verdadeira oferta de taxa fixa que fosse competitiva, houve falta de interesse por parte da banca nessas ofertas”, disse à Lusa, referindo que num estudo feito pela Deco em 2017 e 2018 só cinco bancos tinham essa oferta e eram em geral taxas mistas (uma mistura de taxa fixa e taxa variável) até 10 anos, havendo poucas instituições que propunham taxa fixa para a duração total do contrato.
O facto de Portugal ser um país periférico, percecionado pelos mercados internacionais como de risco maior, também contribuiu para que a taxa variável fosse mais fácil de ser proposta pelos bancos, acrescentou o economista, para quem haver cinco bancos a controlar 80% do mercado é outro fator que não ajuda a fomentar a concorrência.
Assim, em Portugal, a taxa fixa “nunca foi minimamente atrativa quando comparada com a variável”, quer pela pouca oferta quer pela grande diferença entre elas.
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Nuno Rico considerou normal que a taxa fixa seja mais alta, pois há como que o pagamento de um seguro pela certeza de que se pagará sempre o mesmo, mas em Portugal “o problema é o diferencial entre as duas”, que pode ir de 1,5 a 2,0 pontos percentuais.
“Num cenário em que as pessoas já têm muita dificuldade em aceder a crédito devido à elevada desproporcionalidade entre o custo da habitação e o rendimentos acrescentar esta de proporcionalidade [entre taxa fixa e taxa variável] levou à situação que temos hoje”, em que 90% do crédito à habitação existente em Portugal é a taxa variável, o que torna as famílias portuguesas das mais expostas à variação das taxas de juro, explicou.
O economista considera que a falta de enquadramento legal também contribui para, em Portugal, haver sobretudo crédito à habitação a taxa variável.
Nos contratos a taxa variável está estabelecido que a taxa de juro total do empréstimo resulta da soma de duas componentes: o ‘spread’ (a margem de lucro que cada banco define em função do risco do cliente, do seu custo de financiamento e da aquisição pelo cliente de outros produtos bancários) e o indexante de referência (em geral a Euribor, a taxa de referência do mercado interbancário).
A taxa fixa é livremente estabelecida pelo banco.
Em abril, a Deco enviou uma carta aberta ao Governo e ao parlamento na qual defendeu várias medidas para melhorar o programa Mais Habitação, nomeadamente estabelecimento de regulamentação para a taxa fixa.
A Deco defende que, na oferta de taxa fixa de um crédito, deve haver um indicador de referência (por exemplo, as taxas ‘swap’, definidas diariamente pelo mercado) a que o banco acrescentaria o ‘spread’.
“Isso traria duas vantagens para o mercado de taxa fixa, a transparência e a concorrência. Os bancos passariam a concorrer neste mercado pelo ‘spread’”, afirmou Nuno Rico.
Contudo, até agora, disse, não houve qualquer manifestação de interesse nem do Governo nem de algum parlamentar em discutir o tema.
Questionado sobre se compensa aos clientes de novo crédito à habitação optarem pela taxa fixa, Nuno Rico afirmou que, de momento, não há vantagens numa taxa fixa a longo prazo. É que esta está a acompanhar as taxas de mercado e, por isso, a taxa fixa a 30 anos facilmente está acima de 5%.
Contudo, recordou que há ofertas de bancos de taxa fixa para os primeiros anos do crédito (até cinco anos) que podem ser interessantes face à incerteza sobre mais aumentos nas taxas de juro.
“Há bancos a oferecer taxa fixa a dois anos a 3%, quando a média da Euribor a 12 anos é 4%”, afirmou, alertando, contudo, para que os clientes devem ver cuidadosamente todas as condições, nomeadamente se à taxa fixa acresce o ‘spread’.
Em abril, em audição no parlamento, o governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, foi questionado sobre a oferta de taxa fixa pelos bancos, tendo considerado importante que os clientes bancários tenham mais possibilidade de escolher, mas referiu também que essa medida poderá ter pouca eficácia quando as taxas variáveis estão próximas de valores máximos e poderá até fazer com que os consumidores fiquem ‘amarrados’ a uma taxa elevada.
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