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Pedro Magalhães é responsável pela pasta da internacionalização na Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa. Ao Dinheiro Vivo, fala sobre a adaptação que foi necessária para continuar a ajudar as nossas empresas a chegar mais longe e das vantagens de encontrar novos mercados nesta altura especialmente complexa.
2020 foi um ano de desastre e já se percebeu que 2021 não irá por melhor caminho, no entanto as missões da CCIP mantêm-se, ainda que em moldes diferentes. É ainda mais importante neste momento de crise promover este tipo de eventos potenciadores de relações comerciais, novas parcerias e investimento?
Em 2020 a CCIP foi ao encontro das necessidades das empresas nacionais, inovando e adaptando os seus serviços de apoio à internacionalização de forma que estas conseguissem alcançar os resultados esperados – geração de contactos de qualidade que resultam em negócios concretos. Com este fim em vista, começámos – desde o inicio da pandemia – a realizar missões virtuais e projetos de consultoria recorrendo às novas tecnologias assentes na digitalização.
Neste âmbito, e através de um trabalho assente na customização, conseguimos que as nossas empresas e os nossos empresários estivessem frente a frente com os importadores, os distribuidores e/ou os clientes finais mais adequados. Lançámos também um conjunto alargado de webinars sobre internacionalização, com um incremento de mais de 100% no número de participantes, de várias zonas do país e do mundo. Fizemos igualmente mais de 500 reuniões virtuais com empresas que pretendem internacionalizar-se, ajudando-as a perceber os mercados para os quais faz mais sentido exportarem os seus bens e/ou serviços, num trabalho de consultoria individual de apoio direto à internacionalização. Este é, na verdade, o core business da Direção de Comércio Internacional da CCIP – preparar agendas customizadas de reuniões com importadores, distribuidores e/ou clientes finais, em mais de 90 países.
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Este “estar ao lado das empresas”, o “ser útil”, é desde sempre, a trave mestra da nossa atuação. Agora naturalmente que, numa fase tão extraordinária como a que vivemos, tornou-se ainda mais necessário esclarecer, apoiar, ajudar estas empresas, com tudo aquilo que está ao nosso alcance e que permita minimizar o impacto negativo que a pandemia nos trouxe.
No que se refere às empresas exportadoras, eu não diria que foi um ano desastroso, mas sim que 2020 foi um ano muito complexo para estas empresas, com muitas adaptações e novos desafios colocados. Temos um contacto direto e permanente com inúmeras empresas exportadoras e obtemos diferentes tipos de feedback em relação a como correu o último ano, com algumas situações dramáticas, mas também muitas outras de resiliência e, inclusivamente, de incrementos na sua faturação. Naturalmente que todos nós desejaríamos melhores resultados mas, tendo em conta o panorama global, não tenho dúvidas de que as nossas empresas, em termos gerais, deram uma excelente resposta, como tem vindo a ser hábito, e minimizaram os impactos terríveis que se avizinhavam no inicio da pandemia.
Foi difícil adaptar o modelo às restrições impostas pela covid – e já está totalmente oleado, com missões presenciais e remotas?
Nunca é fácil mudar, mas digo-lhe isto sem falsas modéstias. A equipa da CCIP fez um trabalho extraordinário e conseguiu, de forma praticamente imediata, adaptar os seus serviços à nova realidade – o digital. Articulámo-nos internamente para assegurar um objetivo principal – que as empresas pudessem ter acesso a serviços que anteriormente eram 100% presenciais, sem sair de casa. E isso aconteceu mais rápido do que nós pensávamos que seria possível e com resultados muito positivos para as empresas. Neste momento temos um plano bastante flexível, com mais de 80 ações de apoio à internacionalização espalhadas ao longo do ano, num misto de 45 missões presenciais e virtuais a mais de 35 mercados distintos, webinars e eventos sobre internacionalização 100% online, formação em diferentes temáticas ligadas ao comércio internacional, missões inversas de importadores, distribuidores e compradores internacionais e também o lançamento do estudo insight, que que nos permitirá aferir as respostas de mais de 1.000 PME nos seus processos de exportação e adequar estratégias para o futuro. E temos ainda a emissão de certificados de origem eletrónicos, serviço em que fomos, também, pioneiros.
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“Empresas procuram ainda mais” serviços de apoio à internacionalização
As empresas estão a revelar o mesmo – ou até mais – interesse?
Estamos a ter claramente uma procura maior em todos os nossos serviços de apoio à internacionalização, nomeadamente pela transição para o digital – webinars, formação e agendamento de reuniões online / missões virtuais. No que respeita às missões presenciais, temos muitas empresas que querem participar mas que infelizmente temos tido dificuldades em conseguir realizar as deslocações, pela existência de restrições de entrada nos países onde pretendíamos ir – obrigatoriedade de quarentena, confinamentos, teletrabalho obrigatório das empresas locais. Nestes casos passamos a missão para virtual e asseguramos que as empresas têm as reuniões previstas. Mesmo assim, continuamos a acreditar que as missões presenciais não podem ser descartadas – nem serão! – pois o contacto pessoal é sempre diferente. Gera-se confiança, empatia e conhece-se em maior detalhe a realidade de cada empresa envolvida. Fomos muito bem recebidos nas deslocações que fizemos em 2020 – realizámos 4 missões presenciais apesar da pandemia -, num ambiente de total segurança e com algumas das empresas a conseguirem ordens de encomenda nas semanas que se seguiram à missão, o que é extraordinário nesta fase.
Penso que, de uma forma genérica, as empresas procuram alternativas a ficarem paradas à espera que os clientes apareçam. As feiras não se estão a realizar, as deslocações estão limitadas, mas a procura de bens e serviços continua, e por isso as empresas mais dinâmicas continuarão sempre a procurar um caminho – aquele que lhes for possível fruto das circunstâncias – para manterem os níveis de faturação que causem o menor impacto nos seus negócios.
O brexit, mas também as quebras brutais que sofreram as exportações e a crise que afeta os nossos principais parceiros, como também Portugal, tem resultado em mais contactos de empresas à procura de destinos de negócios diferentes? Quais?
Eu penso que o que move as empresas a procurarem destinos diferentes é o fator de diversificação e de minimização do risco. Colocar os “ovos todos no mesmo cesto” nunca deu bons resultados e, por esse motivo, as empresas exportadoras portuguesas, cada vez mais experientes e conhecedoras da realidade dos mercados internacionais, procuram diversificar os seus destinos de exportação. A CCIP tem vindo, desde 2015, a concentrar os seus planos de ações de apoio à internacionalização em geografias maioritariamente fora da EU (para onde estão concentradas cerca de 70 % das nossas exportações). Nestes últimos 5 anos, fizemos mais de 8 missões empresariais ao México, 6 à Rússia, 10 a Marrocos, 7 aos Emirados Árabes Unidos, 5 ao Irão e 5 à Coreia do Sul; isto para lhe dar alguns exemplos de mercados de destino fora do eixo tradicional de exportação portuguesa – UE e PALOP, ajudando assim a minimizar o risco de concentração das nossas empresas.
Ainda em 2020, em fevereiro, estivemos no Cazaquistão com dez empresas, e já estivemos anteriormente várias vezes na Costa do Marfim, na Arábia Saudita, no Chile, no Panamá ou na Austrália, todos mercados que não são de tradição exportadora de Portugal.
Neste momento estamos com muita procura para países africanos (Costa do Marfim, Marrocos, Argélia, Egito, África do Sul e Quénia), para a América Latina (Peru, México, Brasil e Chile), para o Médio Oriente (Emirados Árabes Unidos, Qatar e Arábia Saudita), Eurásia (Rússia, Cazaquistão, Azerbaijão e Geórgia) e para o Sudoeste Asiático (Vietname, Indonésia e Filipinas). No entanto, temos consultores em mais de 90 países, pelo que somos procurados para a preparação de agendas de reuniões na quase totalidade dos mercados que trabalhamos.
A agenda de Internacionalização da CCIP tem tido efeitos? Tem números ou exemplos concretos que possa partilhar?
O principal efeito que os nossos serviços têm está centrado na geração de valor acrescentado. Enquanto intermediários no apoio à internacionalização, somos responsáveis por garantir que as empresas portuguesas exportadoras conseguem estar frente a frente com potenciais clientes, importadores ou distribuidores em mais de 90 mercados. Nos últimos 5 anos ajudámos mais de 500 empresas, com taxas de 90% de satisfação em relação aos contactos conseguidos, com contentores enviados e serviços prestados para os 5 continentes, nos mais variados setores – vinhos, pedras e mármores, alimentar e bebidas, metalomecânica, têxtil, TI, moldes, mobiliário e farmacêutico, por exemplo. Temos inúmeros testemunhos de empresas nossas clientes que atestam a importância da nossa mais-valia – poupar tempo, dinheiro e recursos ás empresas no processo de desenvolvimento de negócio inicial, com mais de 85% das empresas a fechar negócios no curto prazo.
Que perspetivas vê para a recuperação portuguesa neste ano e como pode a captação de investimento e negócios ser determinante para a retoma?
Fazer previsões hoje em dia e no atual contexto é muito difícil. O que me parece importante salientar é que temos hoje em dia um tecido empresarial exportador muito mais competente e sólido do que há 20 anos; que Portugal goza de uma imagem internacional em termos turísticos, empresariais e de credibilidade como há muitos anos não víamos; que o investimento estrangeiro em Portugal – até ao inicio da pandemia – atingiu valores recorde e que, por estes e outros tantos motivos, parece-me que Portugal tem todas as condições para ter uma recuperação rápida e sustentada. Mas vai ser preciso manter o foco na internacionalização e nas exportações (fazendo crescer a sua importância no PIB nacional) e captar o investimento estrangeiro e o capital de que também precisamos – isto num quadro de concorrência internacional a que o nosso vice-presidente, Paulo Portas, ainda recentemente se referiu como muito exigente.
Em que áreas – geográficas e de atividade – se vislumbram mais oportunidades para os nossos empresários?
As oportunidades existem em todo o mundo, dependerá sempre do produto ou serviço que tenhamos, da sua inovação, do que aportará de valor a esse mercado, entre outras variáveis. O que temos feito, e porque não podemos abarcar todo o mundo num ano, é construir planos de ações de internacionalização anuais a mercados onde tenhamos mais procura por parte dos empresários portugueses e onde tenhamos consultores locais que confirmem o interesse pelos produtos e serviços das empresas nacionais. Assistimos hoje em dia a uma mudança clara de muitas empresas, que nos procuram para mercados no sudeste asiático e na áfrica ocidental, por exemplo, bem como na Eurásia e na América Latina. Há cinco anos víamos, ainda, a maior parte das empresas a procurar apoio para internacionalizar para os PALOP e para o norte de áfrica, por exemplo, para não falar da Europa, por questões geográficas e de historial. Penso que é uma mudança muito positiva e necessária, que nos trará benefícios a longo prazo.
Que medida gostava de ver tomada pelo governo para potenciar a recuperação?
Penso que nesta fase, maioritariamente, as empresas necessitam de ter acesso ao dinheiro, não há como dar a volta – precisam de mais fundos para continuarem os seus planos de internacionalização e abordagem a novos mercados, para qualificarem mais os seus RH e as suas unidades produtivas e para apostarem cada vez mais na inovação, na digitalização e na flexibilidade e eficiência dos seus produtos e serviços. O Governo tem de disponibilizar de forma rápida linhas de apoio mais robustas, priorizar o destino dos fundos europeus e injetar esse dinheiro em projetos capazes e que permitam a Portugal alavancar as suas exportações de forma exponencial. Temos muitas empresas que continuam a aguardar por decisões de projetos de internacionalização submetidos há mais de 1 ano.
Ao mesmo tempo, torna-se essencial uma maior capacidade de lobby internacional, fora do âmbito do Turismo. Temos feito campanhas muito positivas neste setor, mas precisamos de alastrar para o lado empresarial, produzindo um trabalho que faça com que a marca Portugal seja consistente em várias frentes, tornando-a ainda mais credível no panorama internacional.
Por outro lado, é positivo saber que o governo está também focado nestes temas, designadamente através do Programa Internacionalizar com o qual temos o maior gosto em colaborar no âmbito do Conselho Estratégico para a Internacionalização da Economia e que é muitíssimo relevante.
Uma ultima nota para uma necessidade comentada por muitas empresas nossas clientes – e que acreditamos o Governo conhece – e que se prende com a necessidade sentida de capacitar as nossas Embaixadas e Consulados com mais quadros dedicados a este trabalho de diplomacia económica. Todo o investimento que se fizer nesta sede servirá para aumentar – ainda mais – os bons resultados que temos conseguido.
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