Foi uma quinta-feira de Páscoa longa até haver acordo entre os ministros das Finanças da zona euro. A reunião do Eurogrupo – por videoconferência – foi adiada três vezes para desbloquear o impasse entre os países do norte e do sul da Europa.
A Holanda acabou por aceitar um pacote financeiro de 500 mil milhões de euros para despesas de saúde (diretas e indiretas) relacionadas com a contenção da pandemia e sem condicionalismos, evitando-se o estigma da troika. Mas ainda falta perceber o que cabe exatamente na definição de despesas diretas e indiretas de saúde relacionadas com o combate ao novo coronavírus.
“O que ficou de algum modo de fora de um controlo mais direto foram as ajudas a despesas diretamente relacionadas com o esforço de contenção, mas essas são esmagadas pela magnitude das quedas de receita fiscal e atividade económica”, sublinha o economista Pedro Brinca da Nova SBE. Ontem, o secretário de Estado das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, garantiu, em entrevista à TSF, que estes apoios não vão transformar-se em austeridade mais adiante.
O principal elemento do plano reside na criação de uma linha de crédito do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) – o fundo de resgate europeu, ESM em inglês – no valor de 240 mil milhões de euros, em que cada país pode aceder até um máximo de 2% do seu PIB (em teoria, seria cerca de 4 mil milhões de euros para Portugal). Este envelope assegurará financiamento aos Estados-membros em condições mais favoráveis e estará operacional dentro de duas semanas, supostamente.
“A linha de crédito do MEE a Itália (e Espanha?) é um instrumento que provavelmente nunca será usado”, antevê Erik Nielsen, economista-chefe do grupo Unicredit.
O segundo mecanismo passa pela criação de um fundo de garantia do Banco Europeu de Investimento no valor de 25 mil milhões de euros que pode alavancar até 200 mil milhões de financiamento para pequenas e médias empresas. E depois há o mecanismo de apoio aos empregos através do SURE, da Comissão Europeia, para o qual estão desde já dedicados 100 mil milhões e que os ministros das Finanças deram o ‘ok’.
“São decisões baseadas na solidariedade e na partilha de risco e isso é bom para a Europa” referiu ao DV Eric Dor, diretor da escola de negócios IESEG, da Universidade Católica de Lille. “A partilha de risco através de garantias também é solidariedade e implica que os países já endividados obterão fundos a uma taxa mais baixa do que se tivessem que emitir sozinhos”, acrescenta.
Para Erik Nielsen o importante “é impedir que a dívida do setor privado aumente mais do que o necessário nos próximos anos e se isso implicar, um aumento significativo nas taxas de juro da dívida pública, que assim seja”, defendendo que é “moralmente correto que a sociedade proteja os seus cidadãos”.
Fundo turbinado mais tarde
Para depois ficou a decisão de criar um mecanismo de recuperação “pós-coronacrise”. Para já, há sinais de compromisso, mas pouco mais. “Também concordamos em trabalhar num Fundo de Recuperação para impulsionar os investimentos europeus de que precisamos para construir uma economia melhor, mais ecológica, mais resiliente e mais digital”, refere o comunicado final do presidente do Eurogrupo, Mário Centeno.
Mas nada mais é dito sobre esta espécie de “plano Marshall” em versão europeia que ficará agora nas mãos dos líderes dos 27. “Vão ser necessários novos mecanismos de solidariedade, como eurobonds, mas vai ser difícil obter um acordo”, antecipa Eric Dor.
A verdade é que sobre a mutualização de dívida europeia – através de coronabonds ou eurobonds – nada é indicado, apenas os tais compromissos de tudo fazer para relançar a economia depois da hecatombe. Para já, estes instrumentos foram postos na gaveta.
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