Dois anos depois de o ex-ministro das Finanças, Mário Centeno, ter anunciado a intenção de recrutar por concurso centralizado mil técnicos superiores para o Estado ainda não há nenhum colocado, nem concurso terminado. E ainda vai demorar. O Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública, que entretanto assumiu a tutela da função pública, só vê o processo terminado dentro de mais um ano.
Ao todo, serão necessários três anos para que o Estado consiga deitar mão de uma reserva de jovens licenciados, em áreas que vão da Economia ao Direito para preencher necessidades dos serviços da Administração Central.
18 mil candidatos
Não houve falta de candidatos. Foram mais de 18 mil os que inicialmente se propuseram a concurso, com 16 mil chamados a fazer provas. Mas, já em julho último, só 800 se qualificaram, o que obrigou a um novo concurso lançado na última semana, para chegar aos 200 em falta. Vai ficar concluído, segundo o governo, no final de 2021.
Até aqui, não houve colocados, confirmou ao DN/Dinheiro Vivo o Ministério da Administração Pública, em resposta sobre o prazo previsto para integrar os já selecionados. “Os candidatos inscritos nesta reserva de recrutamento vão prover às necessidades dos órgãos ou serviços da Administração Pública à medida que estas forem surgindo. Neste momento, aguarda-se a finalização do procedimento de oferta de colocação para se conhecerem estes dados”, referiu.
Com uma média de idades na função pública a rondar os 50 anos, que está a precipitar o número de aposentações, e após uma forte erosão do pessoal nos anos da troika, a Estratégia de Modernização da Administração Pública apresentada pelo governo neste verão pretende garantir renovação. Os planos passam por assegurar uma entrada por cada saída para a aposentação, favorecer pré-reformas, e, chegando a 2023, ter até um quinto dos funcionários do Estado recrutados há menos de cinco anos.
Salário: 1205 euros brutos
Mas não é certo ainda com que mecanismos o governo pretende fazer essa renovação. Os sindicatos falam de um máquina pesada e lenta que pratica salários sem capacidade para reter os mais qualificados. Os candidatos desta bolsa, se colocados, entrarão para ganhar 1205 euros brutos.
“Por cerca de 900 euros líquidos, o emprego público é cada vez menos atrativo. Mesmo em situações onde o desemprego tem significado, o que tem vindo a ficar claro é que nestes recrutamentos centralizados os serviços ficam prejudicados, além das pessoas que não são colocadas com a rapidez que seria necessária”, defende José Abraão, secretário-geral da Federação de Sindicatos da Administração Pública (FESAP), para quem também estará em causa a centralização do concurso.
“Ainda há hoje serviços à espera desses técnicos superiores quando podiam ter aberto concursos mais curtos, específicos, e as necessidades permanentes poderiam estar já satisfeitas”, diz o dirigente sindical.
Outra hipótese apontada por José Abraão como razão do fraco resultado do concurso tem a ver com o recurso crescente a trabalhadores precários desde o último ano – aumentaram 9% até junho. “Será que aquelas necessidades que eram permanentes e às quais se destinavam os mil trabalhadores têm vindo a ser satisfeitas por gente precária que depois vai para a rua?”, questiona.
A Fesap está entre os três sindicatos da função pública que na próxima semana (dias 6 e 9) se sentam com os responsáveis do governo para discutir medidas no Orçamento do Estado do próximo ano. Passam pela questão salarial – e os sindicatos pedem aumentos e uma revisão global da tabela remuneratória única – mas também por mais temas relacionados com a capacidade de o Estado atrair e reter qualificações: a formação, que esperam ver reforçada com os fundos europeus do Plano de Recuperação, o sistema de avaliação dos trabalhadores, uma integração ágil de precários, e o estabelecimento de um vínculo contratual único.
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