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O montante total de empréstimos concedidos pelos bancos às famílias para compra de habitação – maioritariamente indexados à Euribor (90%) – reduziu-se durante o primeiro trimestre de 2023: de 100,3 mil milhões de euros no final de dezembro de 2022, a carteira consolidada passou a 97,9 mil milhões no fecho de março, encolhendo 2,4 mil milhões de euros. O motivo da desaceleração? O aumento das amortizações antecipadas desde o início do ano, apontou o Banco de Portugal (BdP), no seu mais recente Relatório de Estabilidade Financeira (REF), sem indicar valores absolutos.
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Em resposta ao DN/Dinheiro Vivo, porém, o supervisor revelou esses números, destacando-se uma nova tendência: durante os primeiros três meses do ano, as amortizações feitas pelas famílias portuguesas dispararam 70% relativamente aos valores de há um ano. Foram 2,6 mil milhões de euros pagos antecipadamente em crédito à habitação, representando esta quantia 2,6% do stock. Em março de 2022, o pagamento antecipado da dívida da casa cifrava-se nos 1,5 mil milhões de euros.
“Este é um desenvolvimento considerado normal num contexto de aumento acentuado do custo dos empréstimos e que é potenciado pelo diferencial significativo face às taxas de remuneração de depósitos, as quais têm aumentado de forma mais gradual”, justifica o regulador.
Também a Associação Portuguesa de Bancos (APB) reitera a “racionalidade” de tal comportamento, explicando que “é natural que, perante o atual contexto de subida das taxas de juro e os incentivos concedidos para a amortização antecipada do crédito à habitação, as famílias procurem as opções que são mais favoráveis aos seus interesses e às suas possibilidades”.
A instituição liderada por Vítor Bento garante que os aumentos dos reembolsos não envolvem “nenhuma preocupação especial”.
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Entre os “incentivos” encontra-se o decreto-lei n.º 80-A/2022, que entrou em vigor no final de novembro e que veio permitir às famílias amortizarem o crédito hipotecário antecipadamente, sem pagar quaisquer impostos ou comissões. O novo diploma estabelece a isenção da comissão de 0,5% e do imposto de selo, habitualmente cobrados pelos bancos no processo de amortização antecipada de créditos para aquisição ou construção de habitação própria permanente.
A medida, que consta do pacote Mais Habitação apresentado pelo governo, destina-se a contratos indexados às taxas variáveis e não impõe limites para o valor em dívida.
Levantar depósitos para amortizar
O governador do BdP reconheceu ainda, durante a apresentação do REF, que as novas regras produziram “um impacto significativo no sistema bancário”. Facto é que bancos como a Caixa Geral de Depósitos (CGD), Santander, BPI e Millennium bcp admitiram um aumento das amortizações desde o início do ano, justificando, inclusive, parte da saída de depósitos de clientes para este efeito.
Paulo Macedo foi o único dos líderes a avançar com valores, ao indicar que os reembolsos na CGD totalizaram 600 milhões desde março de 2022.
Em simultâneo, as estatísticas publicadas pelo regulador no primeiro trimestre revelam que as instituições financeiras em Portugal perderam 7,6 mil milhões de euros em depósitos de particulares. Em janeiro foram menos 2,5 mil milhões, em fevereiro mais 2,1 mil milhões e em março 3 mil milhões. No final deste período, o stock de depósitos de famílias totalizava 174,8 mil milhões, refletindo um decréscimo homólogo de 0,3%.
Recorda a APB que “a redução do stock de depósitos de particulares que tem ocorrido enquadra-se também nas opções das famílias de diversificar a aplicação das suas poupanças”. A associação que representa o setor bancário refere-se ao aumento da procura pelos Certificados de Aforro, cujas subscrições líquidas somaram nove mil milhões de euros nos primeiros três meses do ano, segundo as contas feitas pelo DN/Dinheiro Vivo, com base nos dados do BdP.
Mário Centeno assegurou que os indicadores financeiros “não revelam nenhuma dificuldade face àquilo que tem sido a evolução recente da alocação das poupanças das famílias”, nomeadamente nos títulos de dívida pública, à semelhança da APB, que garante que “os montantes materializados não afetam os níveis de liquidez dos bancos, que se mantêm muito robustos”. “Consideramos que isso faz parte até de uma saudável concorrência que é oferecida a quem poupa”, vincou o governador.
Proposta a caminho
No início de março, o governo entregou ao Parlamento uma proposta no âmbito do pacote Mais Habitação que visa incluir as mais-valias decorrentes da venda de imóveis realizadas em 2022 no regime excecional de isenção de IRS. Com a nova lei, as famílias ficam livres do imposto, caso usem o valor em causa para amortizar os empréstimos contraídos para compra de habitação própria e permanente.
A medida já constava da primeira versão da proposta colocada em consulta pública, mas aplicava-se apenas a transações efetuadas em 2023 e 2024.
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