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As famílias residentes em Portugal tiveram de recorrer de forma significativa às poupanças que lograram obter durante a pandemia e a era dos juros baixos e, diz um novo estudo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), em termos comparativos (num grupo de 18 países desenvolvidos), são as que mais estão a consumir as poupanças para fazer frente à crise inflacionista que começou em 2022.
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Nas novas perspetivas (outlook) económicas, apura um indicador designado de “excesso de poupança” (o Banco de Portugal apelida-o de “poupança acumulada”) que, basicamente, mede a poupança que as famílias conseguiram acumular ou amealhar acima dos níveis ditos normais registados antes da pandemia (2015 a 2019).
Esse excesso, em boa parte explicado pelos apoios relativamente generosos dos governos durante os confinamentos da pandemia, a época de juros quase zero, está agora a ser delapidado rapidamente pela subida das taxas de juro e pela deterioração do poder de compra, com muitas famílias a usarem esses fundos (podem ser poupanças clássicas, como depósitos a prazo) para amortizar empréstimos para compra de casa, por exemplo.
Dessa forma, tentam ficar um pouco menos vulneráveis face à subida repentina e agressiva das taxas de juro do Banco Central Europeu (BCE) e dos bancos comerciais, no caso de Portugal.
Segundo a OCDE, essa almofada ou reserva ao nível da poupança medida em proporção do rendimento disponível familiar está a ser consumida muito mais depressa do que na maioria dos países ricos analisados.
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Em meados de 2022 (segundo trimestre), a poupança acumulada em excesso das famílias portuguesas equivalia a 8% do seu rendimento bruto. A média da Zona Euro era 12,4%.
Veio a crise em força e a subida brutal das taxas de juro, e as famílias que tinham algum pé-de-meia a que puderam recorrer, usaram-no.
Foi de tal forma que, em apenas um ano, até meados de 2023, a poupança em excesso dos portugueses baixou para 6,7% do rendimento disponível, praticamente metade do valor registado ao nível da Zona Euro.
As famílias residentes em Portugal usaram assim 1,3 pontos percentuais da sua margem de poupança para enfrentar a crise. Este ranking de quem mais foi às poupanças é liderado pelos italianos (-2,7 pontos percentuais no ano em análise) e pelos norte-americanos (-1,9 pontos percentuais).
A média da Zona Euro foi em sentido contrário, até. Houve um reforço na poupança acumulada em excesso na ordem dos 0,3 pontos, essencialmente puxada pelos casos de França, Áustria, Alemanha e Espanha.
Em Portugal, exceto nos anos da pandemia, a taxa de poupança sempre foi muito baixa “em termos históricos e internacionais”, como observa o Banco de Portugal, o que faz desta realidade detetada pela OCDE ainda mais preocupante.
Quando esta poupança em excesso se esvair, significa que muitas famílias portuguesas poderão enfrentar problemas sérios no caso de uma nova crise grave.
Segundo a OCDE, no período pré-pandemia (2015 a 2019), o indicador clássico de poupança bruta dos particulares (famílias) rondou os 6,9%, valor que era cerca de metade da média da Zona Euro, que estava em 13,7%.
Para os próximos anos, a OCDE projeta uma recuperação da poupança dos portugueses para 9% do rendimento disponível no período de 2024 e 2025, mas esta continuará muito abaixo dos padrões europeus (média de 16% na Zona Euro).
Como referido, em Portugal houve uma corrida às poupanças por causa da subida das taxas de juro. Muito dinheiro foi levantado do banco para reduzir o empréstimo (capital e juros) do banco.
Depósitos baratos, empréstimos caros, poupança a afundar
O Banco de Portugal confere isso mesmo. “Atendendo à subida dos encargos com o serviço de dívida e ao diferencial significativo face às taxas de remuneração dos depósitos, muitas famílias com poupança acumulada reduziram, parcial ou totalmente, os seus créditos à habitação”, diz o banco central no Relatório de Estabilidade Financeira, publicado há uma semana.
“A taxa de poupança continua baixa em termos históricos e internacionais. O rácio dos particulares caiu para 5,7% do rendimento disponível no ano terminado em junho de 2023, um valor inferior ao de 2019 (7,2%) e ao de 2022 (6,5%), depois do forte aumento observado durante a pandemia (11,9% em 2020 e 10,6% em 2021)”, acrescenta.
“A aquisição de ativos financeiros reduziu-se para 0,1% do rendimento disponível (5% no primeiro semestre de 2022), observando-se uma realocação de aplicações em depósitos, que se reduziram em 8,7% do rendimento disponível, para subscrições de certificados de aforro”.
Mas também houve, ao longo do primeiro semestre de 2023, “desinvestimento em ações e outras participações exceto unidades de participação em fundos de investimento (-2,8% do rendimento disponível) e em seguros e fundos de pensões (-4,4% do rendimento disponível)”, enumera o BdP.
A OCDE recorda que a redução do excesso de poupança acumulada desde o início da pandemia é uma “área importante de incerteza” na medida em que até pode “proporcionar margem para surpresas positivas no crescimento”.
“O fenómeno de poupança excessiva aplica-se principalmente às economias avançadas, onde as medidas públicas para apoiar o rendimento das famílias na primeira fase da pandemia foram substanciais e em que as possibilidades de consumo foram limitadas pelas restrições de mobilidade e pelo encerramento de partes da economia, especialmente nos setores dos serviços”, descreve a organização dos países mais ricos e maiores do mundo.
Isso fez disparar a poupança em termos gerais, como se sabe. Vai fazer dois anos que esse tempo acabou e a poupança das pessoas tem vindo a regressar paulatinamente aos bancos, mas na forma de receita, de pagamento pelo crédito concedido, como é o caso evidente de Portugal.
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