Por causa do coronavírus já há empresas em situações complexas em vários setores e essa tendência vai alastrar-se. O crédito malparado vai aumentar?
É muito natural que o crédito malparado tenha tendência para vir a aumentar, mas este é um momento muito especial, um momento para agir, exatamente para procurar evitar que as consequências para a economia desta crise de saúde pública de grande intensidade – e que tem que ser olhada com a máxima seriedade – sejam minimizadas; devem ser tomadas medidas para procurar minimizar esses efeitos. Para já, os de curto prazo são evidentes. Certos setores da economia estão a ser já bastante afetados pelo facto de, por um lado, tanto do lado da oferta como do lado da procura se registarem quebras significativas. As cadeias de produção podem estar a ser afetadas pela dificuldade de receber componentes. Todo o movimento causado pelas medidas de contenção adotadas levam grande parte das pessoas a diminuir o consumo. Há setores que são automática e profundamente afetados – tudo que tem que ver com as viagens, o turismo, a restauração, os eventos que são mais diretamente afetados nesta fase inicial. E portanto é natural que haja uma quebra enorme dos proveitos das empresas que trabalham nesses setores e podem ter grandes dificuldades de tesouraria. Naturalmente vai depender muito da profundidade e da duração da crise.
Vai depender da duração…
Se se conseguir que o pico seja atingido rapidamente e as medidas tenham o efeito que permita uma redução num tempo curto, os efeitos serão menores. Se isso não for conseguido, podemos vir mesmo a entrar numa situação que conduzirá a uma recessão global, que é preocupante. Autoridades, governos, Banco Central Europeu, Comissão, terão de estar muito empenhados em pôr em curso medidas que ajudem a minimizar estes efeitos. E tem havido um diálogo bastante importante entre o setor bancário e essas autoridades a nível nacional e europeu, designadamente através da Federação Bancária Europeia. O setor bancário está profundamente empenhado em contribuir para a minimização da crise.
Vídeo: Podemos entrar numa recessão global
Mas de que forma? A banca pode dar um contributo especial, facilitando a vida às empresas que tenham dificuldades em pagar os créditos que têm junto das instituições financeiras, por exemplo? O sistema vai ter essa abertura?
Uma das soluções que se admite que pode vir a ter particular impacto tem que ver com a concessão de moratórias. Isto, aliás, foi adotado no início da crise financeira global.
A moratória tem de ter autorização do Banco de Portugal e do próprio BCE?
A moratória, em princípio, vai ser decidida a nível político, eventualmente exigirá medidas legislativas, se for generalizada. Mas nós podemos também falar em moratórias concedidas pelas próprias instituições, que são uma espécie de reestruturação de crédito onde se permite que haja um período de carência, uma extensão do financiamento concedido.
Aí os bancos não precisam de esperar pelo Banco Portugal.
Nessa altura não precisarão.
Vídeo: Poderá haver moratórias garantidas pelas próprias instituições
Nesse caso poderiam atuar já, tentar ajudar já a economia…
O que acontece, e esta é uma preocupação significativa do sistema bancário, é que para não ter efeitos particularmente negativos em termos de rácios de capital e de rácios de incumprimento, é necessário que haja uma flexibilização da regulação. Esta é uma das propostas que a Federação Bancária Europeia – e nós, a nível nacional ––, consideramos que é muito importante que venha a ser resolvida. Hoje já medidas quer no âmbito da política monetária do BCE quer no âmbito da área da supervisão que vêm ao encontro destas preocupações. Uma moratória é um acordo para dilatar o prazo de pagamento dos empréstimos e permitir ultrapassar um período curto de dificuldades. Esta matéria também foi praticada em 2009 pelas instituições bancárias no apoio às empresas e no crédito à habitação. O que também consideramos essencial, na medida em que os bancos têm que cumprir modelos de avaliação de risco rigorosos, é que essas condições se façam a empresas sejam viáveis.
O BCE disse nesta quinta-feira que admite que os bancos possam falhar temporariamente limites de capital. Será também para ajudar nisso? E chega?
É também uma das matérias que considerávamos particularmente relevante, que houvesse uma flexibilização no que respeita ao cumprimento de rácios, e foram tomadas várias medidas que vêm ao encontro desse desejo. Estamos comprometidos em apoiar francamente este período difícil que espero que não se intensifique e alargue. Mas não podemos deixar de analisar com rigor os indicadores. E não há dúvida que, por exemplo, em termos de mercado de capitais, nas bolsas, está-se já a descontar a possibilidade de uma recessão a nível global, que pode ser maior ou menor de acordo com a duração da crise.
Nas moratórias em que os bancos podem tomar a decisão, essa poderá acontecer em que tempo? No prazo de um mês os empresários poderão ter luz verde?
Depende de banco para banco.
Que prazo seria bom?
Em 2009, as decisões foram tomadas com a rapidez que se justificava. Tenho a certeza que isso também acontecerá com dois tipos de condições: que isto não afete em termos de rácios de capital e situação patrimonial dos bancos as próprias instituições e que em termos de avaliação do risco as empresas sejam mesmo viáveis.
Não seria esta uma boa altura para deixar cair a taxa sobre os depósitos, por exemplo?
Pois, isso como sabe é uma posição que os bancos têm como muito firme e nós, quando sentimos que temos razão, devemos lutar até ao fim para que se retifique o que não está correto. Na realidade, Portugal é no âmbito da União Europeia um caso de exceção nessa matéria. E portanto é uma medida discriminatória para o sistema bancário português que do nosso ponto de vista não não faz sentido e não devia existir. Nós estamos numa união bancária e aquilo que se pretende é que exista um nível igual, um leveled playing field para todos os sistemas bancários que estão inseridos na união bancária; nós sentimos que estamos a ser penalizados, colocamos os nossos bancos em desvantagem em relação aos seus pares. Mas não é matéria que neste momento, no âmbito daquilo que são as nossas principais preocupações em relação a estes efeitos que tínhamos colocado em cima da mesa… julgamos que seria de justiça rever essa como outras desvantagens que a banca tem neste momento.
O governo anunciou um novo regime de layoff simplificado para as empresas que precisam de parar e uma linha de crédito para apoiar a tesouraria de cerca de 200 milhões de euros, entre muitas outras medidas. São os medicamentos certos?
Parecem-me medidas completamente adequadas e a banca seguramente vai estar presente – serão muito provavelmente linhas de crédito protocoladas. A banca estará seguramente disposta a adotar também outro tipo de medidas e soluções, quando se trata de problemas de tesouraria mas as empresas sejam indiscutivelmente viáveis, e encontrar soluções para esta dificuldade conjuntural.
Vídeo: A banca estará disposta a ajudar empresas viáveis
O coronavírus deve obrigar a repensar o modelo de crescimento muito assente no turismo?
O turismo é uma atividade económica em que Portugal tem manifestamente vantagens comparativas e competitivas e condições naturais para ser desenvolvida. Continuo a pensar que este modelo tem de ser complementado com o desenvolvimento de outros setores, mas será sempre nuclear para a economia portuguesa. Estamos a fazer as comparações de sempre. Quando eu fui ministro do turismo referia muitas vezes que tínhamos condições para ser ou a Florida ou a Califórnia da Europa, consoante pensemos num maior peso do turismo e complementares em relação a outros setores da economia ou com desenvolvimento de outras atividades fundamentais. Também temos condições particularmente favoráveis para o desenvolvimento da economia digital. Temos talentos nessa matéria; e todo o outro conjunto de atividades económicas indispensáveis para o crescimento. E este está muito dependente do investimento – o papel da banca, mais uma vez, é de uma importância vital. Portugal sempre teve insuficiência de capitais, o capital privado sempre foi exíguo e o sistema bancário nacional durante décadas tem vindo a colmatar essa insuficiência. Tem sido verdadeiramente o motor da economia. E passado este período de dificuldades na banca, estamos francamente mais fortalecidos e este papel vai tornar a ser mais referido no que respeita àquilo que de positivo a banca ofereceu a este país. Os bancos hoje não têm problemas de liquidez, estamos com um rácio muito alto, mais do dobro do mínimo requerido. Esse é um aspeto muito mais favorável do que em relação à crise de 2008/2009, e depois a da dívida soberana. Porquê? Porque aí o nosso endividamento externo era enorme, o rácio de transformação, isto é, a relação entre crédito e depósitos, era altíssima e quando houve a crise a liquidez foi profundamente afetada. Fecharam-se os mercados e a nossa banca não estava preparada. Hoje o valor dos depósitos é francamente superior ao crédito concedido e isso é favorável.
A crise do coronavírus pode pôr em risco as metas orçamentais?
Acho que afetará seguramente. O momento que estamos a viver indicia isso. A extensão é que vai depender da forma como conseguimos debelar o problema o mais rápido possível. E pode não ser fácil.
Vídeo: Coronavírus vai afetar as metas orçamentais
O governo terá de apresentar um orçamento retificativo?
Vamos esperar, mas a probabilidade existe e pode ser significativa. Em relação ao orçamento aprovado há pouco tempo, creio que o quadro macroeconómico que lhe estava subjacente provavelmente já não corresponde à realidade.
O sistema financeiro adotou medidas de contenção que incluem a recomendação aos clientes de que evitem ir às agências. Pode haver um fecho temporário dos balcões?
Depende de haver casos nesses balcões ou uma situação de perigo iminente que o justifique. A dimensão das agências varia muito, algumas têm muito poucos funcionários. Se um for afetado, há alguma possibilidade de ter de encerrar temporariamente. Nessa altura, aquilo que se recomenda e que os bancos praticam é a agência mais próxima servir de apoio ao cliente. No que diz respeito às recomendações que fazemos aos clientes, de utilização de tanto quanto possível dos meios digitais, creio que deve haver um conjunto de medidas complementares recomendadas pela Direção-Geral de Saúde. Por exemplo, uma pessoa num ATM clica com os dedos; pode clicar com uma caneta… Naquilo que tem que ver com a responsabilidade das pessoas em relação a si próprias, à sociedade, à comunidade com que vivem, adotar procedimentos que procurem evitar ao máximo a propagação deste vírus.
Vídeo: Há possibilidade de encerrar temporariamente agências
Vamos então mudar de tema. O Novo Banco já pediu quase 3 mil milhões de euros ao fundo de resolução ao longo destes anos. Será que vai atingir o limite dos 3,9 mil milhões?
Aquilo que tem sido publicamente referido, designadamente pelo presidente do Novo Banco, é que espera que isso não aconteça. No entanto já estamos muito próximo do limite. Essa foi uma das razões por que o sistema bancário, quando foi feita a negociação, levantou algumas reservas. Porque se na realidade o estado teve que intervir nesta matéria para financiar um fundo que não estava dotado, a verdade é que a responsabilidade última é de todo o sistema bancário. O sistema bancário paga um montante muito relevante e eu já vou dar um exemplo. Um montante muito relevante anualmente para o fundo de resolução nacional e paga ao mesmo tempo para o fundo de resolução europeu. É um fardo significativo para o conjunto do sistema bancário nacional e é um fardo com consequências. Um dos grandes consultores internacionais há dias, numa conferência, referiu que a digitalização da banca portuguesa deveria ser um bocadinho reforçada com mais investimento e apontou o montante de mais 100 milhões por ano para atingir o ritmo digamos, do quartil superior dos bancos digitais dos sistemas bancários mais digitalizados da Europa. Ora bem, só a Caixa Geral de Depósitos e o BCP pagam para o fundo de resolução anualmente mais do que esses 100 milhões de euros. Portanto, é de facto uma carga sobre o sistema bancário que inibe outros desenvolvimentos. Mas pronto, tomada a decisão na altura, agora temos que prosseguir este caminho e esperar que de facto o mecanismo contingente não atinja completamente o limite e a resolução dos problemas do Novo Banco terminem de facto no fim deste ano.
Apesar dessa perspetiva que não atinja o limite, será que uma nova crise pode fazer com que o Novo Banco venha a precisar de mais injeções de capital?
Uma nova crise e principalmente, dependendo da dimensão de uma recessão que possa acontecer, vai afetar o sistema bancário porque afeta sempre. Agora, é para isso que os bancos têm acionistas, e no caso concreto do Novo Banco, o acionista muito maioritário é um acionista privado. A primeira responsabilidade de isso ocorrer vai ser da parte do acionista.
Vídeo: Venda do Novo Banco? “faz sentido encontrar solução no mercado nacional”
Falar também do Novo Banco mas a propósito do movimento de fusões e aquisições que se vai falando no setor em Portugal, se ficará ou não ficará com o Millennium BCP. Parece-lhe que esta possa vir a ser a melhor solução?
Eu como presidente da APB tenho muita dificuldade em apontar melhores soluções. Posso falar em termos genéricos. Sem dúvida, e basta olhar para o que foi a queda do crédito concedido à economia e o crédito global que foi concedido desde 2011 até agora, houve uma queda de 30%. Por outro lado, quando temos um rácio de transformação abaixo dos 90%, tudo isso são claras demonstrações de que neste momento temos uma oferta bancária muito superior à procura bancária de crédito. E portanto, faz todo o sentido falar em consolidação do sistema, embora em termos de concentração, o nosso sistema bancário seja considerado, a nível europeu, um nível de concentração razoável para economias da nossa dimensão, mas quando falamos só de ter uma concentração em 5 bancos de cerca de 80% da quota de mercado, isso já é elevado. Em qualquer circunstância a consolidação não significa só fusões e aquisições. A consolidação tem três vias. Essa é uma delas e é preciso que haja sinergias que justifiquem interessados para esse efeito, a segunda é a redução dos ativos das instituições, elas próprias têm que diminuir a sua capacidade. E a terceira é desaparecem um ou outro banco. Esta última é indesejada. Não não estou a ver que tenhamos qualquer tipo de situação próxima disso. As outras duas vão depender, naturalmente, da evolução do mercado. No caso concreto de não entramos numa recessão muito profunda, que seria um bocadinho dissuasora, a verdade é que faz sentido pensar que uma solução favorável para, se o atual acionista do Novo Banco quiser vender a sua participação, encontrasse no mercado nacional um banco já instalado que tivesse interesse em que isso acontecesse.
Vamos então falar de outro tema, as comissões. O parlamento restringiu as comissões que os bancos podem cobrar no MB WAY. Que impacto é que esta decisão pode ter nas contas dos bancos?
Como sabe, o sistema bancário português, de um modo geral, contesta totalmente as iniciativas legislativas que foram submetidas no parlamento. E contestam por três tipos de razões. Primeiro, por questões de princípio, em segundo lugar porque os argumentos apresentados são em muitas circunstâncias falaciosos e em terceiro lugar pelas consequências muito significativas que isso pode ter para o sistema bancário. E essas consequências não se confinam ao valor em si das consequências diretas deste tipo de iniciativa. Mas se me permite, se tiver um bocadinho de tempo, vou sintetizar brevissimamente estes três fatores. Primeiro fator, questões de princípio. Nós estamos num modelo de sociedade, integrados numa União Europeia que prossegue uma economia de mercado e incompreensível uma economia de mercado é um atropelo à livre concorrência e é uma discriminação negativa do sistema bancário em relação aos sistemas bancários europeus e em relação aos outros setores da economia que só se pensam medidas desta natureza em relação ao sistema bancário. Portanto, tanto por questões de princípio, do meu ponto de vista, estas iniciativas que teoricamente visam a proteção do consumidor e na realidade a União Europeia é um Paladino da Proteção do consumidor e o próprio sistema bancário, naturalmente, neste momento todos os bancos têm departamentos para defesa dos consumidores e proteção dos consumidores, está muito longe da ideia do sistema bancário não considerar este um vetor fundamental da sua atuação aproximação com as clientes e portanto a relação de confiança com os clientes, mas nós já temos um quadro que se esse quadro neste momento de supervisão comportamental for devidamente aplicado, não vemos nenhuma razão para estas medidas de exceção. Segunda questão dos argumentos. Primeiro argumento que tem sido muito utilizado é se os bancos têm aumentado desmesuradamente as comissões. É um argumento completamente falacioso. Se acompanhar a evolução desde 2008…Mas falemos em 2011. As comissões líquidas dos bancos eram 3,9 mil milhões. Neste momento são 2,8 mil milhões, e ao longo deste período de 10 anos, esta redução de 1000 milhões está demonstrada pelos dados que são publicados. Segunda questão: o peso das comissões no produto bancário. Como sabe, o produto bancário tem basicamente três componentes que são a margem financeira, as comissões e o resultado de operações financeiras. Este é relativamente marginal a não ser em circunstâncias especiais. E o que conta basicamente é margem financeira e comissões. A margem financeira está sob pressão, tem vindo manifestamente a diminuir com as taxas de juro negativas.
Já agora para os ouvintes que nos escutam e que não estejam a par o jargão, digamos assim, a margem financeira é a diferença entre aquilo que os bancos ganham através do crédito que concedem e aquilo que pagam nos depósitos.
Portanto, tem havido ao longo do tempo uma relação entre um e outro que se tem mantido praticamente constante variando entre 28% e 31%. Isto é, as comissões no produto bancário pesam entre 28 e 31 e naturalmente a margem financeira será a diferença para os 100%. Ora bem, tem-se mantido constante. E mais ainda, quando comparamos com o sistema bancário europeu – e nós fizemos esse trabalho – a coincidência é quase total. É também entre 28 e 31%. Portanto, é um argumento manifestante falacioso. Segundo argumento que tem sido apresentado: que há comissões que não correspondem a serviços. Ora bem, não penso que haja muitas comissões… Os preçários dos bancos têm, de facto, muitas comissões, mas são os próprios bancos que têm que justificar que essas comissões correspondem a serviços efetivamente prestados. E há um ou outro caso que é mais referido em que essa questão é mais sensível para o comum das pessoas, mas a generalidade corresponde a serviços prestados. E o que é que representa na realidade uma comissão? Ela traduz o valor que é atribuído à prestação de um serviço. Esse valor cobre de alguma maneira os custos de investimento, das Infraestruturas, dos recursos humanos afetos a determinados tipo de trabalho, etc. E corresponde também, dentro de um princípio entre a procura e a oferta o valor que atribuído à prestação desse serviço. Para além disso, os bancos têm deveres de informação que são extremamente rigorosos. Todos publicam preçários, há uma comparação entre os valores dos diferentes bancos que é fornecida pelo Banco de Portugal e portanto, o consumidor está protegido. Terceira questão, que é talvez a mais referida nestes diplomas.
De forma sintética, por favor.
Há comissões irrazoáveis que violam o princípio da proporcionalidade. Pronto, é um argumento que é apresentado. E a DECO também o apresenta. Ora bem, como se afere isto, vou-lhe dar um exemplo. Eu preciso da emissão de um passaporte e vou aos serviços da administração pública e pago sem urgência, 65 euros pelo passaporte. É um serviço público. Qual é a proporcionalidade destes 65 euros que eu pago pelo passaporte? Qual é a justificação para serem 65 e não 10 ou 20? A mesma coisa se passa em relação aos serviços de telecomunicações, aos pacotes de serviços de telecomunicações. O pacote do streaming… Não é um cliente a mais que interfere no custo, o custo é marginal, mas a verdade é que uma pessoa paga e em relação a esse tipo de serviços geralmente não tenho qualquer tipo de proteste. Portanto, é mais um argumento onde é particularmente difícil referir esta questão.
E portanto, resumindo e dado que a margem financeira está muito pressionada, este aumento das comissões é um caminho sem retorno para os bancos?
O aumento das comissões depende da… Muito provavelmente do momento em que a política monetária e as taxas de juro passarem a atingir valores normais. A verdade é que durante muitos anos a margem financeira permitiu subsidiar a prestação dos serviços que justificam cobrar comissões. Portanto, penso que numa situação normal vai depender.
Vamos falar de outro tema sensível: o Montepio. O mercado está preocupado com a situação frágil do banco. Como presidente da APB, está otimista? O que é que ainda aí vem?
Como presidente da APB não posso falar numa instituição em concreto, só em termos genéricos. O Montepio tem sido acompanhado pela supervisão do Banco de Portugal e do Banco Central Europeu, com o necessário rigor e precaução. Quando há qualquer tipo de clamor de que se passa qualquer coisa, são reforçados os mecanismos de acompanhamento de qualquer instituição e até agora não há nenhuma indicação que possa pôr em causa a solidez do Montepio. Em relação ao acionista do Montepio, também não me vou pronunciar, é matéria da maior relevância, porque se trata de uma instituição da economia social com um número muito significativo de associados, portanto que seguramente o próprio governo está a acompanhar.
Vamos ao Eurobic. O Luanda Leaks terá minado alguma confiança dos clientes para com os bancos?
Creio que não temos nenhum registo que indicie qualquer tipo de quebra de confiança provocada pelo Luanda Leaks. E sobre essa matéria, a defesa do branqueamento de capitais, gostaria de referir porque estive envolvido em conversações que o sistema bancário português, em dezembro 2017, foi avaliado pelo GAFI – instituição internacional que acompanha os mecanismos adotados pelas instituições financeiras para satisfazer os requisitos nesta matéria. E foi considerado que o sistema bancário nacional era robusto. Não é seguramente num período tão curto, um ano e pico, que houve alterações. Pelo contrário, eu penso que todas as instituições até têm vindo a reforçar significativamente as suas áreas da AML. E o sistema bancário português tem hoje um custo que representa mais de 10% do custo total do sistema bancário.
A opinião pública não tem razão quando diz que a banca tem fechado os olhos ao branqueamento de capitais?
Há dados públicos, oficiais, de 2018, que revelam que os bancos comunicaram ao DCIAP, que é a unidade que acompanha esta matéria, 5711 operações suspeitas que deram origem a 143 inquéritos. Não se compara o número de casos apresentados pelo sistema bancário com os das outras áreas de atividade. Há na realidade um acompanhamento. Quando se justifica haver melhorias eu penso que as instituições são as primeiras a estar interessadas nisso. Em relação ao caso do Eurobic, é conhecido que dois anos antes o Banco de Portugal tinha identificado necessidades de melhorias no âmbito destas ações. Muitas foram cumpridas, outras não terão sido, mas está em curso uma auditoria que irá dizer se houve ou não falhas.
Termina o mandato na APB no final deste ano. Vai continuar?
Não, no final deste ano deixarei de ser presidente da APB. Tenho 78 anos, vou ficar por aqui.
Quem tem que gostaria de ver à frente da APB? Nuno Amado seria uma boa escolha?
Só os associados da APB terão aí uma palavra, a escolha é deles.
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