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Em entrevista à agência Lusa, o professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), da Universidade de Lisboa, e investigador nas áreas da distribuição do rendimento ou da desigualdade e pobreza afirmou que se há alguma coisa que esta crise provou é que é preciso um Estado Social forte.
Deu como exemplo o caso de muitas famílias em Portugal que viviam da economia informal, “de setores com uma ligação muito ténue ou inexistente ao mercado formal de trabalho”.
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“Se isso no passado, em termos de crise, funcionava como um escape, como um amortecedor, quando tudo para, essas famílias ficam sem qualquer tipo de rendimento”, apontou, recordando que em março e abril do ano passado o “confinamento relativamente grande” levou a que “a atividade económica ficasse congelada”.
Farinha Rodrigues apontou que exatamente pelo facto de estas pessoas terem “uma ligação muito ténue com o mercado de trabalho”, elas estão também “excluídas dos mecanismos tradicionais de proteção social”.
“A segurança social habitualmente não lida com aquelas pessoas e portanto, de repente, as políticas públicas foram colocadas perante a necessidade de ter de reinventar alguns dos nossos esquemas para apanhar estas pessoas”, explicou.
Razão pela qual acredita que “este é um desafio do presente que ficará também para depois da pandemia”.
“Como é que nós fazemos para trazer estas pessoas para o mercado de trabalho formal, para lhes garantir direitos e deveres”, questionou, dando como exemplo o facto de as políticas públicas terem tido de se adaptar para que a segurança social conseguisse apanhar setores da população que não estavam abrangidos pelos mecanismos regulares de proteção social.
Na opinião do professor e investigador, é isso que justifica que algumas das medidas criadas de apoio às famílias e às empresas, por causa das consequências da pandemia, “tenham sido alteradas cinco, 10 vezes”.
Farinha Rodrigues acredita, por isso, que “se alguma coisa esta crise provou foi a necessidade de [haver] um Estado Social forte”.
“Espero que a larga maioria dessas pessoas perceba os benefícios de estar enquadrado no Estado Social. Isso é um processo, não é uma decisão do momento, é algo que suponho, se tudo correr bem, vai demorar anos a concretizar-se, mas é importante alargar a abrangência do Estado Social, alargar a abrangência dos nossos mecanismos de proteção social”, defendeu.
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Na comparação entre a atual crise e a crise económica que assolou o país entre 2010 e 2013, durante o período de vigência dos acordos com a ‘troika’, Caros Farinha Rodrigues destacou que “há uma diferença muito significativa”.
“Há diferenças nas causas, há diferenças nos setores afetados, mas há uma diferença que eu acho muito importante, que foi o papel das políticas públicas”, apontou.
“Na crise de 2010 a 2013 podemos dizer que grande parte das medidas de combate à pobreza praticamente não só não foram ativadas como inclusivamente diminuiu-se a eficácia de algumas dessas medidas. É isso que explica, por exemplo, que durante aquele período de crise enorme, com um aumento imenso da pobreza, os beneficiários do RSI [Rendimento Social de Inserção], por exemplo, tenham diminuído”, apontou.
De acordo com o investigador, “desta vez aconteceu o contrário”, e as políticas públicas tentaram reduzir os efeitos da pandemia e da crise económica que lhe está subjacente.
No entanto, Carlos Farinha Rodrigues não consegue ainda dizer se as medidas agora aplicadas tiveram como consequência “um atenuar efetivo” da crise ou se foi apenas “um adiar para a frente de alguns dos seus efeitos”.
Da sua análise, trata-se de algo que irá “depender muito das políticas que continuarem a ser seguidas ou não e da evolução da pandemia”.
Referiu que houve respostas inclusivamente para problemas novos que esta pandemia trouxe, como o caso das famílias dependentes da economia informal e fora do alcance da proteção social e para as quais as políticas públicas tiveram de se adaptar.
Para Farinha Rodrigues, “é expectável que haja algum retrocesso” nos indicadores de pobreza, mas refere que sem as medidas que o Governo foi implementando “possivelmente a situação seria muito pior”, dando como exemplo “a importância que teve o ‘lay-off’ para milhares e milhares de pessoas em Portugal”.
“As medidas que foram tomadas permitem atenuar a crise, eventualmente não impedem que nós vamos registar um agravamento dos principais indicadores de pobreza, eu isso estou convencido que acontecerá, basta olharmos para o que acontece à nossa volta e vemos que há muitas famílias agora em situações com níveis de precariedade grandes”, sublinhou.
Farinha Rodrigues diz mesmo que há outro aspeto que lhe motiva preocupação: “Eu não tenho a certeza se do ponto de vista social já atingimos o pior”.
“Muitas dessas medidas foram medidas de emergência que tentaram atenuar o agravamento da crise, mas deixaram várias espadas sobre a cabeça das pessoas, basta pensarmos nas moratórias”, apontou.
Explicou, por isso, que não é ainda possível antecipar “com algum realismo” qual será o futuro, sublinhando que isso está dependente de fatores como a evolução da pandemia ou a recuperação pós pandemia, dois “fatores de incerteza muito grandes”.
No entanto, defendeu como essencial que seja feito um combate à pobreza com um mecanismo integrado que acabe com “as medidas avulsas, fragmentadas, segmentadas” e que traga “um conjunto de estabilizadores automáticos que reajam às várias crises que possam surgir”.
“Temos que garantir que o nosso estado social, as nossas políticas públicas, no desenho e na implementação dessas medidas, têm a flexibilidade suficiente para se adaptar e garantir uma resposta pronta e eficiente a qualquer tipo de crise que surja”, rematou, defendendo que seja uma resposta sistémica aos problemas sem estar dependente de nenhum governo em concreto.
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