//Finanças impedem CMVM de mexer em reservas de 26 milhões

Finanças impedem CMVM de mexer em reservas de 26 milhões

O dinheiro pertence ao polícia da bolsa, mas o governo nega-lhe o acesso a ele. O impasse já vem desde o tempo em que Mário Centeno liderava a pasta das Finanças. O bloqueio prossegue, agora com João Leão como ministro. No centro do desentendimento estão 26,2 milhões de euros de uma espécie de fundo de reserva da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM). Acrescidos de um valor de 5,1 milhões que o supervisor tem em caixa, são 31,3 milhões de euros que a CMVM tem disponíveis para investir. Mas, com o bloqueio do governo, a instituição liderada por Gabriela Figueiredo Dias viu-se obrigada a adiar projetos que estavam previstos para 2020.

Dois dos projetos adiados são vistos como cruciais para apoiar o mercado de capitais nacional e já tinham obtido aprovação para serem cofinanciados a nível europeu. Com o adiamento, a sua concretização pode ficar comprometida. Trata-se do Balcão Único Eletrónico e da nova página da CMVM na Internet, já que a atual agrega muita informação e precisa ser ajustada aos últimos desenvolvimentos regulatórios de deveres das empresas emitentes. “O facto de não podermos aceder a essas reservas cria uma verdadeira paralisação, porque não nos permite investir em alguns investimentos estruturais decisivos”, lamentou ontem a presidente da CMVM na cerimónia online de abertura da Semana do Investidor, que decorre esta semana.

O fundo de reserva da CMVM – registado nas contas como ‘Outros ativos financeiros’ – resulta da acumulação de verbas que ‘sobraram’ dos exercícios anuais do regulador. Poderia servir, por exemplo, para investir na modernização das infraestruturas dos procedimentos ou, numa altura de crise, como a atual, em projetos de desenvolvimento do mercado de capitais português.

A CMVM entende ser autónoma na gestão dos seus recursos mas o Ministério das Finanças tem defendido o oposto e bloqueia o acesso àquele montante. Já nos anos anteriores a CMVM teve de negociar com as Finanças o obstáculo colocado através da chamada ‘cativação’ de verbas, mas sempre conseguiu chegar a um entendimento.

A CMVM anunciou, em janeiro deste ano, que uma das suas prioridades para 2020 seria “o lançamento das bases para um novo site da CMVM e a implementação do balcão único eletrónico para as entidades supervisionadas”. Planeava implementar sistemas e processos “para receção de faturação eletrónica de fornecedores, uma medida que se enquadra no esforço de desburocratização e de sustentabilidade da CMVM”, sendo um “contributo ativo e influente para o relançamento da União do Mercado de Capitais e para a transição para a nova arquitetura da supervisão europeia”.

Segundo um relatório da OCDE – Organização Para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, divulgado na semana passada, a bolsa portuguesa perdeu dois terços das empresas cotadas, entre 1997 e o final do ano passado. A OCDE enunciou um conjunto de recomendações para desenvolver e ‘salvar’ o mercado de capitais português.

Da parte das Finanças, até à hora de fecho desta edição não chegou uma explicação para o bloqueio imposto à CMVM.

Mega supervisor

A CMVM, além de ser o supervisor da bolsa portuguesa, também tem a responsabilidade de supervisionar os auditores. Ainda na semana passada anunciou que irá enviar para o Ministério Público os indícios que detetou nas inspeções que fez a nove auditores que foram responsáveis por fiscalizar e certificar as contas de entidades ligadas a Isabel dos Santos, principal nome no escândalo Luanda Leaks.

Ontem, no arranque da Semana do Investidor, a presidente da CMVM anunciou que passou a ter uma Área do Investidor reformulada no seu site na internet, “oferecendo informação mais direta e clara, e focando no que é mais útil aos investidores. Também passou a estar disponível “um novo espaço dentro dessa Área do Investidor dedicado aos alertas aos investidores emitidos pela CMVM e por congéneres, e que, simultaneamente, facilita o acesso a informação relativa às entidades autorizadas ou registadas junto da CMVM, e a informação sobre riscos de fraude e os cuidados a ter face a esses riscos”.

O objetivo é ajudar os investidores a estarem prevenidos e mais atentos a possíveis tentativas de fraude num mundo que se tornou ainda mais digital devido às medidas adotadas na sequência da epidemia.

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