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A Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) fez um primeiro balanço das moratórias fiscais que o governo concedeu para aliviar o esforço dos contribuintes. Segundo dados oficiais, cerca de 6% do valor em “diferimento”, que podia ser pago mais tarde, acabou por não ser cobrado. É “incumprimento”. O mesmo que dizer que o Fisco conseguiu recuperar 94% dos valores em moratórias, segundo a execução orçamental das Finanças analisada pela UTAO.
De acordo com os peritos que apoiam o parlamento, em resposta às dificuldades que a crise impôs aos orçamentos de famílias e empresas, terão sido “diferidos” no tempo mais de mil milhões de euros em pagamentos de impostos em 2020 e, sobretudo, 2021. Os referidos 6% de incumprimento dão cerca de 60 milhões perdidos.
“O incumprimento associado ao diferimento de receita constitui uma perda definitiva e situou-se em 60 milhões de euros: um milhão de euros de IRS, 14 milhões de euros de IRC e 45 milhões de euros de IVA”, contabiliza a UTAO. Estes valores traduzem numa taxa global de incumprimento de 6%. Por imposto, dá “7,4% no IRS, 5% no IRC e 6,3% no IVA, que foi o imposto com maior volume de diferimento”.
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Folga de quase 2,9 mil milhões de euros no défice
O relatório da UTAO mostra ainda que o governo do primeiro-ministro, António Costa, e do ministro das Finanças, João Leão, terminou o ano de 2021 com uma folga orçamental muito substancial face ao défice que estava previsto no último Orçamento do Estado que o PS conseguiu aprovar antes da crise política.
Nesse OE2021, votado e aprovado em novembro de 2020, afinal, a diferença final entre receitas e despesas ficou em -8.794 milhões de euros, uma folga de quase 2,9 mil milhões de euros.
A mesma UTAO revelou ainda que apenas 6% da receita fiscal em moratória foi perdida, isto é, entrou em incumprimento. Ou seja, dos mil milhões de euros que foram sujeitos a diferimentos nos pagamentos e outras facilidades, os contribuintes só não conseguiram pagar 60 milhões de euros.
Segundo a equipa coordenada por Rui Nuno Baleiras, a maior ajuda veio da rubrica dos impostos diretos, que ficou cerca de 1,4 mil milhões de euros acima do inicialmente projetado. O segundo maior impulso veio das contribuições sociais (mais 1,3 mil milhões).
O governo sempre atribuiu estes desvios ao comportamento mais dinâmico da economia e do emprego, nunca a uma maior força nas cobranças, por exemplo.
De acordo com a unidade de apoio parlamentar, “o saldo global da execução provisória das Administrações Públicas (AP) superou o objetivo subjacente aos referenciais anuais. O resultado situou-se 2.869 milhões de euros acima do previsto no OE2021 e excedeu a estimativa para 2021 [na proposta de OE2022, em outubro último] em 1.376 milhões de euros”.
Este desvio positivo, que se reverte numa folga e pode ser decisivo para que o défice em contas nacionais possa ficar abaixo de 4% do produto interno bruto (PIB) ou mesmo abaixo de 3% do PIB, como já aventou o governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, “resulta da evolução favorável da receita fiscal e contributiva (3.450 milhões de euros) e da contenção na despesa (3.540 milhões de euros)”, escreve a UTAO na sua análise à execução em contabilidade pública.
Neste agregado da despesa, “apenas as transferências correntes excederam o previsto (-1.463 milhões de euros), quedando-se as restantes rubricas da despesa abaixo do limite aprovado no OE2021”. “Em sentido oposto, a cobrança de receita não fiscal e não contributiva situou-se 3.040 milhões de euros abaixo do objetivo”.
Quando comparado com a estimativa para 2021, revelada em outubro passado, “o desvio do saldo global reduz-se para 1.376 milhões”.
“Em sentido favorável, destaca-se a evolução das outras receitas correntes (983 milhões de euros), da receita fiscal (931 milhões de euros) e das contribuições sociais (240 milhões de euros), permanecendo a receita de capital abaixo do objetivo (-925 milhões de euros). O valor global da despesa situou-se 32 milhões de euros abaixo do estimado, destacando-se a subexecução do investimento (547 milhões de euros).”
Já o impacto direto no saldo global das medidas de combate aos efeitos da pandemia, as medidas de política discricionária covid-19, este “ascendeu a 5279 milhões de euros, resultando do efeito cumulativo da perda de receita (124 milhões de euros) e aumento da despesa (5155 milhões de euros)”, dizem os peritos.
“O crescimento da receita efetiva reduzir-se-ia para 7,2% (+6.164 milhões de euros), refletindo o efeito de base, uma vez que o valor das medidas com efeito sobre este agregado no período homólogo (1.559 milhões de euros) foi superior ao atual (124 milhões de euros).”
Expurgando o efeito das medidas concretas contra a pandemia, “o crescimento da despesa teria desacelerado para 3,9% (3.525 milhões de euros)”.
O saldo global em 2021 seria um défice de 3.098 milhões de euros, “traduzindo uma melhoria homóloga de 2.639 milhões de euros, quando expurgados os efeitos diretos das medidas covid-19 no biénio 2020-2021”.
Mesmo assim, a UTAO explica que “sem os efeitos diretos das medidas covid-19”, o saldo orçamental final “continua afetado pela pandemia, através de três canais de transmissão: efeito da pandemia na economia e sua repercussão nas contas públicas, ação dos estabilizadores automáticos e efeito induzido pelas medidas de política covid-19”.
Isto é, as contas seriam sempre afetadas pelos efeitos recessivos dos confinamentos e das limitações às atividades e negócios e pelo aumento do valor dos apoios sociais, mesmo os tradicionais, como subsídios de desemprego, de doença, etc., que tendem a aumentar automaticamente sempre que há uma crise.
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