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O governo está a preparar uma nova revisão do Código do Trabalho, confirmou ontem no parlamento a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, apontando para medidas de conciliação trabalho-família em discussão com os parceiros sociais, mas também para alterações que decorram do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho.
Contactado, o ministério de Ana Mendes Godinho não esclareceu quando ocorrerá o processo legislativo ou que alterações estão previstas, mas as intenções dadas a conhecer colocam o calendário da revisão do Código do Trabalho a acontecer, pelo menos, antes de 2 de agosto do próximo ano, data-limite para a transposição da diretiva europeia relativa à conciliação entre a vida familiar e a vida profissional de pais e cuidadores.
Em audição na Comissão parlamentar de Trabalho e Segurança Social, a ministra referiu especificamente medidas laborais para cuidadores informais. “As medidas laborais foram apresentadas aos parceiros sociais e o nosso objetivo é incluí-las na revisão do Código do Trabalho que estamos a preparar”. O secretário de Estado do Trabalho e da Formação Profissional, Miguel Cabrita, deu também conta de que o processo de fechar uma proposta estará perto de concluído. “Estamos, após recebermos os contributos dos parceiros sociais, a ultimar a nossa proposta sobre a matéria para transmitir aos parceiros sociais”.
Ana Mendes Godinho referiu ainda o Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, que estará em discussão pública a partir de 31 de maio, e que “identifica algumas linhas estratégicas de reflexão que implicam algumas delas investimento estrutural, financeiro, outras implicam também alterações legislativas”.
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Será o caso, nomeadamente, do alargamento de indícios para reconhecer vínculos de trabalho com plataformas digitais, sugerido pelo Livro Verde. Ana Mendes Godinho referiu ainda a necessidade de “reforçar os mecanismos e os instrumentos de combate à precariedade” no trabalho que está a ser desenvolvido com os parceiros sociais.
Já sobre as medidas de conciliação ente vida profissional, familiar e pessoal, o governo refere “um conjunto de propostas que implicam algumas medidas de incentivo entre homens e mulheres no gozo das licenças parentais, a par de outras medidas”.
A discussão sobre medidas de conciliação, no âmbito da Concertação Social, foi iniciada em 2019, mas interrompida com a pandemia e retomada já em 2021. Em fevereiro do ano passado o governo apresentou um conjunto de propostas da qual constava a ideia de uma nova modalidade de licença parental que permita o acesso pago a horário parcial por 12 meses a quem tem filhos até seis anos de idade, conforme noticiou então o Dinheiro Vivo.
O governo pretendia também aumentar a partilha do tempo de licença parental inicial entre pais e mães, com o objetivo de que os pais usufruam de pelo menos 40% do tempo que vai atualmente até aos 150 dias sem redução salarial. Outra proposta pretendia garantir que a lei não discrimina pais adotantes em nenhuma das condições de apoio à parentalidade existentes. Aqui o objetivo é que “a licença do pai não dependa da mãe ser ou não elegível, entre outras medidas mais específicas que foram identificadas também com o contributo dos parceiros sociais”, segundo adiantava então a ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva.
Confederações sindicais querem discutir redução de horários
A discussão dos temas, entretanto, terá sido concluída em março, indica Carlos Alves da UGT, um dos intervenientes nas reuniões do grupo de trabalho da Comissão Permanente de Concertação Social responsável pela discussão destes temas. Os parceiros entregaram os seus contributos, diz, e aguardam há dois meses por uma proposta: “Só surpreende porque deveríamos estar a avançar mais depressa”.
O responsável da UGT não discute tópicos específicos que o governo tenha colocado na mesa, mas defende que “mais importante que a alteração da legislação é, sobretudo, a alteração de algumas políticas” e haver reações “mais concretas” aos contributos dos parceiros.
Se a necessidade de transpor elementos da diretiva europeia sobre conciliação será um dos motivos para alterações no capítulo do Código do Trabalho dedicado aos direitos de parentalidade, Carlos Alves entende que “uma transposição mais adequada da diretiva” implica “chamá-la para um conjunto mais alargado de políticas e de medidas do que fazê-lo de forma avulsa”.
O dirigente da UGT diz que o governo estará a ignorar “o elefante na sala” ao não propor uma reflexão sobre a redução das jornadas de trabalho, também potenciada com a evolução tecnológica que o Livro Verde discute.
“Uma questão essencial será sempre a questão do tempo de trabalho e parece que estamos a passar ao lado de uma discussão que é importante. Não discutir o potencial de redução do tempo de trabalho no quadro de uma revolução tecnológica é ignorar um dos impactos porventura mais notórios que temos de discutir no futuro próximo”, defende.
Da parte da CGTP, também, a semana de trabalho de 35 horas é considerada essencial para a discussão das medidas de conciliação. Fátima Messias, também envolvida no grupo de trabalho sobre a matéria, refere contudo que prevalecem na Concertação Social “conceções bastante opostas sobre o que são medidas de conciliação em termos de organização do tempo de trabalho”.
Desde logo, a CGTP insiste na revogação das normas de adaptabilidade e banco de horas que se mantêm no Código do Trabalho. “São medidas de desregulamentação dos tempos de trabalho e dos tempos de descanso e são impedimento à verdadeira conciliação porque não vem ao encontro dos trabalhadores e das responsabilidades familiares”.
A responsável da CGTP desconhece também as medidas que o governo pretende propor, mas não antecipa uma discussão fácil. “As perspetivas que vinham dessas reuniões que começaram em 2019 são de que as medidas não recolhiam muito consenso na generalidade. Vamos ver se o documento do governo incide nalgum aspeto parcial pondo de parte as questões em que há opiniões diferentes”.
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