Partilhareste artigo
A incerteza económica por causa da alta inflação e a crise energética causada pela guerra na Ucrânia podem levar os supervisores a pedir a alguns bancos para aumentar capital ou a limitar a distribuição de dividendos de forma a terem capacidade de resposta no caso de uma possível recessão. Uma situação que o Banco de Portugal acompanha de perto, estando pronto para intervir caso seja necessário.
Relacionados
Os alertas para o reforço da capitalização dos bancos foram recentemente realçados pelo Banco Central Europeu (BCE), após as ameaças de Moscovo em fechar a torneira do gás à Europa. E apesar de a exposição direta à Rússia do sistema financeiro nacional ser pequena, os impactos indiretos podem não ser residuais. É neste cenário que os supervisores estão a olhar de perto para as almofadas financeiras dos bancos para garantir que conseguem fazer face a um eventual agravamento da inflação e abrandamento da economia. E Portugal não é excepção.
“Os níveis de capital exigidos aos bancos baseiam-se não só nos riscos existentes no momento presente, mas também considerando as projeções para a evolução da atividade e dos fundos próprios”, começou por referir ao DN/Dinheiro Vivo fonte oficial do Banco de Portugal. A instituição liderada por Mário Centeno não especificou se havia algum banco português incluído na recomendação feita por Andrea Enria, presidente do presidente do conselho de supervisão do BCE. Mas explicou que “estas projeções são realizadas pelas próprias instituições em função dos cenários macroeconómicos mais recentes, sendo desafiadas pelas autoridades de supervisão para confirmar que são suficientemente prudentes”. Deste modo, “as instituições de crédito têm de considerar os potenciais impactos, diretos e indiretos, resultantes da invasão da Ucrânia pela Rússia para assegurar que retêm, em permanência, níveis de capital suficientes para fazer face a uma possível deterioração da qualidade dos seus ativos e preservar o financiamento à economia, sem pôr em causa o cumprimento dos requisitos de fundos próprios aplicáveis”, advertiu o supervisor.
Face aos recentes alertas do BCE, o regulador nacional garante que “na medida do necessário, as autoridades de supervisão tomam as medidas de supervisão apropriadas nessa matéria relativamente a cada instituição em particular, que podem envolver, entre outras medidas, o desafio dos planos de distribuição de dividendos ou a determinação de aumentos de capital”. Medidas postas em prática num passado recente por causa do impacto da pandemia. E que podem voltar a estar em cima da mesa caso se concretizem ameaças à situação financeira dos bancos. Isto porque apesar de o aumento das taxas de juro ser favorável para a rentabilidade dos bancos, pode não ser suficiente para contrabalançar o impacto de uma crise económica na Europa.
Subscrever newsletter
No caso dos maiores bancos, estas medidas, a avançarem, são tomadas pelo BCE que é diretamente responsável pela supervisão das instituições consideradas significativas, que representam cerca de 80% do sistema bancário nacional. É a esta autoridade que compete a emissão de medidas ou a definição de expectativas prudenciais dirigidas a tais instituições, lembrou o Banco de Portugal aproveitando para reforçar que “acompanha continuamente os impactos da conjuntura atual nas instituições que supervisiona”.
Exposição “negligenciável”
Embora a economia portuguesa esteja pouco exposta diretamente à Ucrânia e à Rússia, os efeitos indiretos, sobretudo através do aumento de preços, podem ser significativos. De igual forma, a exposição direta do sistema financeiro português à Rússia e à Ucrânia é “negligenciável”, sendo pequena a exposição das instituições de crédito a empresas com relações comerciais com estes dois países, como sublinhou o Banco de Portugal no Relatório de Estabilidade Financeira apresentado recentemente. Porém, o supervisor adverte que “os efeitos de segunda ordem podem ser relevantes, não apenas devido ao aumento da inflação, incluindo pela via de perda de rendimento real, mas também por eventual redução da procura externa de países mais diretamente afetados e por maiores constrangimentos nas cadeias de valor globais”. A soma destes fatores, conjugados com a normalização da política monetária na área do euro, é precisamente um dos riscos apontados pelo regulador no mesmo relatório, uma vez que poderá resultar em “potenciais repercussões sobre o setor financeiro, através do agravamento do risco de crédito”.
Analisando por bancos, tendo em conta os números disponíveis, o Novo Banco é o que tem a maior exposição. Aliás, nas contas do ano passado, a entidade liderada por António Ramalho admitia vir a ser impactada “por perdas nos ativos expostos àqueles países” decorrente das sanções, “bem como da destruição que se verifica na Ucrânia com a guerra”. Até 31 de dezembro, a exposição do banco, através de crédito a clientes e títulos de dívida, à Federação Russa, Bielorússia e Ucrânia totalizava 49,3 milhões de euros.
Já a CGD, no final do primeiro trimestre contabilizava 4 milhões de euros de com clientes relacionados com a Rússia e 1 milhão com a Ucrânia. O BCP, Santander e BPI não detalharam os valores nos relatórios e contas. Fora do setor bancário, mas relacionado com ele, o Grupo Montepio, a associação mutualista que é dona do banco com o mesmo nome, anunciou uma perda de cerca de 15,6 milhões de euros com a exposição a duas empresas russas, segundo o ECO. Esse prejuízo foi assumido devido a negócios com uma empresa de gás e outra de metalomecânica.
Deixe um comentário