É a terra da cereja mas é também o município português onde os frutos do trabalho rendem menos. No concelho de Resende, distrito de Viseu, os habitantes levam para casa um valor mediano de 456 euros por mês, ou 5481 euros por ano, o mais baixo do país. Resende é também o único dos 308 municípios portugueses onde a fatia mais pobre da população recebe menos de três mil euros por ano. Num concelho com pouco mais de onze mil habitantes, há cerca de duas mil pessoas que declaram cerca de 230 euros por mês.
Os números constam numa análise publicada ontem pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) às declarações de IRS dos portugueses em 2017. O INE concluiu ainda que é no Norte que estão não só os rendimentos mais baixos do país como também as maiores desigualdades entre ricos e pobres.
A região concentra os seis únicos municípios onde o valor mediano dos rendimentos anuais fica aquém dos seis mil euros. Além de Resende, o fundo da tabela da riqueza nacional é ocupado por Cinfães, Valpaços, Santa Marta de Penaguião, São João da Pesqueira e Tabuaço. Em todos, o valor mediano dos rendimentos declarados é inferior a 500 euros por mês.
No caso de Resende, e dos concelhos vizinhos do Douro, o resultado é a soma de uma economia baseada na agricultura com uma população envelhecida. “Em Resende há imensos produtores de cereja, que é a atividade que mais contribuiu para a economia, e cada produtor tem o seu sistema de comercialização. Um ano agrícola mau, como foi 2017, vai refletir-se nas estatísticas”, explica Manuel Garcez Trindade, presidente da Câmara de Resende, em declarações ao Dinheiro Vivo.
“São concelhos com muitos reformados, com reformas da segurança social e da agricultura que não chegam a cinco mil euros por ano. Os jovens estão todos no estrangeiro”, lamenta o autarca, para quem o “problema diabólico das acessibilidades que não existe em Oeiras ou Almada” ajuda a explicar as “circunstâncias” que põem Resende na cauda da tabela do INE.
A visão é partilhada pelo presidente da Câmara de Cinfães, onde o rendimento mediano mensal roça os 470 euros. Segundo Armando Mourisco, os números são sobretudo o reflexo das muitas reformas provenientes do setor agrícola que, de tão baixas que são, estão isentas de IRS. Mas há outras contas que ajudam a explicar o ranking.
“O concelho tem muita mão-de-obra da construção civil, que faz muito trabalho sazonal no estrangeiro, que é declarado no país de origem dos rendimentos. Ou seja, os rendimentos entram no concelho mas não são declarados cá. Temos bastante população nessa situação. E há também muita gente com trabalhos sazonais na agricultura e pecuária que não atinge o limite de IRS para apresentar declaração”, explica o autarca.
Ainda assim, salienta Armando Mourisco, a qualidade de vida no concelho tem vindo a aumentar. Em cinco anos, o número de desempregados desceu quase oito pontos percentuais, estando hoje nos 4%, graças à abertura de várias fábricas e empresas. “Temos o quinto salário médio mensal mais alto da região do Tâmega e Sousa, daí que os dados do INE me parecessem incompreensíveis à primeira vista”, admite.
A análise do INE permite ver ainda quais são os municípios do país onde a desigualdade de rendimentos é mais acentuada. Vila do Porto, nos Açores, é o concelho onde se regista a maior diferença entre os rendimentos mais baixos e os mais elevados. Mas é no Norte que a concentração das desigualdades atinge as maiores proporções, com 18 municípios acima dos valores nacionais de referência.
No Porto, que é um dos municípios mais desiguais do país, a diferença de rendimentos entre os 20% mais ricos face aos 20% mais pobres ultrapassa os 15 mil euros anuais. Na direção oposta surge o Alandroal. O concelho do distrito de Évora ocupa o primeiro lugar na tabela da igualdade de rendimentos.
Os rendimentos medianos mais elevados do país estão em Oeiras, onde o valor mediano dos ganhos está próximo dos 13 mil euros. A nível nacional, o IRS dos portugueses em 2017 contabilizou ganhos medianos de 8687 euros. Há 64 municípios com rendimentos acima da média. São os casos de Lisboa, Cascais, Entroncamento, Alcochete ou Coimbra.
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