O Novo Banco (NB) pode muito bem custar mais do que 3890 milhões de euros em empréstimos com dinheiro dos contribuintes no âmbito do atual contrato de resolução, avisa o Conselho das Finanças Públicas (CFP) que, pela primeira vez, admite que o banco poderá precisar de “fundos adicionais de montante desconhecido”. Além disso, o Novo Banco e o Fundo de Resolução entraram em “conflito judicial” e também aqui pode haver perdas para o setor público, avisa a instituição presidida por Nazaré Costa Cabral.
No estudo “Perspetivas Económicas e Orçamentais 2020-2022”, ontem divulgado, o CFP diz que “o Estado Português se encontra sujeito às obrigações previstas no Acordo de Capitalização Contingente do Novo Banco até um máximo de 3890 milhões de euros”, sendo que “o impacto no ano de 2020 ascende a 1035 milhões de euros (um valor superior aos 600 milhões de euros previstos na proposta de OE2020 – Orçamento do Estado para 2020), tendo esse pagamento ocorrido no passado dia 6 de maio”.
Ou seja, o valor do capital já injetado este ano com recurso a fundos públicos e em plena crise ascende aos tais 1035 milhões, o que representa uma derrapagem de mais de 70% face ao que foi aprovado no Parlamento, no OE2020, mas também ultrapassa o máximo anual previsto de empréstimos do Estado ao Fundo de Resolução (que depois passa a verba ao banco), que é de 850 milhões de euros.
Como referido, o Conselho das Finanças diz que “o Estado Português poderá ter de disponibilizar fundos adicionais de montante desconhecido por forma a que o Novo Banco cumpra os requisitos regulatórios (capital backstop)”.
E a cereja em cima do bolo é que “decorre um conflito judicial que opõe o Novo Banco e o Fundo de Resolução que poderá vir a ter um impacto negativo para o Fundo de Resolução”.
Mais um banco que nunca mais acaba
Na primeira ronda de resolução, quando o BES colapsou, em 2014, o Estado, por iniciativa do governo de Passos Coelho e com o apoio de Carlos Costa, do Banco de Portugal, teve de emprestar 3,9 mil milhões de euros ao Novo Banco (via Fundo de Resolução) para que este não implodisse.
Mas como o NB (que era a parte menos má do BES) continuou cheio de problemas, malparado, ativos não produtivos, o Estado (o governo de António Costa, em 2017) decidiu avançar para uma segunda resolução, desta feita, vendendo 75% do banco menos mau ao fundo Lone Star.
O Lone Star injetou mil milhões de euros e ficou com 75% do Novo Banco. Mas a partir daí têm sido os contribuintes (via Fundo de Resolução) a sustentarem o NB com sucessivas injeções de capital.
O máximo previsto no contrato são 3,89 mil milhões de euros, o que significa que, tendo em conta as derrapagens dos últimos anos em termos de necessidades de capital, esta linha vermelha pode estar quase esgotada, segundo assinala o CFP. Pelo menos, teoricamente.
Em 2018, o Novo Banco pediu e recebeu 792 milhões de euros num novo empréstimo concedido pelas Finanças. Em 2019, mais uma injeção, no valor de 1149 milhões de euros. Este ano recebeu mais 1035 milhões e para o ano o CFP assume mais 400 milhões de euros “previstos pelo Ministério das Finanças no Programa de Estabilidade do ano passado”.
País e contas públicas de rastos
Se fosse só o Novo Banco já era mau, mas não é só isto que absorve fundos em larga escala ao erário público. Por causa de outra doença, a pandemia de covid-19, o país entrou numa crise violenta e de proporções históricas.
No pior dos cenários, e mesmo assim sujeito a riscos negativos, o CFP diz que a recessão deste ano pode chegar a uma contração da economia portuguesa de quase 12%, o desemprego atingirá mais de 13,1% da população ativa, a dívida chega a um máximo histórico de 141,8% do produto interno bruto (PIB) e o défice público deve chegar a 9% do PIB ou mais.
Num cenário menos severo, o de base, o Conselho antecipa “uma contração do Produto Interno Bruto de 7,5%”. É, para já, a segunda projeção mais pessimista. A pior é a do FMI, que em abril previu uma contração de 8% para Portugal. A Comissão Europeia disse menos 6,8% nas previsões de maio. O governo recusou-se a divulgar previsões por serem pouco credíveis. Só no orçamento retificativo é que revelará o cenário macro para este ano.
Medidas custam mais do que é assumido no Programa de Estabilidade
No Programa de Estabilidade (PE) simplificado divulgado em maio, as Finanças de Mário Centeno calcularam que o impacto orçamental das “medidas discricionárias” para combater esta nova crise rondaria os 1911 milhões de euros anuais (0,9% do PIB). Este exercício misturava estimativas mensais e anuais.
Para o CFP, o golpe anual tem de ser muito superior. O impacto orçamental das medidas específicas do lado da receita e da despesa para apoiar empresas, saúde pública, famílias pode chegar a um total de 3012 milhões de euros este ano (1,5% do PIB) num cenário base, o menos destrutivo. Quase 60% acima da estimativa publicada por Centeno.
Mas o golpe orçamental em 2020 pode ascender a 4564 milhões de euros (2,4% do PIB), num cenário severo, segundo o CFP. Custará 140% mais do que dizem as Finanças no PE.
(Atualizado às 20h55 de 4 de junho com uma nota do FR (abre em PDF). Por lapso, na primeira versão desta notícia, o Dinheiro Vivo escreveu que o limite dos 850 milhões de euros era referente aos empréstimos do Fundo de Resolução ao Novo Banco, mas não: este limite máximo é relativo à verba que o Estado pode injetar, anualmente, no Fundo de Resolução. Aos visados, as nossas desculpas)
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