//“Investimento alemão em Portugal mantém-se forte e está a aumentar”

“Investimento alemão em Portugal mantém-se forte e está a aumentar”

Dependemos mais deles que eles de nós, mas o interesse alemão em
Portugal parece estar com uma robustez germânica.

Os
números compilados pela Agência de Investimento e Comércio Externo de Portugal
mostram que, em 2009, o número de empresas que exportavam para a Alemanha não
chegava às duas mil. Em 2016, esse número já ultrapassava as 4000 empresas.

Mais
de metade das exportações são de veículos e material de transporte, máquinas e
aparelhos, reflectindo o peso da Autoeuropa, maior investimento estrangeiro em
Portugal. A Alemanha é o terceiro maior cliente comercial de Portugal, atrás de
Espanha e França, e o segundo maior fornecedor, apenas atrás do país vizinho.

A
propósito da Festa da Língua Alemã e dos 180 anos da Escola Alemã de Lisboa, o
director-executivo da Câmara de Comércio Luso-Alemã, Hans-Joachim Bohmer,
analisa o investimento germânico que garante cerca de 35 mil empregos directos
em Portugal.

Portugal experimentou recentemente um programa de assistência
financeira e apresenta neste momento indicadores económicos muito diferentes. O
investimento alemão em Portugal também acompanhou esta transição ?

O
investimento alemão está em Portugal há muitas décadas. Durante os tempos mais
difíceis, o investimento alemão não só ficou como foi aumentando. Depois do fim
do programa de apoio, manteve o crescimento. O Investimento alemão é muito
estável porque, em grande parte, trata-se de investimento industrial para
produção que sai do país e vai para a Alemanha e para outros países. Não
depende tanto da conjuntura portuguesa mas sim da conjuntura alemã e de outros
países onde são vendidos os produtos. O investimento alemão é forte e mantém-se
forte. Mas deve dizer que também está a mudar. Geralmente conhecemos
investimento alemão em Portugal como fábricas que produzem carros e outros
produtos. Ultimamente também vemos muitas empresas que estão a investir em
serviços, na produção de software e desenvolvimento de serviços de engenharia.
Algo que não é tão visível como um carro, mas também valioso no nosso tempo e igualmente
exportável para a Alemanha e outros países.

Há novos investimentos alemães,talvez menos mediáticos ?

Exactamente.
Há novas empresas que vieram para Portugal desenvolver esta área de serviços de
engenharia e informática. Em parte são serviços que não são tão visíveis e por
outra parte não se expressam tanto na balança de investimento porque para
construir uma fabrica como a AutoEuropa é preciso investir muito nessa fábrica.
Para estabelecer cá uma empresa de serviços de engenharia ou de informática,
não precisam tanto de investimento físico, mas sim de pessoas bem preparadas.
Está a ser criado emprego muito sofisticado. A maioria desses trabalhadores é
relativamente jovem, portuguesa, em que alguns deles voltaram a Portugal depois
de terem saído do país. Mas também há outros que vêm para Portugal para
trabalhar porque o emprego é bom e a vida é muito agradável.

Porque a escolha de Portugal em termos competitivos ? Poderiam
ir para o leste da Europa, por exemplo.

Em
primeiro lugar, Portugal tem bons especialistas de que as empresas estão à
procura. Segundo, não é só Portugal, também são os outros países. Neste momento
há tanta procura neste sector que Portugal é uma aposta mas elas também apostam
noutros países. Portugal é um bom exemplo mas não é o único.

Quando aconteceu essa viragem na tendência de mudança do
investimento alemão em Portugal ?

Os
primeiros passos aconteceram há mais de uma década, com o desenvolvimento de
software para o sector das telecomunicações. São passos independentes da
situação económica e política do país. Tem muito a ver com a disponibilidade de
pessoas qualificadas no país e com um aumento drástico da procura nesses
serviços e de pessoas bem preparadas sobretudo na área de IT e de engenharias.

Falar alemão é essencial para este tipo de investimentos em
Portugal ?

Admito
que especialmente para o tema informático não seja essencial. Neste sector
fala-se inglês em todo o mundo, seja qual for o país. O alemão ajuda nas
conversas menos profissionais.

Mas a Alemanha ainda precisa destes trabalhadores
especializados.

Temos
um crescimento económico muito grande,mas falta um grande número de
especialistas e também na área iT e na engenharia. Como disse, nos últimos anos
muitos jovens foram para Alemanha mas muito menos que para outros países que
tiveram menos obstáculos linguísticos. Foram mais pessoas para países onde
falam inglês. Na Alemanha houve essa barreira, mesmo nas profissões de IT e
engenharia. Quando a pessoa quer viver na Alemanha também precisa de alemão.
Não para trabalhar mas para poder viver lá, para encontrar amigos e ter vida
privada. Em muitas PME alemãs também procuram estes especialistas e aí nem
sempre o inglês é amplamente utilizado.

Alguns dos portugueses que trabalham nos novos investimentos
alemães voltaram da Alemanha.

Pode
ser o caso mas não é a regra. Quem volta para Portugal quase nunca o faz na
mesma empresa.

Como avalia o contexto da atração do investimento estrangeiro em
Portugal ? Que barreiras subsistem ainda ? Debateu-se muito a rigidez e a
flexibilidade do mercado de trabalho, impostos, custos de energia.

As
barreiras dependem muito da empresa e do produto. Lamentavelmente, uma que
nunca vai acabar é a da distancia entre Alemanha e Portugal. Para empresas que
têm produtos volumosos ou pesados, com um custo de transporte relativamente
elevado com o valor do produto, sempre haverá esta barreira. Por isso essa nova
vaga de investimento de actividades em serviços é uma aposta muito boa porque
não tem custos de transporte. O transporte faz-se via internet ou meios
electrónicos. Isso pode ser de Lisboa para o Porto ou de Lisboa para Alemanha e
o custo é sempre zero. É uma das grandes vantagens desta área.

Se as empresas alemãs estão a atrair jovens formados em
Portugal, significa que algo está suficientemente bem na educação em Portugal.
Acha que há um bom equilíbrio na formação académica e na ligação entre educação
e empresas ?

A
formação é uma tema muito difícil. Tem que estar adequada às necessidades do
mundo do trabalho. Há muitos empregos que requerem formação académica. Outros
requerem apenas uma formação bem feita, com preparação para as necessidades do
posto de trabalho. Na Alemanha este mix entre formação académica e dual é feito
há muitos anos. Não é uma separação para sempre. Em Portugal, isso também é
relevante na área industrial. As empresas requerem muito pessoas com formação
dual. Mesmo nas áreas de IT, na Alemanha, existem também formações duais. Falta
um grande numero de pessoas dessas. Por isso além da formação académica que
existe em Portugal, e que é boa, seria interessante introduzir a formação dual
neste sector. Isso aumenta o número de pessoas que podem ser usadas.

O investimento da Bosch em Portugal está a ser falado muito mais
hoje nos media. É a nova estrela do investimento alemão em Portugal, até agora
mediaticamente centrada apenas na Volkswagen ?

Temos
quase 400 empresas alemãs em Portugal. Muitas delas têm a sua parte específica
que mostram que no seu sector são bons e merecem todo o interesse. Há poucas
empresas dessas que são conhecidas das pessoas em geral. Qualquer um conhece
uma Siemens, Bosch, Volkswagen ou Mercedes ou sobretudo produtos que também
podemos comprar cá. Mas há muitas outras empresas que não conhecemos porque têm
produtos muito especializados. A AutoEuropa, sendo o maior investimento
industrial do país, é um símbolo muito grande da ligação entre Portugal e a
Alemanha. As relações económicas entre os dois países são muito visíveis com a
fabrica de carros alemães. A Bosch está em Portugal há muito mais tempo que a
Volkswagen e tem muitos produtos produzidos em Portugal em varias fabricas. É
uma empresa tecnológica e já há muito tempo apostou não apenas numa produção em
Portugal mas também no alargamento da cadeia de valor em Portugal. Eles
produzem mas também fazem outros passos na cadeia de valor. No caso da Bosch em
Braga estão fortemente envolvidos no desenvolvimento dos produtos. Isso
acontece também na Bosch de Aveiro, onde todo o mundo Bosch é dirigido. O chefe
de Aveiro manda também nas fábricas da Alemanha ou da China. Este grupo de
produtos tem toda a sua concentração em decisões e gestão na fábrica de Aveiro.

A AutoEuropa foi historicamente importante na forma como uma
empresa pode ser gerida com participação de trabalhadores nos orgãos de gestão.
Era vista como um bom exemplo nas relações laborais e isso está agora ameaçado.
Está optimista em relação à paz social na Volkswagen ou ainda é cedo para
perceber o que vai acontecer ?

Não
estou dentro da Volkswagen e não tenho informação previligiada. Não sei o que
vai acontecer lá. Estou com esperança que corra de uma boa forma. Durante
muitos anos foi um exemplo muito bem visto e nos últimos meses há noticias que
são diferentes do passado. Muitas empresas alemãs – e não apenas alemãs – estão
a olhar para o que lá acontece. Todos têm a esperança que isto seja resolvido
de uma boa forma dado que é um investimento mportante no país.

Qualquer tipo de desfecho na Auto Europa é de alguma forma
relevante para os outros investimentos em Portugal? Contamina outros
investimentos alemães ou é um caso à parte ?


uma expressão em inglês, que não se refere à AutoEuropa, que diz “too big
to fail” (demasiado grande para falhar) que geralmente falamos para
bancos. No caso da Auto Europa eu diria “too big to be overseen”,
demasiado grande para não saber o que lá se passa. Atrai sempre a atenção. Se
isso acontecesse numa pequena ou media empresa isso poderia passar
despercebido. No caso da AutoEuropa, se isso acontecer a gente olha para lá.
Temos as nossas ideias sobre o que pode ou não acontecer. A atractividade da
AutoEuropa é muito grande, tal como a atenção sobre o que lá acontece.

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