//Líder do maior hedge fund do mundo avisa: “Capitalismo deixou de funcionar”

Líder do maior hedge fund do mundo avisa: “Capitalismo deixou de funcionar”

O capitalismo falhou e precisa de ser reformado. O aviso é de Ray Dalio, fundador da maior gestora de hedge funds (fundos especulativos) do mundo, a Bridgewater Associates. O investidor considera que o sonho americano se tornou numa espécie de pesadelo e que os excessos capitalistas na maior economia do mundo criaram um problema existencial e poderão levar a graves conflitos sociais.

“Não é preciso ser-se um génio para saber que quando um sistema está a dar resultados que são tão inconsistentes com os seus objetivos, este tem de ser reformado”, escreveu Ray Dalio num artigo publicado no seu LinkedIn. E é exatamente isso que aconteceu ao capitalismo, considera o gestor.

“Acredito que todas as coisas boas levadas a um extremo podem ser auto-destrutivas e que tudo deve evoluir ou morrer. E isto é agora verdade para o capitalismo”, diz Dalio. O investidor diz que nos últimos anos “vimos o capitalismo evoluir de uma forma que não funciona para a maioria dos americanos porque produz espirais em alta para os que têm e em baixa para os que não têm”.

Ray Dalio explica que isso “cria maiores desigualdades nos rendimentos/riqueza/oportunidades que colocam ameaças existenciais aos EUA porque estes fossos trazem conflitos internos e internacionais que causam danos e enfraquecem a condição da América”.

A alternativa para evitar uma revolução

O gestor chega à conclusão que “a maioria dos capitalistas não sabe dividir o bolo da economia e que a maioria dos socialistas não sabe bem como o fazer crescer”. Mas considera que a alternativa a um entendimento entre as pessoas com ideologias diferentes poderá ser destrutiva.

“Estamos agora numa situação em que ou a) as pessoas com diferentes inclinações ideológicas trabalham em conjunto para refazerem a engenharia do sistema para que o bolo seja bem dividido e cresça ou b) teremos um grande conflito e alguma forma de revolução que irá causar danos a quase toda a gente”, avisa Ray Dalio.

Entre os indicadores que o líder da Bridgewater utiliza para comprovar o falhanço do capitalismo estão a ausência de crescimento do rendimento real dos americanos nas últimas décadas, a diferença do rendimento dos mais ricos em relação à classe média que nunca foi tão alta, as gerações mais jovens que ganham menos que as anteriores e o número cada vez maior de pessoas na pobreza.

O efeito dominó e a ameaça existencial aos EUA

Além desses indicadores, há um factor que o gestor diz ser “intolerável”. “A situação mais intolerável é como o nosso sistema falha para tomar boa conta de muitas das nossas crianças. Um grande número delas são pobres, desnutridas (fisicamente e mentalmente) e pobremente educadas”, afirma.

Ray Dalio considera que essa situação tem consequências negativas para a maior economia do mundo: “Os efeitos dominó têm custos elevados. Rendimentos mais baixos, escolas com financiamentos pobres, e fraco apoio das famílias às crianças levam a pobres registos académicos, que originam produtividade baixa e rendimentos baios para as pessoas que se tornam fardos económicos para a sociedade”.

Os impactos não são apenas económicos. O investidor avisa que há “consequências para a saúde”. As desigualdades chegam também à esperança de vida. “Os homens no grupo dos 20% de menores rendimentos têm uma esperança de vida dez anos inferior aos do top 20%”.

Entre os indicadores realçados está ainda o facto de desde 1990, a proporção de americanos que abandonou tratamentos médicos para doenças graves por causa dos custos quase que duplicou, de 11% para 19%.

“Estas condições colocam um risco existencial aos EUA”, conclui. Ray Dalio promete uma nova publicação com possíveis soluções para reparar o capitalismo.

O sonho americano de um dos mais ricos do mundo

Ray Dalio fundou a Bridgewater Associates, um gigante que tem 150 mil milhões de dólares (cerca de 135 mil milhões de euros) sob gestão. O gestor de 69 anos utiliza a sua infância e juventude como um exemplo das condições que os EUA perderam.

“Foi suficientemente felizardo em ser criado numa família de classe média com pais que cuidaram bem de mim, em frequentar boas escolas públicas e de chegar a um mercado de trabalho que me ofereceu oportunidades iguais”, recorda.

Diz que foi criado “com a crença de que ter oportunidades iguais de cuidados básicos, de boa educação e emprego é o que é certo para o nosso bem-estar coletivo. Ter estas coisas e usá-las para construir uma boa vida era o que significava viver o sonho americano”, que está agora ameaçado.

Dalio construiu uma fortuna pessoal avaliada em 17 mil milhões de dólares pela Bloomberg. É o 66.º mais rico do mundo. O gestor diz que começou a construir a sua riqueza bem cedo. “Aos 12 anos pode-se dizer que me tornei capitalista porque foi quando em usei dinheiro que ganhei em vários trabalhos, como entregar jornais, cortar relva e como caddie de golfe e o coloquei na bolsa numa altura em que o mercado estava quente”, revela.

A estratégia global macro

No início da década de 1960 Dalio trabalhava num clube de golfe que tinha investidores de Wall Street. As conversas sobre o mercado bolsista deixaram-no curioso e começou por investir 300 dólares em ações de uma companhia área que viria a ser alvo de uma fusão. Resultado: triplicou o investimento. Quando terminou o ensino secundário tinha já uma carteira de ações a valer dezenas de milhares de dólares, segundo biografias do investidor.

Chegou na década de 70 à bolsa de Nova Iorque e trabalhou no Merrill Lynch a negociar matérias-primas. Lançou a Bridgewater aos 26 anos e começou a operar no seu próprio apartamento após ter conseguido alguma estabilidade após o casamento com Barbara Gabaldoni, descendente da família dos Vanderbilt, que foi uma das mais ricas dos EUA. Foi conquistando clientes e desenvolveu uma estratégia de investimento que deu frutos.

A tática de Dalio, chamada de global macro, passa por investir em qualquer ponto do mundo. O investidor estudava a história dos mercados para detetar fenómenos que não estivessem a ser reconhecidos pelos seus concorrentes. E lucra com a antecipação de movimentos nas taxas de câmbio, preços de matérias-primas, inflação e crescimento das economias mundiais.

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