As oportunidades agarram-se, não se desperdiçam. Que o diga Pedro Aguiar que há quatro anos decidiu abrir com um colega de trabalho chinês a Gamebau, uma tecnológica ligada ao mercado dos jogos. “O mercado chinês dos jogos é o número um no mundo”, lembra Pedro Aguiar, e isso tem, pelo menos duas explicações: “É o hábito, a população, é tudo isto junto que faz com que seja um mercado muito apetecível”, mas também, sublinha, “muito competitivo”. Foi por isso que a Gamebau decidiu que a melhor forma de abordar este mercado era encontrando “um nicho de muitas empresas que não estavam a ser servidas nem na China, nem de fora”.
Quatro anos depois, “o balanço é muito positivo”, garante. A Gamebau fatura 10 milhões de euro por ano e, em média, tem cerca de 10 mil pessoas, todos os dias, a visitar os jogos que produz, o que corresponde a uma média mensal de 100 a 150 mil downloads de jogos. Uma dimensão que, apesar de tudo é “pequena”, reconhece o empresário, mas ao mesmo tempo, suficientemente grande, ou não fosse a China o país mais populoso do mundo.
São estes nichos de mercado que o Presidente da República incentiva as empresas portuguesas a procurarem, por que é lá que não existe “a concorrência com os grandes, mas, ao mesmo tempo, “são nichos muito grandes para nós”. E são parcerias luso-chinesas como a Gamebau, que o governo quer incentivar. Augusto Santos Silva pede que se multipliquem estas parcerias para mercados terceiros, como os países africanos de língua portuguesa, o Brasil, mas também toda a América Latina”.
Mais longe e mais depressa
A dimensão do mercado chinês, não deixa ninguém indiferente. Durante um passeio pelas ruas de Xangai, o Presidente da República descreve-o, de forma simples, como um mercado de “1.400 milhões de pessoas, das quais 450 milhões são de classe média, o que quer dizer que estão aquém da classe média 900 milhões”. Destes, continua Marcelo Rebelo de Sousa, “150 milhões estão no nível muito, muito baixo”, mas o Presidente olha, sobretudo, para a classe média chinesa, onde “o impressiona é que os 450 milhões têm um poder de consumo muito elevado.”
No seminário económico Portugal-China, que decorreu esta terça-feira em Xangai, Marcelo quis ser claro quando desafiou os empresários portugueses a “ir mais longe e mais depressa”, explicando que “a velocidade neste tempo é outra, os vazios têm que ser preenchidos, não podemos perder um minuto na concretização dos vossos projetos.”
Marcelo assegura que, naquilo que depende dos chefes de Estado dos dois países, “estamos presentes, o Presidente Xi e eu”, mas lembra que “a vida não se faz só com os poderes políticos, faz-se com as pessoas, com os que criam as empresas e com os que criam a cultura”.
E é também para essas pessoas que o governo desafia a “olhar para a vastidão do mercado da China”, lembrando, o ministro dos Negócios Estrangeiros que “há um trabalho muito importante que está a ser feito pelos dois governos” de abertura deste vasto mercado aos produtos portugueses.
A China está realmente a abrir-se?
A resposta instintiva de políticos e de empresários é sim. Marcelo Rebelo de Sousa reconhece que “tradicionalmente este sempre foi um mercado protecionista”, mas não tem dúvidas em afirmar que a “China está diferente”.
Miguel Maia, presidente executivo do Millennium BCP, vê “vários sinais claros de abertura da China ao investimento estrangeiro” e, em particular, “ao investimento europeu”. O programa Belt and Road (Faixa e Rota), lançado recentemente pelo regime chinês, é a prova evidente disso mesmo, considera Miguel Maia, que não compreende – apesar de não o surpreender – a desconfiança que existe em torno deste programa: ter a China a querer ter um mercado mais global numa altura em que a globalização está parada – para não dizer a andar um bocadinho para trás – acho que é positivo”, explica, lembrando, ao mesmo tempo que “o mundo para ser mais equilibrado tem que ser mais global”.
O Millennium, que tem como principal acionista os chineses da Fosun, quer ter um papel relevante nesta nova era, “quer no apoio ao investimento chinês em Portugal, quer no apoio às empresas portuguesas que queiram encontrar um mercado com o potencial que a China tem.”
Os interessados têm aparecido. “Muitos não diria, mas alguns com impacto relevante”, adianta Miguel Maia, lembrando, ao mesmo tempo, que “é mais importante a qualidade do que a quantidade, porque as empresas para se internacionalizarem têm que fazer bem as suas escolhas e têm que estar bem preparadas”.
Mas nesta estrada, que Portugal quer que tenha, pelo menos, duas vias, há um pedido que Marcelo Rebelo de Sousa tem feito, insistentemente por estes dias. Primeiro em Pequim e depois em Xangai. O de que o investimento chinês em Portugal não se resuma apenas a participações acionistas nas empresas portuguesas. Que seja um investimento que crie de raiz novas empresas e novos postos de trabalho.
Ora, se há alguém com conhecimento de causa nesta matéria, é precisamente Miguel Maia, ou não tivesse o BCP, como principal acionista, a chinesa Fosun. E a leitura do presidente executivo do BCP é ligeiramente diferente da do Presidente da República: “O investimento chinês que melhor conheço – que é o investimento da Fosun em Portugal- é um investimento que tem criado imenso valor para o país, no investimento que permitiu a recuperação e viabilização do BCP, na área dos seguros ou, por exemplo a Luz Saúde, que vai agora abrir mais um hospital e criar mais 800 postos de trabalho”. Provas, diz Miguel Maia, de que nem todo o investimento chinês que tem entrado em Portugal é meramente financeiro, muito deste investimento “é importante para o país, cria emprego e valor para o País”.
Uma reunião com 500 anos
O “toque humano” é característica bem conhecida nas intervenções de Marcelo Rebelo de Sousa. Até quando está a “tratar de negócios”, como era o caso do seminário de empresários em Xangai. O propósito é claro: aproximar, mexer e remexer com as memórias – boas naturalmente – dos chineses sobre Portugal. É por isso que não se tem cansado de lembrar aos chineses que Portugal e China nunca estiveram em guerra. Ou a relação de de quase 500 anos entre os dois países e que os “portugueses foram os primeiros europeus a chegar por via marítima à China. Chegámos e ficámos, tal como a China ficou em Portugal. Ficámos no coração um do outro”.
Se o apelo ao sentimento resultar na política económica, o resto, garante Marcelo já está feito:”O quadro hoje é um quadro de excelência nas relações institucionais e na empatia pessoal”.
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