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Com os recursos públicos esgotados e os números da covid a escalar – como de resto se sabia que aconteceria com a chegada do outono -, a ministra da Saúde, Marta Temido, anda numa maratona para tentar recuperar o tempo perdido e negociar agora acordos com os grupos privados antes deixados de lado, desprezados os investimentos que fizeram ainda em abril para entrarem em ação ao lado do SNS se fosse necessário.
Nesta semana, a Associação Regional de Saúde (ARS) do Norte avançou já com propostas de acordo com os grupos Lusíadas e José de Mello Saúde para tratar os doentes que não têm lugar nos hospitais do SNS. E a CUF já está mesmo a receber pessoas encaminhadas pelos hospitais públicos, cuja capacidade está perto de esgotada, num momento em que os contágios não dão tréguas. Ontem registou-se novo recorde diário, com 5550 novos casos de covid e mais 52 mortes, com a pandemia a assumir particular incidência a norte.
“Até ao momento foram transferidos do Serviço Nacional de Saúde para o Hospital CUF Porto três doentes covid, oriundos do Centro Hospitalar Tâmega e Sousa. Até ao final da manhã será transferido mais um doente covid da mesma unidade”, confirmou ao Dinheiro Vivo fonte oficial da José de Mello Saúde, que está já a alargar a sua capacidade de forma a acomodar novos casos de infeção pelo novo coronavírus encaminhados pelo SNS.
“A CUF está a reforçar a capacidade de camas para doentes covid, das 20 atuais para 36, sendo 22 no Porto e 14 em Lisboa. Deste total, há nove que são camas de cuidados intensivos.”
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Também ao grupo Lusíadas, Marta Temido veio para já pedir ajuda, de forma que as unidades do Porto e de Braga possam receber doentes não covid transferidos do Hospital de Santo António, no Porto. Fonte oficial do grupo confirmou ao Dinheiro Vivo que “os dois primeiros casos no âmbito deste acordo”, fechado na quinta-feira, já deram entrada nos Lusíadas. O acordo prevê que os Lusíadas disponibilizem, ao custo fixado no valor do GDH menos 10%, “25 camas cirúrgicas e dez camas médicas”, tendo já indicação de chegada, ainda neste fim de semana, de “dez casos médicos agudos não covid”.
Outras doenças atrasadas
Também no que respeita ao tratamento de todas as outras patologias a que, devido ao embate da pandemia, o SNS não tem como dar resposta, há portanto agora envolvimento dos privados.
Conforme o grupo comunicou nesta semana, desde 3 de novembro, a Lusíadas Saúde atua no âmbito de um despacho do gabinete da Ministra da Saúde, que indica que as unidades do SNS deverão ver suspensa “a atividade assistencial não urgente que, pela sua natureza ou prioridade clínica, não implique risco de vida para os utentes”. Conceito que não é simples, já que casos não urgentes podem resultar, se não atendidos precocemente, em situações graves ou mesmo fatais, como é o caso de doentes oncológicos.
O grupo Lusíadas está em contacto com a ARS Norte, desde esta terça-feira, tendo iniciado “o processo de adesão ao acordo que, para além da duplicação da capacidade instalada para SIGIC – já informada e em operação -, irá permitir o internamento de doentes com patologia médica em fase aguda”, de forma a acelerar a execução das cirurgias urgentes em lista de espera.
A Luz Saúde não quis, para já, comentar em que medida estará também envolvida nas soluções.
Negociações tensas
Além de estarem agora a ser apressados contactos e acordos que deveriam ter sido construídos nos últimos meses, dada a certeza da evolução da pandemia e do stress que provocaria sobre o SNS, a negociação entre Temido e os privados tem sido marcada por momentos de tensão. Veio inclusivamente a público nestes dias a sombra de uma requisição civil – solução de último recurso e que implicaria, no final, custos acrescidos para o Estado.
As acusações da tutela de indisponibilidade dos grupos para fazerem parte de uma solução têm sido prontamente desmentidas pelos privados. “A ARS de Lisboa e Vale do Tejo ficou de apresentar um plano do que pretendia e em que termos poderia ser a relação com os hospitais privados”, garantiu o presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada. “Reitero a disponibilidade dos hospitais privados na resposta aos problemas da covid e às restantes necessidades de saúde”, sublinhou Óscar Gaspar no fim de uma audiência em Belém, defendendo que “os portugueses precisam duma resposta mais ampla”, envolvendo os setores público e privado, e lamentando a “relação institucional inexistente” entre a tutela e o setor privado.
De acordo com o responsável, foi apenas há cerca de uma semana que começaram a haver “alguns contactos” das administrações regionais de saúde de Lisboa e Vale do Tejo e do Norte para aferir a capacidade de resposta dos hospitais privados para a nova fase da pandemia.
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