//Miguel Cabrita: “Tem de se garantir uma melhor proteção ao trabalhador”

Miguel Cabrita: “Tem de se garantir uma melhor proteção ao trabalhador”

O governo assume o compromisso de regulamentar a atividade das plataformas, por forma a garantir “melhores condições e mais direitos aos trabalhadores” a elas afetos, “sem esperar por decisões judiciais”, como afirma Miguel Cabrita, secretário de Estado do Trabalho.

Qual é o ponto de partido do governo na proposta de regulamentação do trabalho das plataformas digitais?

A questão das plataformas é muito importante. É algo que já vem de trás, mas que ganhou durante a pandemia uma visibilidade e uma relevância muito grandes. É um sector claramente crescente, sobre o qual há pouca informação disponível e que no seu modo de funcionamento foge muito aos parâmetros normais do mercado de trabalho. É também um sector ainda pouco transparente para quem está fora, mas em que há a perceção de que há aspetos que têm de ser melhor regulados e em que se tem de garantir uma proteção melhor aos trabalhadores. Claramente, são trabalhadores com níveis de proteção tendencialmente muito inferiores àqueles que existem noutros segmentos do mercado de trabalho. Isto é muito típico de sectores emergentes. Há um debate que está a acontecer em vários países. Nalguns casos vão-se encontrando soluções a partir de soluções judiciais que vão existindo. Noutros casos tem havido propostas legislativas que vão sendo feitas. Gostaríamos que em Portugal o caminho seguido fosse o caminho de uma melhor regulação, sobretudo – e a grande orientação era essa – garantindo melhores condições de trabalho e mais direitos para estes trabalhadores.

No caso da decisão judicial espanhol recente, que reconhece as relações de trabalho dos estafetas da Glovo, o exemplo do governo espanhol será o de uma tentativa de garantir esse reconhecimento, mas com dificuldade em olhar para todo o tipo de plataformas. O governo português tem um levantamento, sabe o que pretende regular? Serão os trabalhadores de TVDE, serão também de outros serviços?

É preferível tentar encontrar uma regulação de todo este segmento do mercado de trabalho sem esperar por decisões judiciais que pudessem eventualmente um dia vir a existir, mas fazê-lo de maneira mais integrada, e, no fundo, tentando antecipar questões e problemas. Aliás, Portugal foi um dos primeiros países a avançar para a regulação daquilo que cá se chamou o TVDE, plataformas como a Uber de motoristas e afins. Estivemos relativamente à frente em relação a essa questão específica, e era importante continuar a acompanhar a evolução do mercado de trabalho e destas atividades e ter uma regulação sem esperar por um dia existirem eventuais decisões judiciais sobre casos em concreto. Não temos ainda uma posição final fechada sobre os contornos concretos da regulamentação que queremos propor. O que defendemos são dois princípios básicos: melhor regulação e mais transparência, e mais direitos e melhor proteção para os trabalhadores, seja em termos de condições de trabalho, segurança e saúde, proteção social. Por outro lado, defendemos que se devem aplicar a estes trabalhadores os mesmos princípios que se aplicam a outros. Quando objetivamente as condições em que prestam trabalho correspondem a um contrato de trabalho, ele deve ser reconhecido e deve existir. Se forem outros modelos mais flexíveis, que na verdade e no concreto da prestação de trabalho se revele que de facto há alguma autonomia dos trabalhadores, então poderá haver outro modelo de prestação de trabalho. Já foi esta a solução encontrada para o caso da Uber e dos TVDE.

Qual o universo para o qual se vai olhar?