Sílvio Silva é um dos portugueses que trabalham na sede do N26, em Berlim. É gestor sénior de marketing online no banco digital e veste uma camisola com uma frase do filme Sozinho em Casa. “É o dia de trazer camisolas de Natal”, disse ao DV. O ambiente é o de uma típica empresa de tecnologia: não há cofres com dinheiro, homens de fato e gravata ou mulheres com blazer.
Além de Sílvio, trabalham no banco digital alemão mais de duas dezenas de portugueses. Quando houver 26 portugueses no banco, há festa. “Sempre que uma nacionalidade atinge o número 26 há uma celebração”, disse Sarunas Legeckas, diretor-geral do banco, durante uma visita do DV às instalações do banco, em Berlim.
O banco foi fundado em 2013 por Valentim Stalf e Maximilian Tayenthal e foi lançado em 2015. Hoje, está presente em 26 países. Entrou recentemente no mercado norte-americano e em breve vai estrear no Brasil. Conta com 3,5 milhões de clientes, dos quais cerca de cem mil em Portugal e as últimas rondas de financiamento colocam a avaliação do N26 nos 3,5 mil milhões de euros. O banco está apostar tudo no crescimento e na expansão. Em 2019, o N26 cresceu 320% em tamanho; a base de clientes triplicou e o volume de movimentos ultrapassa os 2 mil milhões de euros por mês.
Um banco global
No N26, o ambiente de salas em open space é temperado por bandeiras de diferentes países espalhadas por ilhas de secretárias. Apesar do concurso de camisolas de Natal, muitos trabalhadores vestem T-shirts pretas. O ambiente é minimalista com toque industrial. Os tetos estão em bruto e tem condutas visíveis. As salas de reuniões têm vidros transparentes e grandes ecrãs, através dos quais responsáveis do banco ou equipas de outros escritórios se reúnem com os colegas de Berlim. Numa das salas de reunião, um husky dorme a sesta enquanto o dono se reúne em videoconferência com um colega. Há camas de animais de estimação espalhadas pelo escritório. “Temos muitos cães aqui, como se pode ver pelo pelo que fica na alcatifa”, apontou Samantha Hendriks, gestora de comunicação, uma australiana que já desempenhou o mesmo cargo no motor de busca de hotéis Trivago. “Foi numa das máquinas de café profissionais que Hendriks serviu um dos famosos latte australianos.”
Nas várias cozinhas-espaços de refeição que existem no escritório, além de máquinas de café, há frigoríficos com bebidas diversas e, em alguns casos, cestos com fruta. Há ainda espaços de lazer e ilhas com sofás para trabalhar, reunir ou relaxar. “Queremos que os colaboradores se sintam felizes aqui”, disse Hendricks. A cada mês, chegam ao departamento de recursos humanos do banco 12 500 candidaturas de interessados em trabalhar no N26.
Além de Berlim, onde o banco tem dois escritórios, o N26 tem presença física em Barcelona, Viena, Nova Iorque e São Paulo – para preparar a entrada no país no final de 2020. Quanto a balcões, não tem nem um. E numa das salas do banco está inscrito na parede um dos seus slogans: “Os balcões são tão anos 90.” Apesar de ser um banco sem agências, não tem apenas clientes mais jovens. “Em Portugal, os nossos clientes mais antigos estão nos 80 anos”, notou Legeckas. Cerca de 40% da base de clientes em Portugal tem acima de 35 anos. O grupo de idades que mais adere ao banco é o que se situa entre os 18 e os 24 anos. A base de clientes em Portugal aumentou 209% em 2019, tornando o mercado português um dos de maior crescimento do banco. O aumento da base de clientes mulheres tem superado a dos homens, com crescimentos, respetivos, de 250% e 195%.
Rivais digitais e convencionais
Apesar do crescimento, está ainda longe dos 300 mil clientes da Revolut, a fintech britânica popular com a sua aplicação e cartão de pagamentos. “Sabemos que a Revolut é grande em Portugal, mas há uma diferença fundamental. Nós somos um banco com licença, eles não são. Operam sob uma licença de moeda eletrónica”, frisou Legeckas. “Somos um dos bancos digitais mais antigos, com licença há três anos. A nossa licença é do Banco Central Europeu e usamos essa licença em todos os países na Europa, incluindo Portugal”, notou. O diretor-geral do N26 salientou ainda o facto de o banco ser supervisionado “pelo BaFin, um dos reguladores mais credíveis e duros e mantém a fasquia de regulação muito alta”. Destacou que as contas bancárias no N26 “estão protegidas até cem mil euros pelo Fundo de Garantia de Depósitos”. “Se tem dinheiro num cartão de viagens, não está garantido”, salientou.
Comparando com os bancos convencionais, o responsável do N26 destaca que “a nossa vantagem competitiva é que temos uma tecnologia melhor, melhores infraestruturas tecnológicas, custos menores”. “Somos lucrativos em termos de utilizador. Se parássemos com as ações de marketing, a expansão e o crescimento, teríamos lucros. Não temos lucros, como companhia, porque estamos focados na expansão e no crescimento porque queremos atingir cem milhões de clientes.”
O mais recente mercado do banco é o norte-americano. “É um grande mercado e um mercado muito antiquado. Quase não usam banca online”, disse. “Para fazer uma transferência, um colega meu teve de se deslocar fisicamente a um balcão de um banco. É uma grande oportunidade para nós.” Nos EUA, o N26 está a oferecer benefícios aos clientes, incluindo descontos e cashback nas compras pagas com cartão do banco.
Agora, o banco alemão está empenhado em construir a operação no Brasil, prevendo começar a oferecer serviços no final deste ano.
Legeckas admite que ainda há muitos desafios, incluindo de cibersegurança, o que é transversal a todo o setor da banca. Quanto à concorrência, não vem só de fintechs: os bancos convencionais estão a reagir com ofertas digitais. O banco digital N26 não está sozinho em casa.
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