Da porta dos fundos para o portão principal. A habitação já foi o parente pobre das promessas eleitorais, mas este ano saltou para o salão nobre das preocupações dos partidos. A escalada do preço das casas nos últimos anos colocou no centro do debate público conceitos como ‘gentrificação’ e até levou à criação da primeira Lei de Bases da Habitação, que entra em vigor a 01 de outubro.
Com o país a fazer contas ao metro quadrado, o Dinheiro Vivo olhou para as propostas para a próxima legislatura dos seis partidos com assento na casa da Democracia. O resultado? Nunca como hoje a expressão “renda acessível” tinha sido sinónimo de caça ao voto. Depois da paz, do pão, da saúde e da educação, chegou a vez de a Habitação entrar pela porta grande nos programas eleitorais.
Leia também as propostas para a Habitação dos partidos sem assento parlamentar.
PS. Um país sem carências até 2024
É o Partido Socialista o primeiro a reconhecer que “ao longo de muitos anos” o Estado Social prestou “menos atenção à habitação”. Na legislatura que agora termina, o Governo de António Costa começou por lhe dedicar uma secretaria de Estado, para no fim lhe atribuir o seu próprio Ministério.
O programa do PS inclui 26 medidas relacionadas com o tema. São quase quatro páginas de propostas que giram em torno da Nova Geração de Politicas de Habitação, e que apontam para um objetivo: “erradicar todas as carências habitacionais até ao 50º aniversário do 25 de abril, em 2024”
Entre os vários “promover”, “apoiar”, “incentivar”, “facilitar” ou “criar melhores condições”, há uma medida concreta que, nesta matéria, é a bandeira do PS para a próxima legislatura: “Criar um parque habitacional público de habitação a custos acessíveis, orientado para dar resposta aos agregados de rendimentos intermédios em situação de dificuldade de acesso à habitação, através da promoção direta e do apoio aos programas municipais”.
Esta é a promessa mais cara do programa dos socialistas. Os números não constam no programa mas foram revelados ao Expresso. O PS prevê investir 600 milhões de euros ao longo de quatro anos (150 milhões por ano, entre 2020 e 2023) para criar 25 mil casas de custo acessível até 2024. Destas, 15 mil serão feitas em parceria com os municípios.
O PS prevê ainda criar um Programa Nacional de Habitação, uma Bolsa Nacional de Alojamento Urgente e reforçar o controlo sobre os edifícios devolutos, transformando-os em habitação acessível.
PSD. “Um direito por concretizar”
Em comparação com o programa de 2015, feito então em conjunto com o CDS, a Habitação ganhou terreno no programa dos sociais-democratas para a próxima legislatura.
Em dez pontos, o partido liderado por Rui Rio defende uma “política nacional de habitação” sustentada em três pilares: Produção de Habitação Pública, Multiplicação de Centralidades e Regulação de Mercado. Para cumprir este último ponto, o PSD propõe limitar os Vistos Gold “aos setores produtivos” ou a “zonas fora das áreas metropolitanas”.
O partido defende ainda a manutenção de medidas já em vigor, como “os benefícios fiscais ao arrendamento de longo prazo, ou de quartos a estudantes” e “os limites introduzidos no Alojamento Local”, com a “definição de quotas por freguesia nos grandes centros urbanos”.
Tal como o PS, o PSD promete reforçar o programa Porta 65, acrescentando a “substituição da renda máxima admitida por uma renda de referência”. Ainda no apoio aos jovens, o partido propõe incentivar as autarquias “a isentarem de IMT as aquisições de primeira casa de habitação permanente”.
O PSD quer ainda voltar trazer ao debate “a possibilidade de as autarquias tomarem posse administrativa (a valores de mercado) de espaços devolutos, que se encontrem em elevado estado de degradação”.
Bloco de Esquerda. 100 mil casas de renda acessível
É o partido que se mais se alonga sobre o que considera ser “o parente pobre do investimento público em Portugal”. Ao longo de cinco páginas, o BE identifica as causas do problema, refere que com a resposta do PS “os objetivos não serão atingidos” e apresenta, com contas, as suas soluções.
O partido liderado por Catarina Martins tem um grande objetivo para a legislatura: quer criar um programa com 100 mil casas de renda acessível, entre 150 e 500 euros. Como? “Combinando reabilitação pública de alojamentos existentes, construção de novos alojamentos e, se necessário, subsídio ao arrendamento de alojamentos privados”.
Segundo as contas do Bloco, concretizar a medida irá custar aos cofres do Estado seis mil milhões de euros, o equivalente a 1,5 mil milhões de euros por ano e a 60 mil euros por cada casa.
O partido admite que uma “comparticipação razoável” da União Europeia pode reduzir “substancialmente” o custo direto da medida, juntamente com a “revisão de impostos sobre o património e respetivos benefícios fiscais” e o dinheiro das rendas, que rondará em média 420 milhões de euros por ano.
Assim, conclui o Bloco, “o Estado terá recuperado todo o seu investimento a partir do 5º ano do programa”. Num dos debates televisivos entre os líderes partidários, Catarina Martins referiu esta proposta como a que melhor resume o que o partido defende para o país.
Além desta bandeira, o partido propõe também a extinção dos benefícios fiscais dos fundos imobiliários, a “retirada do quadro legal imposto pela Lei Cristas” ou a promoção de contratos de arrendamento de longa duração a 8 anos.
PCP. Fim ao “negócio” e aos “favores” à banca
Dos seis partidos com assento parlamentar, o PCP é o que dedica menos linhas do seu programa à Habitação, cujo direito foi, para os comunistas, “transformado num negócio”. Em sete pontos, o PCP define como prioridades a mobilização do património público para programas de renda acessível e a recuperação de imóveis devolutos.
O partido liderado por Jerónimo de Sousa defende que as rendas apoiadas devem ter em conta o rendimento líquido e não o bruto.
O partido pretende ainda revogar o “balcão dos despejos” e fixar “um período mínimo de 10 anos para novos contratos de arrendamento excepto se requerido pelo arrendatário”.
O PCP defende que é necessário reforçar as verbas previstas no Orçamento do Estado para apoiar o Arrendamento Jovem, lançar um Programa de Recuperação do Parque Habitacional Público e “impedir penhora e execução da hipoteca sobre a habitação para pagamento de dívidas irrisórias ou em condições de favor à banca”.
CDS. Pôr fim ao quebra-cabeças burocrático
“Encontrar casa não tem de ser um quebra-cabeças”. É este o título do capítulo que o programa do partido de Assunção Cristas dedica à Habitação. Em seis páginas, o CDS explica em 22 pontos como pretende resolver o problema da falta de oferta, respeitando “o direito de propriedade”.
O CDS começa por defender que o Estado “pode fazer muito mais pelo aumento da oferta”, classificando como “incompreensível” o negócio dos terrenos da antiga Feira Popular.
O partido quer “disponibilizar a maior quantidade possível de edifícios públicos, do Estado central ou dos municípios, para que sejam transformados em apartamentos”.
As palavras de ordem do CDS para a Habitação são “desburocratizar”, “flexibilizar” e “reduzir”. Os centristas apontam baterias à construção e à reabilitação, apostando na necessidade de rever a legislação aplicável, com o objetivo de diminuir o tempo e os custos inerentes a ambas as atividades.
Entre as propostas concretas, o CDS defende uma medida que permite aos cidadãos vender a sua casa, receber o dinheiro da venda, ou parte dele, e continuar a viver no imóvel. A “venda antecipada de imóvel” teria como destinatários as pessoas com menos rendimentos. O partido quer “promover o necessário enquadramento para facilitar a criação de fundos de antecipada compra de imóveis com direito de usufruto dos atuais proprietários”.
Em matéria fiscal, o partido propõe descer a taxa de IRS do arrendamento tradicional de 28% para 23% e isentar os contratos de imposto de selo.
PAN. 45 medidas para uma habitação digna
Das 1196 propostas do Pessoas-Animais-Natureza para a próxima legislatura, 45 são referentes à Habitação. O PAN dedica o capítulo 8 do seu programa a elencar medidas para uma “Habitação Digna e Acessível”, em matérias distintas como arrendamento, reabilitação ou habitação para fins turísticos.
Para o PAN, “o compromisso do Governo” para responder aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU até 2030 no que toca à habitação está “longe de ser satisfatório”.
A alternativa do partido passa por ir mais além na redução da taxa de IRS dos contratos de arrendamento de longa duração, para “20% logo no contrato inicial de duração superior a 5 e inferior a 10 anos”. E para “desincentivar investimentos especulativos” o PAN defende o fim dos vistos Gold.
Uma das propostas para incentivar o arrendamento de longa duração é a criação de um Fundo de Compensação para proprietários cujos imóveis “permaneçam com contratos de arrendamento claramente prejudiciais em termos financeiros, mas que paralelamente cumpram uma função social, a qual deve ser exercida pelo Estado, procurando minimizar o fosso entre o valor real de renda e o recebido”.
Mais do que medidas, os restantes 40 pontos do programa referem-se a objetivos abrangentes, como “promover a implementação de estratégias”, “reforçar mecanismos”, “criar novos incentivos” ou “reforçar as verbas do Orçamento”.
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