A era dourada do turismo em Portugal tem os dias contados se os preços do alojamento continuarem a subir de forma acelerada, como até aqui, e se as regiões afetadas pelo terrorismo num passado recente se livrarem desse flagelo e voltarem a atrair estrangeiros, algo que até já está a acontecer, alerta a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), no estudo económico sobre Portugal (Economic Survey of Portugal 2019).
O secretário-geral da OCDE, Angel Gurría, deslocou-se ontem ao Ministério da Economia, em Lisboa, para lançar uma série de avisos à navegação. Elogiou o país pelas reformas já feitas, por ser um exemplo internacional de como sair da crise, mas reparou que é preciso fazer mais para resistir a choques ou a crise que surjam no futuro.
Algumas das ideias fortes foram: garantir que o défice desaparece e que o sector público começa a gerar excedentes orçamentais sucessivos para reduzir a dívida muito elevada; aumentar impostos, acabando com isenções de IVA e taxas reduzidas; tributar ainda mais os combustíveis poluentes, como gasóleo e gás natural; promover mais os transportes públicos; travar as reformas antecipadas; formar mais enfermeiros para poder alargar os cuidados primários e domiciliários (e gerar poupanças maiores a nível dos hospitais).
Além disso, a OCDE mostrou-se especialmente preocupada com o turismo, sector que atualmente tem uma enorme vitalidade, mas que pode durar pouco.
O turismo tem sido um maná para a retoma económica dos últimos anos. Tem puxado por muitos setores. Pela hotelaria, pelos transportes, pela restauração, pelos serviços às empresas, pela construção, pelas máquinas e equipamentos, pela indústria alimentar e pelo comércio de bebidas. Tem gerado diretamente muito emprego por ser um sector intrinsecamente intensivo em mão de obra.
A OCDE começa por dizer que “mais de um quinto do crescimento registado nas exportações entre 2009 e 2017 é diretamente atribuível à indústria do turismo” e que “os sectores das viagens e do turismo representam agora quase metade das exportações de serviços nacionais”.
Casas caras para todos
Primeiro problema. A habitação está sob uma “considerável pressão”. O “boom do turismo” e a política dos vistos gold aumentaram muito a procura de casas “especialmente em Lisboa, no Porto e no Algarve”, mas, observa a entidade no novo estudo, “o crescimento da oferta de habitação não acompanhou o ritmo”. Entre 2007 e 2014, o investimento anual em habitação caiu mais de 50% logo boa parte do crescimento não chega para compensar esse grau de destruição dos anos da crise.
“Nos últimos anos, tem havido um aumento constante na oferta de alojamentos turísticos”. O número de camas “aumentou 23% entre 2013 e 2017”; um terço desse crescimento tem a ver com a maior disponibilidade de “quartos em habitações locais” “Em Lisboa, a oferta do Airbnb mais do que duplicou entre 2015 e 2017”, mas a procura turística total continua a ultrapassar claramente a oferta. Foi o que aconteceu nos últimos anos, garante a entidade.
Isto está a conduzir “a um forte crescimento dos preços do alojamento turístico” e contribui para uma “pressão ascendente sobre as rendas da habitação” e outros custos, em Portugal.
Tudo isto ameaça “reduzir a competitividade do setor do turismo em Portugal” e pode levar a “intervenções políticas que limitam a expansão do turismo”, como por exemplo medidas que promovam a habitação a preços mais acessíveis, como já está a acontecer.
Além do mais, os custos mais elevados da habitação “podem dissuadir o investimento estrangeiro no setor empresarial”, avisa a OCDE.
O fator terrorismo
Segundo problema: o terrorismo vem, mas também desaparece e as regiões que dantes foram muito afetadas, podem voltar a brilhar, roubando turismo a Portugal. O inverso já aconteceu. Por causa do terrorismo, Portugal começou a ser escolhido como destino por ser mais seguro e barato.
Segundo a OCDE, “o declínio do número de turistas do Reino Unido entre 2010 e 2016 em países que enfrentaram um aumento do impacto do terrorismo, como França, Turquia, Egito e Tunísia, coincidiu com uma subida no número de turistas em Portugal e alguns países do sul da Europa, como Espanha, Itália e Grécia”.
Logo, “tendo em conta estes padrões”, basta que os turistas comecem a percecionar outros locais como sendo mais seguros para que “alguns fluxos turísticos que foram redirecionados para Portugal possam ser revertidos”. A OCDE diz que isso que esse efeito já aconteceu com a Turquia, que voltou a estar em alta.
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