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Os preços da energia e, em particular, dos combustíveis derivados do petróleo sofreram um novo impulso nos últimos meses devido a medidas (reduções no fornecimento) decretadas pelos maiores produtores de crude, como Arábia Saudita, que lidera a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), e isso é um risco sério que pode fazer aumentar muito a inflação novamente, prolongando assim o quadro de taxas de juro muito elevadas por mais tempo.
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Segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), que ontem divulgou o novo panorama (outlook) económico intercalar de setembro, o cenário atual (sem mais choques nos preços da energia e dos alimentos) já praticamente garante que o Banco Central Europeu (BCE) mantém a taxa de juro diretora nos atuais 4,5% (segundo valor mais elevado desde que existe o euro) até ao início de 2025, na melhor das hipóteses.
Ainda de acordo com a OCDE, no atual cenário em que a inflação continua alta, mas a aliviar gradualmente, a economia começa a vacilar (como já acontece, veja-se o caso da Alemanha e de Portugal).
Neste quadro, o BCE deve parar o aperto, assume a OCDE: não sobe mais nenhuma vez as suas taxas de referência, as mesmas que ditam diretamente o nível das taxas de juro euribor e o custo dos empréstimos bancários. Há o risco de provocar mais danos e agravar as recessões que já se perfilam no horizonte.
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No entanto, no outlook, a organização sediada em Paris faz um aviso: nesta fase, nada se deve tomar por adquirido pois o balanço geral dos riscos é “negativo”.
Um desses riscos, talvez o mais proeminente e ameaçador, é que a nova vaga de inflação na energia e no petróleo venha a ser pior do que se pensa.
Ontem, a cotação do barril de crude Brent, a referência principal para a Europa, aproximou-se dos 100 dólares, ultrapassando 95 dólares, o valor mais elevado dos últimos dez meses, segundo a AFP.
Uma coisa é certa: a pressão vinda dos preços da energia poderá provocar uma reação ainda mais violenta dos bancos centrais, levando-os a insistir em novas subidas de juros (quando o plano era terminar o aperto) ou então a prolongar a fixação das taxas de juro nos atuais máximos, mas por mais tempo.
No caso do BCE, pode ser prolongar os 4,5% além de 2025 face ao cenário assumido neste outlook, por exemplo.
“Os preços da energia continuam a ser importantes, tanto para o crescimento, como para a inflação nas economias do G20” e “as descidas acentuadas dos preços do petróleo, do gás e do carvão desde os seus picos de 2022 contribuíram para a retoma do crescimento e a diminuição da inflação no primeiro semestre de 2023”.
Custo do crude já subiu mais de 25% desde maio
No entanto, Mathias Cormann, o secretário-geral da OCDE, alertou ontem que nos últimos tempos, meses, “as economias da OPEP implementaram cortes na produção, e com as existências [reservas e stocks, por exemplo] em níveis relativamente baixos de petróleo, os preços aumentaram mais de 25% desde o final de maio”.
“Este movimento ascendente nos preços do petróleo aumentou a contribuição da energia para a inflação dos preços no consumidor em muitos países do G20”, quando antes disto estava a aliviar.
Portanto, segundo a organização sediada em Paris, existe um risco negativo sobre as economias e os níveis de vida dos cidadãos “que é a possibilidade de ocorrência de choques adversos de oferta nos mercados globais de matérias-primas”.
“Os preços dos alimentos e da energia têm um grande peso nos índices de preços no consumidor de muitos países e são um determinante importante das expectativas de inflação das famílias”, diz a OCDE. Se as expectativas descolam, os bancos centrais e, no caso europeu, o BCE, não tardará a agir e a ser novamente duro no preço do dinheiro.
Segundo a OCDE, “embora os preços da energia estejam longe dos seus picos em 2022, na sequência da invasão da Ucrânia pela Rússia, a verdade é que os mercados energéticos continuam apertados e o potencial de perturbações no fornecimento de petróleo, carvão e gás permanece elevado”.
Logo, “um novo aumento nos preços da energia daria um novo impulso à inflação e prejudicaria o crescimento nas economias importadoras de matérias-primas”, como é o caso flagrante da Europa e da maior economia do grupo, a gigantesca Alemanha, que está em recessão.
A OCDE também alerta que “o ressurgimento dos preços altos e da escassez de alimentos pode agravar a segurança alimentar numa série de economias emergentes e em desenvolvimento”, notando, por exemplo, que o fenómeno El Niño “começou em junho e deverá afetar negativamente algumas culturas de alimentos no próximo ano”.
Em cima disto, a organização adverte que “as restrições à exportação por parte de alguns produtores-chave estão a limitar a oferta nos mercados globais, especialmente o arroz, onde os preços globais estão no nível mais alto dos últimos 15 anos”.
Por último, mas não menos importante, “a guerra na Ucrânia também pode gerar novas pressões sobre os preços do trigo, do milho, dos óleos alimentares e fertilizantes”.
Pouco gás na economia
A OCDE defendeu que a política do BCE deve persistir numa “restritividade necessária” para domar a inflação, mas aceita que o agravamento do custo do crédito pode fazer subir os casos de falências, de incumprimento e desemprego. Repara que a zona euro destacou-se muito pela negativa na concessão de crédito, que travou de forma “acentuada”.
Segundo a OCDE, “na zona euro, onde a procura já se encontra moderada”, prevê-se que o crescimento do PIB [Produto Interno Bruto] diminua para 0,6% em 2023 e depois suba para apenas 1,1% em 2024, “à medida que o impacto adverso da inflação elevada sobre os rendimentos reais se desvanece”.
Face ao outlook de junho, trata-se de uma forte revisão em baixa do ritmo económico previsto para a área da moeda única: menos três décimas de ponto este ano e menos 0,4 pontos percentuais no próximo.
A inflação da zona euro também foi revista em baixa, mas continuará muito acima do limite tolerado pelo BCE (5,5% este ano e 3% no próximo), o que significa que há argumento para manter juros muito altos ou não descer taxas dos níveis máximos que hoje vigoram.
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