Governo e Bloco de Esquerda (BE) deram sinais de tensão nas negociações para o Orçamento do Estado de 2019 (OE 2019), um dos temas centrais na “rentrée” do parlamento, para o qual os partidos já apresentaram propostas.
Socialistas e bloquistas não se entendem quanto à taxa para travar a especulação imobiliária, proposta pelo BE.
Num primeiro momento a coordenadora do BE, Catarina Martins, disse que a medida estava a ser negociada com o executivo, o PS deu sinais contrários, recusando aprovar esta proposta que também motivou um duelo à direita.
O PSD não recusou liminarmente a proposta, embora Rui Rio, presidente do partido, tivesse sugerido a aplicação diferenciada da taxa do IRS. Logo, o CDS demarcou-se da ideia e acusou os sociais-democratas de se juntarem ao BE na “caça ao contribuinte”.
Desde antes do verão, porém, que as reivindicações para o orçamento entraram no discurso dos partidos políticos.
BE, PCP e PEV elegeram as suas prioridades nas negociações com o Governo PS para o Orçamento do Estado de 2019 (OE 2019), como o investimento público, incluindo na Saúde, a redução do IVA na eletricidade ou o aumento das pensões.
A um mês da entrega do OE, estas são as propostas confirmadas publicamente
pelos partidos com representação parlamentar.
Há
mais para além da “taxa Robles”? Bloco em busca de “soluções
imaginativas” para o IVA da eletricidade
O Bloco de Esquerda (BE) escolheu como temas prioritários no OE 2019 a baixa do IVA na eletricidade, avanços na reforma por inteiro para longas carreiras contributivas e o investimento na saúde e educação, mas nos últimos dias bloquistas, PS e Governo envolveram-se numa disputa verbal sobre uma proposta de taxa para travar a especulação imobiliária.
No domingo, a coordenadora do BE anunciou que propôs ao Governo a criação de uma taxa para travar a especulação imobiliária, medida que disse esperar ver aprovada no orçamento do próximo ano.
“Estamos a negociar tanto o prazo da operação em que se aplica a taxa como o valor da taxa, julgamos que esta é uma medida que vai para a frente”, disse Catarina Martins.
Mas tanto o PS como o primeiro-ministro deram sinais de estar em desacordo com a ideia, como até negaram que esta medida estivesse a ser negociada com o Ministério das Finanças.
Na terça-feira, o primeiro-ministro, António Costa, disse não perceber bem a proposta do BE, que trata “como taxa aquilo que é um imposto”, que repete “o imposto de mais-valias que já existe e que já tributa o que há para tributar”.
Horas antes, o líder parlamentar do PS, Carlos César, tinha garantido que a bancada socialista iria opor-se a esta ideia dos bloquistas.
E na quarta-feira, o líder da bancada bloquista, Pedro Filipe Soares, avisou os socialistas e o Governo que “o jogo político” poderá “intoxicar” as negociações do orçamento, corrigiu o PS dizendo que a proposta havia sido apresentada ao executivo antes das férias de verão, em julho.
Antes ainda desta polémica de “rentrée”, os bloquistas afirmaram-se dispostos, em julho, a tentar encontrar “soluções imaginativas” para o IVA na eletricidade, que pode passar, segundo admitiu o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, por uma modulação da baixa do imposto, a exemplo da taxação escalonada na fatura da água.
No último dia de julho, após uma audiência com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, sobre o próximo orçamento, a coordenadora do partido, Catarina Martins, revelou a existência de avanços na posição do Governo acerca das carreiras dos professores e do IVA da eletricidade.
PCP exige aumentos de salários e pensões e do investimento público
Pelo PCP, o secretário-geral, Jerónimo de Sousa, tem vindo a defender a “continuação da reposição de rendimentos e direitos”, constante dos acordos firmados com o PS na “posição comum”.
O líder comunista sublinhou a necessidade de aumentos de salários e das pensões, além da aposta no investimento público, em especial na saúde, na educação, na cultura.
Numa entrevista à Lusa, ainda em agosto, o líder parlamentar do PCP, João Oliveira, falou das “bandeiras” comunistas para a negociação: o aumento para dez escalões de IRS e que o IVA da eletricidade e gás desça para 6%.
Apesar de admitir que o seu partido não tem “linhas vermelhas”, Jerónimo também tem afirmado esperar que o Governo cumpra o acordado quanto aos professores e à contagem do tempo em que as carreiras estiveram congeladas, dizendo que são compromissos anteriores.
Politicamente, e reagindo a uma frase do secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos, na festa do Avante! – “Diria que não há três sem quatro, e que nós iremos conseguir o quarto [Orçamento], mas há muito trabalho para fazer” – Jerónimo de Sousa recorreu a um aforismo popular para avisar que voto comunista não está garantido à partida.
“Cuidado, que é preciso não contar apressadamente com o ovo no dito cujo da galinha”, disse Jerónimo de Sousa.
Em finais de agosto, o PCP anunciou que vai tentar incluir no OE 2019 livros escolares grátis até ao 12.º ano, cedidos a título definitivo aos alunos.
Segundo o dirigente comunista Jorge Pires, que lembrou as suas iniciativas anteriores pela gratuitidade dos livros nos 1.º e 2.º ciclos da escolaridade, abrangendo cerca de 520 mil alunos (40 milhões de euros), os custos da medida anunciada ascendem a “pouco mais de 100 milhões de euros, um pequeno investimento para o Ministério da Educação”.
O PCP promete tentar “dar continuidade” no próximo ano aos aumentos extraordinários nas pensões verificados em 2017 e 2018, propondo um acréscimo de 10 euros em 01 de janeiro de 2019.
“Os Verdes”. Pré-escolar para todos e contra obsessão com o défice
No final de julho, a líder parlamentar do Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV), Heloísa Apolónia, argumentou que “não orçamentos no papo”, mas admitiu que o partido está “de boa fé” nas negociações.
Após um encontro com Marcelo Rebelo de Sousa, em Belém, apresentou algumas ideias, mais ou menos genéricas, como a defesa do investimento público nos transportes e na ferrovia, a aposta na educação e na cultura, “parente pobre das últimas governações”.
E em agosto, à Lusa, Heloísa Apolónia enumerou as matérias que está a negociar para o Orçamento do Estado, entre elas a garantia do pré-escolar para todas as crianças a partir dos três anos, mais centros de saúde com dentistas e benefícios fiscais para promover a eficiência energética.
E repetiu o alerta de que o “PS muitas vezes constitui um travão” ao progresso, recusando a deputada dos Verdes que a “obsessão com o défice” seja um obstáculo às respostas para os problemas no país.
PAN quer incentivos à compra de veículos elétricos e reduzir o IVA da alimentação de animais
O partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), que elegeu um deputado nas legislativas de 2015, mas não assinou qualquer acordo com o PS em 2015, tem várias propostas para a mesa negocial do orçamento, como o reforço do incentivo à compra de veículos elétricos, reduzir o IVA da alimentação de animais de companhia ou incluir intérpretes de língua gestual portuguesa no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Após a audiência de julho com o Presidente da República, antes das férias de verão, o deputado único do PAN André Silva revelou que o Governo acolheu já uma proposta sua para “não possibilitar ao setor restauração a dedução do IVA na compra de loiça descartável de plástico”.
É uma medida de política fiscal, sublinhou, para “desincentivar o consumo de plástico”, que o partido quer também consumar com a aprovação da lei da tara recuperável da embalagem e de garrafas.
André Silva também promete insistir no fim da isenção de IVA a artistas tauromáquicos, depois de ser chumbado um projeto para a proibição das touradas.
Conversações já começaram
A negociação do orçamento, em termos formais, entre o primeiro-ministro, António Costa, e as lideranças do BE, PCP e PEV, que apoiam o Executivo, começaram em junho, a quatro meses da apresentação do Orçamento, no Parlamento.
As conversações vão fazer-se também em reuniões mais setoriais e intensificarão o ritmo após o período de férias de verão e até à data de ser entregue na Assembleia da República, no máximo até 15 de outubro.
O prazo para a entrega do Orçamento do Estado de 2019 termina a 15 de outubro.
PSD.
Para já há uma “versão Rio” da “taxa Robles”
O PSD, liderado por Rui Rio, anunciou, afirmou, logo em março, que seria “muito difícil” viabilizar o orçamento de um Governo “apoiado pelos partidos da extrema-esquerda” e em final de julho passou a ser “dificílimo”.
Com essa clarificação feita, Rui Rio admite agora avançar com uma iniciativa, na sequência da proposta do Bloco de Esquerda de criar uma taxa para travar a especulação imobiliária, apesar das reações internas negativas à sugestão e do epíteto colocado pelo CDS, “taxa Robles versão Rio”, que “colou”.
Em vez de uma nova taxa, o presidente social-democrata admite propor, no orçamento, que a taxa do IRS sobre mais-valias seja diferenciada em função do número de anos entre a compra e a venda de imóveis.
CDS.
Da ferrovia à saúde e baixar os impostos dos rendimentos prediais
Para o OE 2019, o CDS vai apresentar propostas nas áreas da saúde, educação, ferrovia e segurança para o próximo Orçamento do Estado, segundo afirmou à Lusa o líder parlamentar, Nuno Magalhães.
Depois de entrar na polémica sobre a taxa para travar a especulação imobiliária, proposta pelo BE, que batizou de “taxa Robles”, o CDS vai propor, no debate do orçamento, que baixem os impostos e seja reduzida a tributação para rendimentos prediais, especialmente de arrendamentos de maior duração.
O objetivo é, segundo os centristas, “estimular o mercado de arrendamento”.
Deixe um comentário