//OE2023: Os cinco desafios de Fernando Medina

OE2023: Os cinco desafios de Fernando Medina

Desaceleração do crescimento, inflação elevada, doseamento da política orçamental, política monetária do BCE e investimento são os cinco principais desafios que o ministro das Finanças terá de enfrentar na elaboração do OE2023, apontam os economistas consultados pela Lusa.

Quando entregar na segunda-feira a proposta orçamental do próximo ano, Fernando Medina partirá da expectativa de uma taxa de crescimento para este ano acima do inicialmente esperado e de um défice em linha com a meta, ajudado pelas receitas fiscais, apesar do impacto das medidas de apoio às famílias e empresas.

Contudo, o contexto de crise energética, agravada pela guerra na Ucrânia, com forte impacto na economia mundial, aliada a níveis de inflação elevada, a que se soma uma alta incerteza, deverá pesar no desenho da proposta orçamental do próximo ano.

O cenário coloca desafios à elaboração do Orçamento do Estado para 2023 (OE2023), entre os quais os economistas consultados pela Lusa identificam o abrandamento do crescimento ou mesmo recessão nos principais parceiros comerciais, com consequências para a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) português.

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“Devido ao impacto e dificuldades de abastecimento energético originados pela guerra na Ucrânia, as atuais perspetivas de crescimento da zona euro, nomeadamente da Alemanha, são bastante reduzidas e não excluem a possibilidade de uma recessão. Portugal será necessariamente afetado”, aponta o professor do ISEG António Ascensão Costa.

Também Pedro Bação, professor na Universidade de Coimbra, antecipa que “haverá no mínimo um abrandamento do crescimento económico nos próximos meses”.

“As exportações portuguesas deverão ser afetadas, reforçando o impacto direto e negativo da atual conjuntura internacional sobre a economia portuguesa. Tal significará menos receitas fiscais e mais despesas sociais, novamente com um efeito negativo sobre o saldo orçamental e sobre a evolução da dívida pública”, considera.

Ainda assim, António Ascensão Costa acredita que o país poderá crescer “mais do que a média europeia se a procura turística externa não vier a ser muito afetada numa eventual recessão europeia e se, internamente, for capaz de executar a tempo os investimentos contemplados no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)”.

Outro dos desafios apontados pelos economistas é a inflação elevada.

António Ascensão Costa considera que a subestimação otimista da taxa de inflação, aliada a menores apoios às famílias e políticas de aumentos salariais muito contidas e muito abaixo da inflação, poderá contribuir para limitar, ou fazer cair, o crescimento do consumo privado e vir a ter um impacto negativo sobre crescimento real do PIB em 2023.

“Não se esperando que o consumo privado seja a componente mais dinâmica do potencial crescimento do PIB em 2023, também não é desejável que seja um fator muito penalizador”, assinala.

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É neste sentido que Pedro Bação alerta para o impacto da inflação nos conflitos sociais.

“As maiores pressões virão naturalmente da função pública, que pode recorrer à greve, mas também os reformados terão a atenção do Governo. Aqui a questão não é propriamente o perigo de uma espiral inflacionista, que neste caso ocorreria quando muito ao nível do setor público português e não interessaria ao Banco Central Europeu (BCE) — exceto se o mesmo acontecesse de forma generalizada na área do euro –, mas sim os efeitos permanentes sobre o nível da despesa pública, que terão consequências para o saldo orçamental e para a evolução da dívida pública”, refere.

A este desafio alia-se, assim, outro: dosear a política orçamental, aponta Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade.

“O próximo orçamento terá que ponderar o equilíbrio a encontrar entre vários objetivos em conflito potencial”, como ajudar as famílias e empresas em posição mais frágil perante a inflação e a subida do preço dos combustíveis, mas sem gerar um estímulo económico que faça subir a inflação, ou atrase a sua descida”, ao mesmo tempo que “fazer face às necessidades estruturais salientadas pela guerra, de autossuficiência energética, bem como as necessidades estruturais dos últimos vinte anos, em especial do fraco crescimento económico”, e “aproveitar a folga orçamental de 2022 para lidar com a inflação elevada e a subida das taxas de juro”.

Assim, considera ser importante que, em termos acumulados de 2022 e 2023, a atualização dos escalões do IRS seja em linha com a inflação acumulada, para atingir a “neutralidade”, ainda que assinale que estreitar o leque salarial na Administração Pública “vai agravar um problema estrutural: salários acima do mercado nas funções menos qualificadas e abaixo do mercado nas funções mais exigentes”.

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O impacto da política monetária no financiamento para Portugal é também identificado pelos economistas.

“O impacto sobre os juros da dívida pública poderá ser menos problemático se o BCE não exagerar na subida dos juros como tentativa de controlar mais rapidamente a inflação. Poderão surgir problemas se o BCE subir os juros demasiado depressa e/ou se o crescimento dos juros da dívida pública portuguesa vier a ser contagiado por subidas noutros países endividados e com poucas perspetivas de crescimento ou de controlo dos respetivos défices públicos”, identifica António Ascensão Costa, ainda que acredite que o banco central deverá ser “relativamente prudente”.

Pedro Braz Teixeira antecipa que a rubrica com juros irá subir no OE2023, mas destaca que irá ser mais fácil reduzir o rácio da dívida do que quando a inflação era muito baixa.

“Neste momento, há a expectativa de que o BCE suba as taxas de referência até entre 3% a 3,5% em meados de 2023, um valor claramente abaixo de todas as expectativas de inflação, quer para a zona euro quer para Portugal. Ou seja, a taxa de juro real será claramente negativa no próximo ano, pelo que a dificuldade aparente da subida das taxas de juro nominal será menos grave do que parece à primeira vista”, sublinha.

O investimento em segurança é ainda identificado por Pedro Bação como um dos desafios, assinalando que “a situação atual representa uma crise de segurança, tendo aqui a palavra “segurança” um sentido lato”.

“É, portanto, natural que haja uma tendência para o aumento da despesa em “segurança”, compreendendo não apenas a despesa na área da defesa (militar), mas também da segurança interna, da cibersegurança e também da segurança energética”, remata.

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