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As taxas de juro Euribor só vão aliviar a sério em 2026 e daí em diante, assume o Ministério das Finanças (MF) na proposta de Orçamento do Estado para 2024 (OE 2024), entregue ao Parlamento e apresentada esta semana.
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A lentidão esperada nos encargos relacionados com os empréstimos é, em boa parte, explicada por uma pausa relativamente longa na descida dos indexantes no segundo semestre de 2025, por exemplo. Nesses seis meses, as taxas vão como que congelar acima dos 3% quando hoje estão na vizinhança dos 4%.
Segundo mostram as hipóteses basilares do novo OE, os mutuários portugueses (os endividados junto do banco) podem contar com um primeiro e muito ligeiro alívio a partir de meados do próximo ano (admitindo que a economia arrefece a sério e a inflação se mantém numa rota descendente), mas essa redução será mesmo paulatina e no final de 2025, admite o governo, as referidas taxas só terão descido o equivalente a 1%.
A nova proposta orçamental do governo de maioria absoluta PS indica que as Euribor, hoje na casa dos 4% (até acima disso, nos 4,2%, no caso da mais usada, a Euribor a 12 meses), devem descer de forma tímida e só a partir de meados do próximo ano. No fim de 2025, essas taxas de referência usadas pelos bancos ainda devem estar acima dos 3%, como referido.
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Só para se ter uma noção de velocidade, recorde-se que em apenas um ano e meio, a taxa a um ano (Euribor a 12 meses) saltou de valores negativos, e depois próximos de 0% até junho de 2022 para os atuais 4,2%.
De acordo com os mercados de futuros usados no modelo do Ministério liderado por Fernando Medina, a descida projetada de apenas 1% (para o tal patamar de 3% ou próximo disso) pode, portanto, demorar dois anos e três meses ou mais, contando a partir deste momento.
Ou seja, vai levar o dobro do tempo para descer uma quarta parte daquilo que subiu, um aperto sem paralelo desde que a Zona Euro foi fundada.
O mesmo se pode dizer sobre a inflação, que disparou para níveis nunca vistos desde o começo dos anos 90 do século passado, pelo menos, e que conduziu à subida de juros muito agressiva por parte do Banco Central Europeu (BCE) a partir de julho do ano passado.
Como referido, os mercados interbancários onde estas taxas de juro são formadas estão a apostar tudo num começo do ciclo de alívio dos juros, em meados do próximo ano, ainda que vagaroso.
E há um problema que explica, em parte, a lentidão das descidas esperadas daí em diante. Segundo o OE 2024, as taxas de juro devem ser mantidas com um nível de aperto tal que garanta a descida consistente e paulatina da inflação para os 2% (é o que exige o mandato do BCE).
A inflação tem dado sinais de abrandamento (na Zona Euro caiu para 4,3% em setembro), mas há vários fatores que ainda podem ou vão servir de combustível para um regresso do aumento de alguns preços doravante.
Veja-se o caso da energia (o barril de petróleo Brent) cujo preço voltou a disparar após o ataque do grupo Hamas a Israel, no sábado da semana passada.
Mais agressões e retaliações destas, e o petróleo pode facilmente voltar a vencer máximos como depois de a Rússia invadir a Ucrânia em fevereiro de 2022. E mais inflação tem um custo do ponto de vista dos juros: o dinheiro emprestado fica muito mais caro ou as taxas de juro tendem a demorar mais a regressar a níveis comportáveis.
Até lá, o governo admite o que diz o BCE: neste momento, ainda devemos esperar que a subida de taxas de juro já decretadas (a última mexida foi em setembro) causem efeitos ao retardador na economia, a vários níveis. Uns maus, outros bons.
O efeito geral é de arrefecimento. Espera-se que não seja acentuado e que não congele o crescimento e o emprego. O histórico das subidas de juros do passado mostra que a probabilidade de gelar demais é elevada.
No caso da atividade, o efeito é recessivo (tende a deprimir o consumo, o investimento e até o comércio internacional, mais o emprego associado).
No caso da inflação, o efeito é negativo, o que pode ser entendido como uma coisa boa já que ajuda a repor o poder de compra.
“Apesar da elevada incerteza que rodeia o ritmo de transmissão da política monetária, o BCE estima um hiato [intervalo] de cerca de um ano entre os aumentos das taxas de juro diretoras e o momento em que o seu impacto na atividade económica atinge o pico. No caso da transmissão à taxa de inflação, o hiato é de cerca de dois anos.”
Resumindo: sem mais subidas de taxas, as que já foram decretadas ainda se vão estar a sentir nas atividades, nos negócios e no emprego daqui a um ano. O efeito máximo sobre a inflação (redução) deve demorar o dobro disso.
Ora, no novo OE, o ministério de Fernando Medina constata que “no último ano, e depois de um longo período de baixas taxas de juro, os bancos centrais levaram a cabo um rápido aumento das taxas de juro diretoras para conter a subida da inflação”.
“Desde o início do processo de normalização da política monetária, em julho do ano passado, e até ao início de agosto deste ano, o Banco Central Europeu (BCE) subiu as taxas de juro em 450 pontos base [4,5 pontos percentuais], naquele que foi o ciclo de subida das taxas de juro mais rápido da História da Zona Euro”, ilustram as Finanças.
O ministério refere ainda que “a taxa Euribor a 12 meses, que atualmente é a mais utilizada em Portugal nos créditos à habitação com taxa variável, situou-se, no final de setembro de 2023, em 4,22%, valor máximo desde novembro de 2008”.
E que “nos prazos de seis e de três meses, a taxa Euribor situou-se, no final de setembro, em 4,125% e em 3,955%, respetivamente. Apenas um ano antes, as taxas Euribor estavam em 2,556% para o prazo de 12 meses, 1,809% no prazo a seis meses e 1,173% a três meses”.
No entanto, no final de setembro, “as expectativas futuras nos mercados financeiros apontavam para uma estabilização das taxas de referência em valores semelhantes aos de abril de 2023, nos 3,6% em 2024 e em torno de 3,1% em 2025”.
O fardo dos próximos anos
Ainda que a tendência seja, como se vê, de moderação nas taxas, o que está para trás implica um fardo enorme para muitas famílias no futuro próximo.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), “em agosto de 2023, a taxa de juro implícita no conjunto dos contratos de crédito à habitação foi de 4,1%, sendo necessário recuar até março de 2009 para encontrar uma taxa tão elevada (4,76%)”.
O MF observa que “para os contratos celebrados entre maio e julho, a taxa de juro implícita situou-se, em agosto, em 4,331%, um aumento de 2,8 pontos percentuais quando comparado com o ano anterior”, registando assim “o valor mais elevado desde abril de 2012”.
Resultado: “a elevada proporção de crédito à habitação com taxa variável leva a que, com a subida das taxas de juro, a prestação média mensal tenha registado um aumento de 111 euros (41,4%), para 379 euros, quando comparada com agosto de 2022, quando a prestação média era de 268 euros”, diz o ministério.
E olhando apenas para os contratos celebrados entre maio e julho de 2023, “o valor médio da prestação fixou-se, em agosto, nos 623 euros, totalizando uma subida de 40% no último ano”.
Apoios e amortecedores
Claro que perante este cenário, insustentável até para muitas famílias e num quadro de excedentes orçamentais históricos já este ano e no próximo, o governo resolveu avançar desde final de 2022 com “medidas de apoio ao crédito à habitação”. Em 2024, haverá prolongamento de algumas.
“Em novembro de 2022, foi aprovado o Decreto-Lei nº 80-A/2022 que instituiu um reforço dos controlos preventivos dos bancos para antecipar o risco de incumprimento”, um diploma que determinou também “a suspensão temporária da cobrança da comissão de reembolso antecipado para créditos à habitação a taxa variável”.
“A suspensão, que inicialmente vigorava até ao final de 2023, foi estendida até ao final de 2024.”
“Desde outubro de 2022, e até julho de 2023, foram amortizados mais de 6 mil milhões de euros de crédito à habitação, e foram renegociados cerca de 4,5 mil milhões de euros. Estes montantes representam aumentos muito significativos relativamente ao passado – se tomarmos o mês de julho como exemplo, em 2023, o valor das renegociações quintuplicou quando comparado com 2022 e o das amortizações aumentou mais de 60%”, dizem as Finanças.
Além disto, em março de 2023, o Decreto-Lei nº 20-B/2023 estabeleceu uma bonificação temporária de juros.
Aprovada em setembro de 2023, a dita bonificação para mutuários com rendimentos até ao limite do 6º escalão do IRS, podem ter um apoio máximo total de 800 euros a menos nos juros, por contrato. O governo diz que nesse cenário máximo, a diminuição pode chegar a “mais de 66 euros na prestação mensal do crédito à habitação”.
O Governo aprovou ainda, em setembro de 2023, “uma medida que permite reduzir a prestação paga pelos mutuários de crédito à habitação e estabilizá-la pelo prazo de dois anos”. Não paga agora, mas paga depois na mesma. A ideia é que daqui a dois anos o cenário possa estar mais desanuviado.
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