O orçamento para a construção de uma moradia básica – três quartos, duas casas de banho, rasteira -, até dezembro do ano passado, era um; a falta de mão-de-obra podia complicar o calendário de execução, mas o montante seguia, mais ou menos, a média dos anos anteriores. Tudo mudou, porém, desde o início de 2021. O aumento dos preços das matérias-primas, devido à pandemia, desatualizou quase todos os orçamentos, deixando empresas do setor da construção civil asfixiadas.
Porquê? Bem, os valores orçamentados no início do ano não chegam agora para cobrir as despesas. E, em muitos casos, não há margem para renegociar.
“Começa a ser complicado. Ou a gente tem que parar as obras ou começa a perder muito dinheiro porque há coisas que aumentaram 50%”, conta Armando Magalhães, gestor da empresa de construção civil STARCASA, à Renascença. “Com as margens que a gente costuma trabalhar, no mínimo dá aí 30 ou 35% de prejuízo”, acrescenta.
Apesar de a China já ter anunciado que ia “desbloquear” o fornecimento na semana passada, para combater a inflação, o setor a construção não sente ainda mudanças. Armando já sente o mercado a mudar. “Já há pessoas que recorrem a nós porque há empresas que abandonaram as obras, empresas que pedem adjudicações altas e deixam a obra ao meio, o dinheiro acaba e não terminam as obras, abandonam as obras”, revela.
A conjuntura “é péssima” e muitos clientes parecem estar agora a acordar para um pesadelo a fazer lembrar a crise do subprime (2007 e 2008). “A maior parte das pessoas fazem empréstimos a contar com um determinado valor e agora não conseguem mais. Muita gente não vai conseguir. Vai ficar outra vez muita coisa no mercado como foi em 2008 e 2009”, aponta Armando Magalhães.
Para as empresas de construção, a situação também tem vários espinhos. “Ou a gente acaba a obra e perde dinheiro, e vamos segurando o pessoal a trabalhar, ou então temos que começar a mandar pessoal para casa e não acabar as obras”, diz o gestor da STARCASA. De forma a evitar o pior cenário, Armando assume que, para já, com alguns clientes mais pequenos, “terá que se assumir o prejuízo”. “Não há volta a dar”, frisa.
Martinho Silva, gestor da Siltipom – Construções, Lda, atesta o cenário traçado por Armando: há prejuízos no horizonte. “Vou começar a sentir nas obras que tenho agora a seguir. Nas anteriores, foi sendo diluído. O orçamento teve capacidade de diluir esse aumento de preços e não foi imputado ao dono de obra”, diz.
Por causa de uma obra “ajustada” em setembro do ano passado, Martinho já teve que conversar com o proprietário. “Foi falado com o dono de obra que eventualmente teriam que ser revistos alguns preços, porque os preços estavam a subir.” Martinho teve “sorte” de o cliente estar a par das flutuações do mercado.
A margem de lucro “tem de ser muito boa” para “se conseguir chegar ao fim e ainda sobrar alguma coisa”, avisa.
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