//Passsaporte imunitário para doentes de Covid-19 é “contraproducente”

Passsaporte imunitário para doentes de Covid-19 é “contraproducente”

Hoje em dia posso afirmar que qualquer moeda que esteja no seu bolso tem menos possibilidade de conter uma bactéria ou um vírus, do que o seu telemóvel ou um cartão Multibanco que tenha acabado de usar.

As moedas são seguras, como ainda recentemente foi referido por um banco alemão. Uma moeda aloja uma bactéria ou um vírus menos tempo do que outros materiais que usamos com mais frequência.

Já que entrámos neste campo, gostaria de saber se poderemos, a curto prazo, ter novos tipos de moedas, em que os artistas estejam já a trabalhar.

Não, que eu saiba, não. A moeda está estável e só tenho estimativa de produção de moedas com o atual “design” . E estamos a fazer cunhagem de moedas neste momento. Elas são renovadas de tempos a tempos.

As moedas têm uma vida muito longa, ao contrário da nota, mas circulam por toda a Europa e os países têm que manter um “stock” de moedas. Nós não somos responsáveis pelas decisões; somos uma fábrica, obedecemos às estimativas e à procura gerida pelo Banco de Portugal e o Banco Central Europeu.

Mas gostava ainda de lhe dizer algo sobre as questões de inovação, que me parece muito relevante. Pensamos muitas vezes – académicos, políticos e empresários – que não há uma suficiente ligação entre a academia e as empresas, apesar de haver uma boa investigação em Portugal e boas universidades; a investigação livre a aberta parece nunca se concretizar para ajudar as empresas.

O que fizemos na INCM foi mostrar que isso era perfeitamente possível, que deve ser o normal. Temos várias regras quando financiamos projetos das universidades.

Deixamos sempre a propriedade intelectual nas universidades para que seja possível, uma dia mais tarde, os próprios investigadores criarem uma “startup”, descobrirem outro uso que não estávamos a ver inicialmente para aquela matéria investigada.

O financiamento destes projetos permite aos doutorados continuar a trabalhar na universidade em vez de, por exemplo, irem para o estrangeiro, o que significa que os cérebros continuam a produzir conhecimento em Portugal. Não temos petróleo, mas temos grandes cérebros que nos têm permitido conseguir invenções extraordinárias .

E temos um prémio, que é o maior em Portugal nesta área e que rivaliza com qualquer prémio europeu, que é de um milhão de euros para a inovação, recompensando ideias inovadoras para os produtos e serviços que a INCM presta já hoje ou pode vir a prestar no futuro, que tenham a ver com a sua cultura, com o seu DNA.

Isto é um exemplo extraordinário de aproximação às universidades, transformando a investigação livre em investigação aplicada. Se nenhuma empresa consegue perceber o que está a ser feito nas universidades, há que criar mecanismos para as universidades se aproximarem das empresas e com isso transformar a investigação livre em investigação aplicada e o exemplo da INCM é exemplar na aproximação entre academia e empresas.

De todos estes projetos em que a INCM está envolvida, há algum que lhe mereça especial atenção?

O projeto “Unicode”, o tal selo não copiável é muito relevante. Mas temos um outro projeto, pouco visível para quem não está dentro da INCM, que é um projeto de ” robótica 4.0″; trata-se de ” robots” com inteligência artificial, que decidem o que vão fazer, observando os humanos e as máquinas, e poderem ajudar em todo o processo de logística dentro da fábrica.

E destacaria ainda o projeto “papel secreto”, liderado pela professora Elvira Fortunato, que visa construir capacidade de processamento utilizando apenas a energia do próprio papel, o que é absolutamente revolucionário.

É um projeto a mais longo prazo e se chegar a bom porto, sendo passível de ser industrializado, significa, por exemplo, que um pacote de leite possa mudar a cor do papel se o conteúdo estiver estragado. É a capacidade de ter sensores no papel para recolher a informação e dar um sinal ao consumidor de aquele produto já não está bom .

Outra aplicação poderá ser no papel de parede, com capacidade para medir a temperatura de um compartimento e a fazer alguma coisa com esses dados. Acho que é um projeto extraordinário.

Com o surgimento do novo coronavírus, tem-se falado muito no passaporte imunitário, para se perceber se somos imunes a determinadas doenças, ou mesmo se, em deslocações ao estrangeiro, somos turistas seguros do ponto de vista sanitário. Tudo isto mexe com a privacidade de cada um de nós. Vamos chegar ao dia em que o passaporte imunitário fará parte do passaporte eletrónico?

Antes de irmos à questão dos dados pessoais, devo dizer que tenho sempre muito receio deste tipo de medidas que por vezes são até contraproducentes. O ser humano é avesso ao risco e vai sentir-se muito confortável por ter em seu poder algo que diga que não está contaminado.

A verdade é que pode estar contaminado já depois de ter esse documento, seja ele uma “app” num telemóvel ou o que for. Portanto, vai ter um comportamento como se estivesse tudo bem, com menos cuidados.

Temos de olhar para essas medidas e perceber se elas não vão ser contraproducentes para o efeito do comportamento que todos nós temos. Acho que talvez não seja a melhor forma de abordar a questão.

E para além disso há a questão dos dados pessoais.

Que é ainda mais relevante. Sabemos e temos dados sobre o que está a ser feito relativamente às aplicações nos telemóveis, que permitem de uma forma confidencial saber se eu me cruzei com determinadas pessoas.

Isso está a ser discutido em Portugal, em toda a Europa e alguns países asiáticos tornaram disponíveis essas aplicações. Não vou falar de países que conseguem tornar isto obrigatório e forçar a que seja utilizado. Mas nalguns países ocidentais, ou mesmo no caso de Singapura, a percentagem de pessoas que instalou esse tipo de aplicações é muito baixa, o que tira eficácia à própria aplicação.

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