O Conselho das Finanças Públicas (CFP) estima uma queda do Produto Interno Bruto (PIB) entre 7,5% e 11,8% este ano devido à pandemia Covid-19 e o início da recuperação em 2021, segundo perspetivas macroeconómicas publicadas esta quarta-feira.
No relatório “Perspetivas Económicas e Orçamentais 2020-2022”, o CFP sublinha que devido à “elevada incerteza e riscos inerentes” no atual contexto de pandemia, o organismo optou por apresentar dois cenários macroeconómicos, um cenário base e um cenário severo, tendo em conta o impacto das medidas de confinamento e de política económica e orçamental.
“O cenário base antecipa uma contração do produto em 2020 de 7,5% enquanto no cenário severo a redução é de 11,8%”, pode ler-se no relatório do organismo que fiscaliza as regras orçamentais e as finanças públicas.
Segundo o CFP, “a redução do PIB em 2020 reflete, por um lado, a diminuição significativa da procura externa dirigida a Portugal com impacto nas exportações totais, em particular nas exportações de serviços, por via da quebra da procura dirigida ao setor do turismo e atividades associadas”.
Por outro lado, continua o organismo, “reflete o adiamento de investimento e de consumo por parte dos agentes económicos num cenário de elevada incerteza”.
Ambos os cenários concentram o efeito do confinamento no segundo trimestre de 2020 e diferem na magnitude dos choques na procura global e externa, no ritmo de normalização da atividade económica, interna e externa, durante o segundo semestre de 2020 e na duração das medidas de política, explica o CFP.
Quanto à retoma do crescimento da economia em 2021, o organismo presidido por Nazaré Costa Cabral estima um aumento do PIB de 3% no cenário base e de 4,7% no cenário severo e de 2,6% e 3,2% em 2022, respetivamente.
A retoma do crescimento em 2021 e 2022 “é alicerçada na expectativa de que o choque na economia é transitório, sendo, contudo, os riscos descendentes subjacentes a este cenário muito elevados”, considera o organismo.
“O choque comum e generalizado a nível global intensifica os riscos descendentes para Portugal como uma pequena economia aberta” e “em qualquer dos dois cenários considerados a retoma esperada da economia não será suficiente para que se recupere o nível do PIB pré-pandemia neste horizonte temporal”, acrescenta o CFP.
Sobre o mercado de trabalho, o organismo projeta, no cenário base, uma contração do emprego de 5% e um aumento da taxa de desemprego para 11% da população ativa em 2020.
Na recuperação em 2021 e 2022, o CFP antecipa o crescimento do emprego para 2,2% e 1% e uma diminuição da taxa de desemprego para 9% e 8,1%, respetivamente.
Já no cenário severo, o organismo estima que “a recessão em 2020 poderá levar a uma contração do emprego de 7,2% e a um aumento da taxa de desemprego para 13,1%”.
“A posterior recuperação do emprego neste cenário é mais lenta, refletindo uma maior rigidez do mercado de trabalho: em 2021 e 2022 o emprego deve aumentar 2,6% e 1,5%; e a taxa de desemprego deve diminuir para 10,8% e 9,5% da população ativa, respetivamente”, acrescenta o CFP.
O cenário macroeconómico do CFP prevê ainda uma taxa de variação do Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) em torno de -0,2% em 2020, antecipando-se o crescimento de 0,7% dos preços em 2021 e 1,1% em 2022.
Défice orçamental entre 6,5% e 9,3% do PIB este ano
Quanto ao défice deverá ficar entre 6,5% e 9,3% do PIB este ano e o saldo manter-se-á negativo em 2021 e 2022.
Depois do excedente alcançado em 2019, de 0,2% do PIB, o organismo liderado por Nazaré Costa Cabral antecipa para 2020 “uma deterioração significativa do saldo das administrações públicas, que no cenário base deverá atingir um défice de 6,5% do PIB e no cenário severo 9,3% do PIB”.
A diferença entre os dois cenários é justificada pelo quadro macroeconómico diferenciado e pela estimativa de impacto anual para as medidas de resposta à Covid-19, cujo período de vigência não é o mesmo nas duas projeções, explica o CFP.
O organismo sublinha que o desequilíbrio orçamental “reduz-se a partir de 2021, embora não o suficiente para evitar um défice orçamental”, estimando o CFP um saldo negativo entre 3,3% e 4,7% em 2021 e entre 3,1% e 4,2% em 2022.
“O regresso à situação de desequilíbrio orçamental em 2020 reflete, além da ação dos estabilizadores automáticos, o impacto orçamental estimado pelo CFP para as medidas excecionais de resposta à pandemia”, sublinha o organismo.
O CFP projeta que estes dois fatores sejam responsáveis em 2020 “por mais de três quartos da deterioração do saldo orçamental no cenário base e por mais de quatro quintos no caso do cenário severo”.
Em ambos os cenários, adianta o conselho, “a ação dos estabilizadores automáticos explica mais de metade do agravamento do saldo projetado para este ano”, um desequilíbrio que permanecerá até 2022, com uma trajetória de redução do défice nos dois cenários.
De acordo com o relatório, o saldo primário, que exclui os encargos com juros, iniciará em 2021 uma trajetória de recuperação.
“A evolução no cenário base aponta para um saldo primário equilibrado em 2021 e para um excedente primário em 2022, contrariamente à situação de défice primário que se projeta permanecer até 2022 no cenário severo”, pode ler-se no documento.
Em ambos os cenários, o organismo prevê um aumento significativo do peso da despesa pública no PIB, “cuja dinâmica é determinante para a evolução do saldo orçamental no período de 2020 a 2022”.
“Só em 2020, o rácio da despesa pública deverá aumentar cerca de 6,2 p.p. [pontos percentuais] do PIB no cenário base e 9,3 p.p. do PIB no cenário severo”, continua o CFP, que antecipa uma redução do peso da despesa no PIB a partir de 2021 devido à “eliminação progressiva das medidas de combate à covid-19 e da retoma da atividade económica”.
“No entanto, não se espera neste horizonte temporal um regresso da despesa ao nível pré-covid: entre 2019 e 2022, o cenário base projeta um aumento do peso da despesa pública em 2,7 p.p. do PIB e o cenário severo um acréscimo de 4,1 p.p. do PIB”, indica o conselho.
Em contraste, a receita “deverá reduzir o seu peso no PIB refletindo a acentuada contração da atividade económica em Portugal”.
No cenário base, o CFP prevê uma redução da receita de 0,5 p.p. do PIB entre 2019 e 2022, concentrada em 2020.
Já no cenário severo, a diminuição da receita deverá situar-se nos 0,3 p.p. entre 2019 e 2022 e, a partir de 2021, em ambos os cenários, é projetado o retorno do crescimento em termos absolutos da receita.
Medidas de apoio custam mais de três mil milhões de euros
As medidas criadas pelo Governo para responder à crise causada pela pandemia covid-19 terão um impacto orçamental este ano entre 3.012 e 4.564 milhões de euros.
Seguindo a lógica de dois cenários, o relatório refere que “os pressupostos subjacentes a cada cenário resultam, para o corrente ano, num impacto orçamental estimado de 3.012 milhões de euros (1,5% do PIB) no caso do cenário base, e de 4.564 milhões de euros (2,4% do respetivo PIB) no cenário severo”, pode ler-se no documento onde é estimado um défice orçamental entre 6,5% e 9,3% do PIB este ano.
Em ambos os cenários, “o maior impacto orçamental das medidas é determinado pelas áreas económicas e de saúde, onde se concentra a incidência das medidas de ‘lay-off’ simplificado e de saúde pública”, explica o organismo liderado por Nazaré Costa Cabral.
O CFP refere que a estimativa anual do impacto orçamental das medidas Covid-19 não inclui os eventuais efeitos no saldo que possam decorrer das “medidas de liquidez” previstas para apoio às empresas, famílias e outras entidades, estimadas pelo Ministério das Finanças (MF) em cerca de 25 mil milhões de euros.
“Este valor corresponde, segundo o MF, a 11,8% do PIB de 2019, o equivalente a 12,6% do PIB de 2020 no cenário base ou 13,2% do PIB de 2020 no cenário adverso projetados pelo CFP”, indica o organismo.
Destas medidas não incluídas, o CFP destaca a flexibilização do pagamento das obrigações fiscais e contributivas, as moratórias no crédito à habitação e no crédito a empresas, seguros de crédito à exportação com garantias do Estado e linhas de crédito igualmente garantidas pelo Estado, incluindo linhas para financiamento de tesouraria e investimentos de longo prazo.
“Importa assinalar a possibilidade de estes apoios poderem vir a constituir um risco orçamental, em particular nos casos em que se verifique o incumprimento das obrigações pelos seus beneficiários (empresas e famílias)”, realça.
Segundo acrescenta o CFP, a acontecer esse incumprimento, tal “implicaria uma assunção dessas responsabilidades por parte do Estado, com consequente impacto negativo no saldo e na dívida das administrações públicas”.
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