//Pinhal ataca Sócrates e Constâncio. “Maledicência”, diz ex-primeiro-ministro

Pinhal ataca Sócrates e Constâncio. “Maledicência”, diz ex-primeiro-ministro

José Berardo garantiu que Filipe Pinhal, antigo administrador do BCP, o encaminhou para a Caixa Geral de Depósitos para obter crédito para a compra de ações. Mas o antigo responsável do BCP negou que tenha tido essa influência e que não tinha nenhum interesse em ajudar Berardo a reforçar a posição no banco privado.

Pinhal considera que o empresário madeirense foi influenciado por Sócrates para reforçar a posição no BCP de forma a operacionalizar um assalto ao poder no maior banco privado português. E garante que pediu a Berardo para “deixar o BCP em paz”. Até porque, argumentou, nessa data Berardo queria destituí-lo. “Seria improvável que o ajudasse a ter mais votos para me destituir”, disse esta terça-feira numa audição na comissão de inquérito à CGD.

Filipe Pinhal, que liderou o BCP entre o verão e final de 2007, disse que queria evitar uma guerra entre acionistas. Garantiu que sugeriu a Berardo, em maio de 2007, que este se desfizesse da participação no BCP e que encaixasse uma mais-valia que estimava que ultrapassaria os 100 milhões de euros.

Em vez disso, Berardo obteve 350 milhões da CGD para reforçar no BCP e passar de uma posição de 3% para mais de 7% no final de 2007, operação que teve o aval do Banco de Portugal, liderado na altura por Vítor Constâncio. Filipe Pinhal revelou que Berardo chegou a desabafar, em relação aos investimentos no BCP, que ainda estava “para saber como é que aquele homem me enfeitiçou e me deu a volta. Eu que toda a vida que fui objetivo como é que me meti nesta de ir comprar financiado desta maneira?”.

O “homem que enfeitiçava” e a “velhaca maledicência”

Admitindo que não tinha forma de provar quem era o homem que enfeitiçou Berardo, Pinhal disse que na sua interpretação apenas podia ser Paulo Teixeira Pinto, que liderou o BCP entre 2005 e o verão de 2007, ou o antigo primeiro-ministro, José Sócrates. Filipe Pinhal sugeriu que a palavra do antigo líder do BCP, Paulo Teixeira Pinto, “pesaria pouco para Berardo”. Já as de Sócrates poderiam ter mais peso, até porque existia “o negócio de contrapartida, o favorecimento para se guardar a coleção com despesas por conta do Estado”. E garante que o poder de Berardo convinha muito a “quem queria controlar o BCP”.

Filipe Pinhal, que entrou no BCP logo no início do banco e que sempre apoiou o fundador Jardim Gonçalves, defendeu que houve um assalto ao poder na instituição. “Houve uma teia urdida em vários pontos que teve um diretório claro constituído por José Sócrates, Teixeira dos Santos e Vítor Constâncio e teve vários operacionais”, como o grupo Ongoing. Filipe Pinhal acredita, apesar de não ter forma de o provar, de que a interferência política se iniciou com um pedido de Paulo Teixeira Pinto a Sócrates para afastar Jardim Gonçalves do banco.

“A partir do momento em que Paulo Teixeira Pinto terá aparecido no gabinete de Sócrates a dizer que precisava de apoio a nível político para afastar a equipa que lá estava desde 1985, Sócrates terá pensado que existia uma oportunidade de ouro para ter uma equipa de gestão mais favorável aos interesses do primeiro-ministro, pelo menos”, afirmou.

Após a audição, o antigo primeiro-ministro desmentiu Filipe Pinhal. Numa nota citada pela Lusa, José Sócrates acusou o ex-presidente do BCP de “pura e velhaca maledicência”. Afirmou que “nunca discuti, conversei ou orientei o senhor José Berardo em qualquer investimento. Nunca tive sequer conhecimento, fosse por quem fosse, da sua intenção de reforçar a sua posição acionista no Banco Comercial Português”.

As denúncias de Berardo e o ataque a Vítor Constâncio

Filipe Pinhal acusou o antigo vice-governador do Banco de Portugal, Vítor Constâncio, de ter aberto o caminho para que Carlos Santos Ferreira e Armando Vara fossem diretamente da liderança da Caixa Geral de Depósitos para o BCP. E considera que a sua saída do banco privado, onde estava desde 1985, aconteceu também por ter recusado créditos a Berardo.

“Recusámos empréstimos a Berardo e a seguir Vítor Constâncio correu comigo”, disse Pinhal. Explicou que o então governador do Banco de Portugal – que será ouvido novamente no parlamento no dia 18 de junho – o pressionou a sair das listas que iriam disputar a liderança da instituição devido ao caso das offshores e de manipulação de mercado, que surgiu na sequência de denúncias de Berardo.

Na versão do antigo responsável do BCP, Vítor Constâncio pressionou-o a desistir da liderança do BCP depois de Berardo ter feito denúncias sobre o recurso a offshores nos aumento de capital do banco privado. O então governador do Banco de Portugal terá alertado Pinhal para as implicações negativas que poderia ter para o BCP se ele viesse a ser inibido de exercer funções na banca. O gestor e outros antigos administradores do banco foram acusados pelo BdP e pela CMVM de utilização irregular de offshores, manipulação de mercado e prestação de informação falsa. Foi ainda alvo de processos-crime.

Filipe Pinhal acusou Vítor Constâncio de ter extravasado “grosseiramente e ilicitamente as funções de supervisão”. E desafiou os deputados a pedirem as atas dessa reunião e do encontro no dia seguinte com alguns acionistas de referência do BCP em que foi discutido o futuro do banco. O antigo gestor do BCP considera inédito que num encontro dessa natureza tenham estado presentes líderes de dois dos bancos concorrentes: Fernando Ulrich do BPI e Carlos Santos Ferreira, que apesar de ser na altura presidente da CGD foi o escolhido para liderar o BCP.

O todo-poderoso Berardo

Filipe Pinhal interpreta que a escolha de Santos Ferreira e de Armando Vara foram motivadas por serem mais dóceis para com os grandes devedores do BCP. Refere que na CGD, o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, continuava a ter influência devido à permanência de Francisco Bandeira. “Há quem diga, e não excluo, que eles [Santos Ferreira e Armando Vara] foram lá colocados [no BCP] para reestruturar créditos que não tinham cura. Há quem diga que a motivação de Berardo e Fino era colocar pessoas mais dóceis”.

O ex-responsável do BCP sugeriu aos deputados que pedissem informação sobre as reestruturações das dívidas de Berardo feitas por Carlos Santos Ferreira e Armando Vara em 2009. “Não tenho cópia, só sei por ouvir dizer. Mas ao que parece é uma reestruturação que permitiu a Berardo respirar alegremente sem amortizar capital e juros até à reestruturação de 2011”, disse. E questionou “como é que Carlos Santos Ferreira e Armando Vara, que foram colocados por Berardo, iriam reestruturar a dívida da Fundação e da Metalgest?”.

Filipe Pinhal considera mesmo que “de 2008 a 2012 o presidente do BCP foi o senhor Berardo”. Explicou a sua tese referindo que o empresário “foi eleito em maio de 2008 para presidente da comissão de remuneração” do banco. Acrescentou que nesse órgão “fazia parte como vogal Luís Champalimaud que era presidente do Conselho Geral e de Supervisão”. Recordou ainda que Carlos Santos Ferreira, que saiu diretamente da CGD para o BCP no início de 2008 “tinha sido empregado de Champalimaud na Mundial Confiança”. E conclui que “olhando para o perfil deles, não tenho nenhuma dúvida que Berardo falava grosso a Champalimaud e dizia a Carlos Santos Ferreira o que ele quer é isto”.

Já do lado da CGD também não havia oposição a Berardo, segundo Filipe Pinhal. Sabiam “a metralha que Berardo podia fazer no jornal das 9. Metralhava sobre quem quisesse”, diz o antigo responsável do BCP. Filipe Pinhal conclui que esse poder de Berardo, “convinha muito a quem queria controlar o BCP, não tenho dúvida”. E sugere que era Sócrates que influenciava o empresário madeirense. “Que Berardo era devedor de Sócrates por causa da coleção, não tenho dúvida nenhuma. O resto são deduções”, conclui.

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