Lisboa e Pequim vão sentar-se esta segunda-feira à mesa naquele que é o momento mais baixo do PIB chinês desde 2009, e um de fortes tensões comerciais com os EUA. A economia desacelerou para 6,5% no terceiro trimestre, abaixo das previsões oficiais. O investimento mantém-se a travar, crescendo apenas 5,4% até setembro, e as importações desaceleraram em setembro com uma subida de apenas 14,3%.
As vendas à China deverão ser um dos temas na agenda – não pública – do encontro que reúne, na capital chinesa, as equipas do Ministério dos Negócios Estrangeiros português e do Ministério do Comércio chinês. Portugal participa no próximo mês na Feira Internacional de Importações de Xangai. Será o primeiro evento dedicado às compras ao exterior. Foi prometido pelo Presidente chinês, Xi Jinping, como sinal de abertura. Mas, mesmo com países como Portugal, com fluxos bilaterais de comércio reduzidos (5,6 mil milhões de dólares em 2017, nos dados das Alfândegas da China; menos nos valores do INE), há barreiras por eliminar. O licenciamento técnico sanitário das exportações de carne de porco portuguesa para o país é um dossiê negociado há vários anos – até aqui sem resolução.
Em 2017, as exportações portuguesas para a China cresceram cerca de 25%, atingindo 843,3 milhões de euros, nos dados do Instituto Nacional de Estatísticas. Mas já este ano as vendas seguem em tendência inversa, com uma quebra até agosto de 18,3%. As exportações dos primeiros oito meses foram de 451,8 milhões de euros.
Nas relações de investimento entre os dois países, este ano fica marcado até aqui pela compra dos seguros Goupama em Portugal pela China Tianying, uma empresa a operar na gestão de resíduos, e pela tentativa frustrada do China Construction Group de entrar no capital da Lusoponte.
Mas continua também de pé a oferta pública da China Three Gorges pela totalidade do capital da EDP, tendo a elétrica participada pela CTG estado até aqui sob pressão na discussão sobre eventuais rendas excessivas recebidas nos contratos com o Estado.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, e o secretário de Estado da Internacionalização, Eurico Brilhante Dias chegam no entanto a Pequim após uma remodelação que mudou os principais intervenientes governamentais nos processos da energia, e com a discussão das rendas da elétrica suspensa na Assembleia da República para que os deputados tenham mais tempo para análise do Orçamento do Estado.
O encontro em Pequim acontece também numa altura em que Lisboa se prepara para assinar um memorando para a inclusão de Portugal na iniciativa Faixa e Rota chinesa, revelou Augusto Santos Silva este fim de semana, em Macau. A Faixa e Rota é um programa de iniciativa da China para promoção do investimento internacional em infraestruturas, no âmbito do qual Portugal espera atrair interessados para a expansão do Porto de Sines.
Além de Santos Silva, que copreside à reunião com o ministro do Comércio chinês, Zhong Shan, está também em Pequim o secretário de Estado da Internacionalização. Eurico Brilhante Dias vai reunir-se com responsáveis do Banco Asiático de Investimento em Infraestruturas e do Fundo China-Países de Língua Portuguesa. A visita a Pequim servirá ainda para preparar a deslocação a Portugal de Xi Jinping, marcada para os dias 4 e 5 de dezembro.
Pode o PIB chinês abalar o mundo inteiro?
Era 2015. O Banco Mundial dava à economia chinesa o título de maior do mundo, em paridade de poder de compra, mas esta conhecia um marco mínimo: no ano anterior tinha crescido só 7,3%, o nível mais baixo em mais de duas décadas. A expansão nunca mais foi acima dos 7% e, a isto, Pequim chamou o novo normal. De seguida, foi normal ver os preços do petróleo em queda – menos 70% até 2016. E o crescimento do volume de trocas comerciais abrandar para 1,3%.
Nos anos de 2014 a 2016, a China reduziu as importações em mais de 200 mil milhões de dólares. Com a quebra da procura e a descida do valor do crude, por exemplo, Angola viu as suas vendas ao país descerem de 27,5 mil milhões de dólares para menos de metade – 12,3 mil milhões de dólares. E, no mesmo período, as exportações portuguesas para a Angola passavam de perto de 4,5 mil milhões de dólares para apenas cerca de 1,7 mil milhões.
A China comprou menos, algo que se sentiu primeiro nos exportadores de energia e nos países emergentes mais dependentes dela. Cerca de metade da quebra chinesa foi explicada pelo Fundo Monetário Internacional por uma redução no investimento, com quebra das compras ao exterior. E o país influenciou o resto do mundo ao fazer descer os preços das matérias-primas. Há dois anos, o Banco Mundial (BM) fazia equivaler a perda de um ponto percentual na expansão do PIB chinês a uma descida de 6%, ao longo de um período de dois anos, nos preços dos bens por transformar.
O petróleo e outros bens estão de novo em recuperação nos mercados mundiais. O BM projetou em abril, já após a entrada em vigor das primeiras tarifas da atual guerra comercial, uma subida de 19,8% na energia este ano, e de 8,6% para metais e minerais. Mas a China continua a ser um dos principais riscos negativos às perspetivas de crescimento mundial (3,7%, em baixa, nas previsões deste mês do FMI). Agora não só devido às vulnerabilidades do seu sistema financeiro, mas também devido ao agravamento geral das tarifas comerciais em que é principal visada.
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