Portugal foi o maior investidor estrangeiro no Ruanda em 2017, graças à obra do novo aeroporto internacional liderada pela Mota-Engil, e “tem mais oportunidades” para explorar, segundo um responsável do Conselho para o Desenvolvimento do Ruanda (RDB).
Inserido num mercado regional de 162 milhões de pessoas, o Ruanda, que tem no café a sua principal exportação, tenta dissociar-se da memória do genocídio que, em 1994, provocou a morte de mais de 800.000 pessoas, essencialmente tutsis, dinamizando vários setores, entre os quais a agricultura, a construção e o turismo.
Entre 2017 e 2018, o país viu a economia crescer o equivalente a 8,9% do Produto Interno Bruto (PIB), mais 3,4% do que o período homólogo anterior, sobressaindo como um modelo do desenvolvimento económico em África, apesar de algumas vozes críticas da liderança musculada do presidente Paul Kagame que já vai no terceiro mandato.
Em entrevista à Lusa, em Kigali, o responsável do departamento de Investimento, Promoção e Marketing do RDB, Philip Lucky, assinalou que “existe um interesse significativo de empresas que procuram o Ruanda em busca de oportunidades de negócio”.
No caso de Portugal, a maior oportunidade surgiu com o novo aeroporto de Bugesera que a Mota-Engil começou a construir em 2017, num acordo de Parceria Público-Privada (PPP) com o Governo ruandês, com conclusão prevista para 2020.
O projeto, avaliado em mais de 400 milhões de dólares (375 milhões de euros) catapultou Portugal para o topo do investimento estrangeiro em 2017, correspondendo a 24% do total dos dez maiores investidores (além de Portugal, Reino Unido, Índia, Emirados Árabes Unidos, Alemanha, China, Uganda, Estados Unidos, Bangladesh e Espanha).
Philip Lucky admitiu que o investimento no novo aeroporto possa vir a duplicar, requerendo a entrada de novos parceiros: “o projeto é gigante. Ter uma única empresa envolvida pode não ser exequível, temos de ter outros parceiros. A Mota-Engil tem 75%, o governo tem 25%, se houver interesse (de outros parceiros), tentaremos acomodá-los para que partilhem os seus conhecimentos e apoiem o financiamento do projeto”.
Mas descontando o efeito pontual da Mota-Engil em 2017, as trocas comerciais e a presença portuguesa no Ruanda são incipientes. Em 2018, Portugal já nem sequer aparecia na lista dos dez maiores investidores, liderada pela Nigéria (com dois projetos 265 milhões de dólares).
No ano passado, Portugal não importou qualquer produto do Ruanda, ao contrário do que aconteceu em 2017, quando comprou 236 mil euros de café. Em contrapartida, as 23 empresas que exportam para o Ruanda conseguiram faturar 5,2 milhões de euros, vendendo essencialmente cerveja, máquinas e aparelhos e metais comuns.
“Não temos muitas empresas portuguesas no Ruanda, talvez por motivos históricos procurem mais outros países, como Angola ou Moçambique, por causa das ligações coloniais e sentirem mais proximidade”, assume o responsável da RDB.
E admite que é necessário melhorar o conhecimento sobre o Ruanda.
“Possivelmente não são muitos os portugueses que conhecem o Ruanda e provavelmente aquele que conhecem pensam no genocídio. Isso pode literalmente assustar as pessoas”, afirmou Philip Lucky, adiantando que a estratégia ideal seria abordar os potenciais investidores portugueses através de fóruns e workshops que sirvam de montra de oportunidades.
Entre estas, apontou a indústria, um dos setores estratégicos que o Ruanda está a promover para se tornar mais sustentável e menos dependente de importações.
“Pensamos essencialmente em produtos alimentares e agroindustriais, têxteis, materiais de construção. São algumas áreas em que as empresas portuguesas poderiam apostar”, sugeriu, destacando a relevância do mercado doméstico, com 12 milhões de pessoas, mas também do mercado regional dos países que integram a Comunidade da África Oriental (Quénia, Uganda, Tanzânia, Burundi, Ruanda e Sudão do Sul) com livre circulação de bens e serviços num bloco de 162 milhões de pessoas.
Sublinhou que é preciso “dar visibilidade” positiva ao Ruanda, realçando o posicionamento do país em vários índices internacionais como os da igualdade de género (maior percentagem de mulheres no parlamento, com 61%), o crescimento económico a rondar, em média, os 7,5% nos últimos dez anos, a taxa de desemprego que desceu para 14,5% em 2019 (16% em 2018), a taxa de literacia de quase 80% e a classificação de segundo país com mais facilidade em fazer negócios em África.
“Temos dado muitos passos para tentar mudar a narrativa e construir uma sociedade mais resiliente e coesa, com um país centrado nas pessoas”, assegurou Philip Lucky, acrescentando que “a liderança tem sido instrumental para concretizar estes objetivos”.
Segundo o responsável da RDB, as reformas implementadas em várias áreas ajudaram a identificar e desbloquear entraves aos negócios no Ruanda, num “esforço combinado” do Governo, do setor privado e do parlamento.
Além de contratos de desempenho e medidas de responsabilização (‘accountability’) na administração pública, Philip Lucky deu como exemplos de boa governação a implementação de mecanismos anticorrupção, como a contratação publica eletrónica (‘e-procurement’), que limita os contactos entre os fornecedores de bens/serviços e o cliente e as declarações obrigatórias de riqueza.
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