//“Portugal tem de interpretar o que está a mudar e ver onde se pode posicionar e investir”

“Portugal tem de interpretar o que está a mudar e ver onde se pode posicionar e investir”

Sem perceber quais são os mecanismos pelos quais se transmite esse dinheiro à economia, eu não consigo perceber qual é o efeito que ele tem na economia e, para perceber os mecanismos pelos quais esse dinheiro se transmite à economia, tenho que perceber o contexto produtivo, quais são as indústrias em que se está a apostar. Essas indústrias têm também que perceber o que está a chegar às pessoas, a que camadas de pessoas, porque há população que vai consumir sobretudo em bens de luxo e há população que vai ter tendência a consumir bens que podem ter um efeito multiplicador maior na economia.

A própria palavra, despejar dinheiro na economia, já tem uma carga negativa e já acontece há algum tempo. Observamos que os activos financeiros – ações, obrigações, derivados, etc – têm sido muito valorizados. Ou seja, muito do dinheiro que chega à economia tem estado a ser canalizado para investimento em activos que, pode-se levantar a questão: até que ponto é que estão a ser especulativos?

No caso dos fundos europeus, já está a ser despejado muito dinheiro na economia e, aparentemente, com muito pouco resultado, há muito tempo, por outras vias. O modo como é gasto tem a ver com uma questão que já remonta aos clássicos – o excedente é reinvestido em actividades produtivas ou é esbanjado em bens de luxo? Isto é que determina se a economia prospera ou não. Diga-se que Adam Smith, quando dizia isto, elogiava outros países e dava Portugal e Espanha como maus exemplos, estávamos em 1776.

Podemos estar a travar artificialmente o desemprego com estes apoios para acabar por prolongar esta situação no tempo? Segundo um estudo do Banco de Portugal e do INE, sem o ‘lay-off’ a destruição de emprego teria sido três vezes maior.

Shumpeter chamava a estes processos “destruição criativa”, era preciso algum processo de destruição de empresas e de emprego para que, aquelas que são mais eficientes, conseguissem depois sobreviver e ganhar faixas de mercados que eram deixadas pelas outras, mais ineficientes, que tinham desaparecido. Isso aumentava logo a inovação e eficiência da economia, porque as mais ineficientes e que estavam a ocupar espaço davam lugar às outras.

Opinião oposta tinha Keynes, que achava que o desemprego era um mal demasiado grave e que há um lado humano a ter em conta, dos custos humanos, que tem de se tentar combater o desemprego a todo o custo, independentemente do efeitos benéficos, supostamente, da destruição criativa de que falava o Shumpeter.

Amartya Sen também chamou a atenção para facto do desemprego ter não só custos económicos e sociais, mas também custos humanos muito elevados. As pessoas quando estão desempregadas sentem-se, logicamente, afectadas, podem entrar em depressão, o que não se resolve facilmente.

Em matéria salarial. Os patrões dizem que neste momento não aguentam o aumento do Salário Mínimo, o governo quer aumentar o poder de compra das famílias mas também já avisou que é difícil aumentar os salários do estado. Do ponto de vista económica, qual é o melhor remédio?

O aumento dos salários também aumenta o poder de compra das pessoas, portanto, tem sempre um efeito de estímulo sobre a economia. Principalmente, porque as pessoas que recebem menos rendimento são as que, geralmente, gastam uma maior percentagem do rendimento. Isto é, se aumentar o salário a alguém que ganha o SMN, essa pessoa para o ano vai continuar a gastas esse salário por inteiro. Se usar um milhão de euros para pagar a uma série de pessoas que estão a receber muito pouco, provavelmente esse milhão de euros no dia seguinte está na economia, porque essas pessoas precisam de o gastar. Portanto, a questão tem a ver com as empresas que não vão beneficiar muito desse aumento de procura, porque não produzem o tipo de bens essenciais que será procurado pelas pessoas que receberem esse salário e que, ao ver o salário aumentar, veem os seu custos aumentar sem as receitas aumentarem paralelamente.

Por outro lado, pode haver empresas que a sua estrutura de custos ou salário não seja tão importante, ou que consigam acomodar essa subida e que até, com o aumento de procura que possa ser gerado, porque direccionado para o tipo de bens que elas próprias produzem, possa até beneficiar dessa situação.

Portanto, um aumento de salário é sempre uma situação com efeitos diferenciados, conforme a estrutura de custos da empresa, no caso de ser mais intensiva em trabalho vai sofrer mais com o aumento dos salários, e também o tipo de produtos para o qual está ou pode vir a ficar vocacionada. Agora, com a crise, muitas empresas começaram a produzir desinfectante, máscaras, etc, coisas que não imaginavam.

Ver fonte

TAGS: