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O ano de 2022 foi marcado por um crescimento explosivo e recorde do comércio internacional português de mercadorias impulsionado pelo agravamento dos preços (inflação máxima sem precedentes na História recente na Europa e fora dela), indica o Instituto Nacional de Estatística (INE) que ontem revelou os dados relativos ao fecho do ano passado.
Mas tudo considerado, o défice comercial português de bens está agora num nível recorde e o seu peso em relação ao produto interno bruto (PIB) foi, em 2022, o mais elevado desde o tempo do governo PS de José Sócrates, mostram cálculos do Dinheiro Vivo com base nas referidas estatísticas atualizadas do INE.
Para calcular o referido peso assumiu-se a estimativa de PIB nominal mais recente da Comissão Europeia para o último ano.
Os números oficiais detalhados do PIB de 2022 serão divulgados no próximo dia 28 pelo INE.
O maior défice desde a crise da dívida
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Mas, para já, é possível aferir com elevada probabilidade que o rácio do défice comercial terminou o ano passado num valor equivalente a 13% do PIB anual.
É preciso recuar até 2008 para encontrar um grau de dependência externa maior face ao exterior. Há 14 anos, dois anos e meio antes da bancarrota, esse mesmo défice comercial chegou a ser de 14,2% da riqueza interna do país.
A dependência comercial de Portugal significa que as exportações, mesmo a crescer muito em valor, não chegam para cobrir as importações.
E que a força da inflação importada é muito elevada, seja por via dos preços da energia, mas também porque outros bens também estão a ser adquiridos a custos muito elevados e nunca vistos na História recente da economia portuguesa.
Em 2022, as exportações de mercadorias aumentaram mais de 23% no ano passado, o maior valor de que há registo.
As importações também bateram o recorde da série do INE, com um salto de 31%. Isto em cima do aumento de 22% registado em 2021.
A diferença (défice) entre vendas e compras internacionais ascende a 30,8 mil milhões de euros (valores de 2022).
Diz o INE, que no conjunto do ano de 2022, como referido, “as exportações e as importações aumentaram 23,1% e 31,2%, respetivamente (+18,3% e +22,0% em 2021, pela mesma ordem), tendo o défice da balança comercial aumentado 11,256 mil milhões de euros para 30,783 mil milhões de euros”.
Mesmo excluindo a parte dos combustíveis e lubrificantes, as exportações e as importações cresceram a ritmos assinaláveis: “respetivamente, 19,6% e 23,2% em 2022 (+16,9% e +18,6% em 2021, pela mesma ordem)”, explica o INE.
Assim, o défice da balança comercial excluindo essa parte da energia “situou-se em 19,205 mil milhões de euros, aumentando 5,386 mil milhões de euros face a 2021”.
Produto a produto
Uma pesquisa rápida nas listas de produtos principais mostra que as exportações portuguesas de combustíveis e lubrificantes, um dos maiores setores exportadores de Portugal, engordaram mais de 83% em 2022, impulsionado pela escalada da inflação (das cotações do petróleo e do gás).
Mas Portugal aqui reafirma a sua dependência e alta exposição a esse problema inflacionista.
O custo do que o país precisou de importar em energia praticamente duplicou no ano passado: a subida superou os 95%.
Ainda nas exportações, os dados do INE evidenciam aumentos consideráveis em valor em segmentos da alimentação, como “gorduras, óleos animais, vegetais”. O valor vendido superou os 40% face a 2021.
A dupla “pasta de madeiras e papel” registou um avanço similar, mais de 38%.
No outro lado da balança, aparecem aumentos avassaladores no custo das importações de vegetais (30% mais caras do que em 2021), das peles e couros (mais 46%), na dupla madeira e carvão (mais 35%), no calçado (agravamento de quase 40% nestas importações e logo num setor onde Portugal é competitivo e proeminente a nível global).
Destaque ainda para o encarecimento da fatura em “material de transporte”, onde a subida do valor importado chegou a 30%.
Recentemente, o Banco de Portugal analisou estas dinâmicas do comércio externo e no último boletim económico conclui, em jeito de alerta, que “a situação atual reflete, em larga medida, uma perda de termos de troca [os preços das exportações não compensam os das exportações] em 2021-22 que assume no caso português e, em termos acumulados, uma magnitude sem precedente nas duas últimas décadas”.
“Esta evolução traduz-se numa perda de rendimento real da economia que deve ser partilhada por todos os agentes” pelo que é necessário “assegurar que os aumentos dos salários e das margens das empresas não geram pressões inflacionistas persistentes, com consequências negativas para a competitividade e a estabilidade macroeconómica”, diz o banco central governado por Mário Centeno.
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