Em menos de 30 dias estará fechado o processo de entrada da Santa casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) e dos restantes novos acionistas no capital da Caixa Económica Montepio Geral (CEMG). A garantia é dada por António Tomás Correia, presidente da Associação Mutualista Montepio Geral, que é dona do banco, em entrevista ao A Vida do Dinheiro, do DV/TSF. Candidato a um quarto mandato na liderança da Associação, Tomás Correia tem “a certeza absoluta” de que os processos em curso no Banco de Portugal e na justiça não o vão impedir de cumprir um novo mandato. Em termos de perspetivas, indica que os resultados da Mutualista em 2018 deverão ser “marginalmente positivos”, depois de lucros de 831 milhões de euros em 2017.
Porque se recandidata? Não era tempo de dar lugar a sangue novo na Associação?
O que posso dizer é que houve o desenvolvimento de um trabalho muito intenso ao longo dos últimos seis meses sobre os desafios e as oportunidades que se colocam ao Montepio, para continuar a sua já longa história de 178 anos. A dada altura, a minha continuidade não era uma questão que eu visse como prioritária. Acontece que temos um desafio para os próximos tempos que é muito exigente, que é a adaptação da nossa Associação às regras aplicáveis aos seguros. Quando estamos a falar de 12 anos de transição para a aplicação das regras do setor segurador, logo concluiremos que estamos perante um prazo muito exigente.
Considera que a sua candidatura será a mais bem preparada para lidar com essa transição?
Aceitei aquilo que muitas pessoas, muitos mutualistas, me foram dizendo e, portanto, convenci-me, de que reúno condições, não só pelo conhecimento que tenho da regulação da atividade seguradora, das exigências que se colocam em termos de solvência I e II e conheço muitíssimo bem aquilo que é um balanço e o modo como se expressa no balanço…
O novo código das mutualistas tem critérios apertados em relação à idoneidade dos gestores. Porquê esta candidatura quando não se sabe se os processos que tem no Banco de Portugal e no Ministério Público podem eventualmente impedi-lo de liderar a associação no futuro?
Sempre tenho dito, e repito, que tenho a certeza a absoluta de que quando olho para toda a regulamentação do código mutualista, e para aquilo que me vai sendo imputado em muitas circunstâncias, falsamente, não impedirá que possa continuar a desenvolver a minha atividade na Associação Mutualista, como se comprovará dentro de muito pouco tempo, quando os novos órgãos sociais tomarem posse.
Mas isso porque está confiante no resultados desses processos ou porque no novo código pode eventualmente contestar-se o ter efeitos retroativos ou não?
Não, não. Quer tenha efeitos retroativos ou não, o novo código não é impeditivo da minha candidatura e nenhuma das situações que alegadamente me são imputadas impede o exercício de funções. Costumo dizer: qualquer estudante de Direito em início de atividade se ler o código mutualista e tudo o que anda à volta das questões do fit and proper, resulta de má-fé ou de uma grande ignorância à volta da matéria.
Não existe o risco de estar a fazer a Associação perder tempo e a envolver-se em nova polémica com os danos de imagem que daí podem vir?
De maneira nenhuma. A Associação não perde tempo com isso.
A entrada de outras instituições, e em particular da Santa Casa de Lisboa, no capital do Montepio, já foi formalizada?
Estamos em fase de finalização do processo de entrada das diversas candidaturas. Anunciámos, no início do verão, que havia 50 instituições da economia social disponíveis para entrar no capital da Caixa Económica. No entanto, essa disponibilidade tem de ser ainda autorizada pelas respetivas assembleias gerais. Essas ocorrem ao longo do mês de novembro e nos primeiros dias de dezembro. E o que sabemos hoje é que a generalidade das assembleias têm vindo a cumprir com essa formalidade, a autorizar. E estamos a fechar o processo. Em menos de 30 dias teremos o processo fechado.
Quanto capital é que foi vendido? No mês passado, o Público noticiou que só tinham chegado ao Montepio 91 mil euros.
Não sei onde é que o Público vai buscar as informações. Sabe mais do que eu. Eu não sei. De qualquer modo, não tenho dúvidas de que do ponto de vista do capital com que vão participar as diversas instituições estamos a falar de uma marginalidade, de um montante muito pequeno. Nem nunca isso foi preocupação para nós.
Mas essa participação corresponde a quanto efetivamente?
Seguramente, a menos de meio milhão de euros. Portanto, para um capital social emitido de 2420 milhões, estamos a falar de uma marginalidade. Bem sei que na narrativa da comunicação social o que importava era que o Montepio precisasse de grandes quantidades de capital para se dizer que vieram as misericórdias e as mutualidades salvar o Montepio. Sempre dissemos que essa era uma narrativa falsa, que não precisávamos de capital e que cumpríamos com os requisitos.
Mas essa abertura de capital vai ter efeitos práticos ou será que a montanha pariu um rato?
Vai ter grandes efeitos práticos. Porque ela consubstancia um quadro emocional correspondente a uma necessidade que o país tem, de ter um grande grupo financeiro da economia social. Diz-se que há organizações da economia social que não estão interessadas. É uma ideia boa, é uma ideia de que o sistema financeiro precisa. É uma ideia de que o país precisa e, portanto, é uma ideia que vai vingar.
Já li declarações suas em que dizia que acreditava que Portugal ainda ia ter um grande banco da economia social…
E vai ter….
Além do Montepio existe uma outra instituição, o Crédito Agrícola, com a qual o Montepio poderia ter a ideia de… tem contactos com o Crédito Agrícola sobre essa hipótese?
O Crédito Agrícola é um grande grupo financeiro da economia social, de natureza cooperativa. Nós somos parceiros em algumas atividades. Temos tido algumas trocas de impressões. Enfim, é preciso dar tempo ao tempo. O caminho não se faz todo de uma vez. Já me têm perguntado como é que vejo uma eventual parceria com o Crédito Agrícola. Bom, vejo que a parceria será aquilo que os associados do Montepio e do Crédito Agrícola quiserem, mas não ponho nisso uma pressão. Agora, se os associados não quiserem, isto nunca andará. É possível continuar a dar passos sem pôr em causa a identidade das organizações.
Foi acusado por dois conselheiros, Carlos Areal e Viriato Silva, de sonegar informação no relatório de atividade no primeiro semestre. Houve ou não alterações no relatório?
A Associação não fecha contas semestrais. Apresentamos contas anualmente. O que divulgamos é informação de gestão relativa ao desempenho da Associação. E a informação de gestão que divulgamos no âmbito do conselho geral é exaustiva, completa e serve perfeitamente para acompanhar totalmente a atividade. Isto o que diz respeito não é à atividade semestral, mas à atividade mensal. Todos os meses distribuímos informação adequada para que saibam aquilo que se passa. Divulgamos e fazemos aprovar as nossas contas individuais até 31 de março e consolidadas logo que as organizações do grupo forneçam dados para a consolidação, nomeadamente entre maio e junho. E também divulgamos as contas consolidadas nessa altura, de uma forma exaustiva. Aliás, é difícil encontrar relatórios tão transparentes como os que produzimos. Somos de grande transparência e essas acusações inserem-se mais num quadro de campanha e de falta de respeito pela Associação, que os próprios sabem bem que corresponde a uma falsidade. Mas isso já não me surpreende.
A Associação teve lucros de pouco mais de 830 milhões de euros em 2017, depois de prejuízos de 150 milhões em 2016. Quais são as perspetivas para este ano?
Termos resultados marginalmente positivos. Não é coisa que nos preocupe. O Montepio foi, provavelmente, a instituição que mais sofreu com a crise. O Montepio nunca entrou em programas de especulação, nunca comprou obrigações de subprime, nunca viram, porque não encontravam, o Montepio comprar dívida pública grega ou italiana. Mas viram o Montepio comprar dívida pública portuguesa. Por isso, em 2013, o Montepio cresceu muito na sua carteira de dívida pública portuguesa. Fechamos com 3650 milhões de dívida pública, o que representa mais do que triplicar a dívida pública portuguesa que tínhamos no início do ano. Quando houve desemprego, os portugueses deixaram de poder pagar os créditos e o mesmo aconteceu nas empresas, e isso teve consequências na nossa conta de exploração e na base de capital da CEMG. A Associação, de forma responsável, capitalizou a sua caixa económica. Não pediu ajuda ao Estado nem para capital nem para liquidez. Fomos responsáveis, estivemos à altura das nossas obrigações, não provocamos qualquer lesão aos interesses dos nossos associados e clientes. Fala-se muito de lesados mas não há lesados do Montepio, nunca houve ao longo da nossa história e hoje estamos aqui preparados para o futuro.
As contas de 2017 foram influenciadas por créditos fiscais. Vai voltar a recorrer a esta opção contabilística?
Não é uma opção contabilística, é uma realidade. Deixamos de cumprir com uma alínea que nos conferia o direito de ter isenção. Ouvimos a Autoridade Tributária, que confirmou a nossa visão, e tivemos de apresentar as nossas contas e apurámos não créditos fiscais mas ativos por diferenças temporais, que é uma coisa diferente porque não prescrevem.
Incomoda-o ver o Montepio envolvido na polémica do colapso do GES? O Público noticiou que a CEMG emprestou 8,5 milhões de euros ao construtor que deu a Ricardo Salgado um valor igual.
Não faço ideia. Quando se tem uma carteira de crédito que, na altura, devia andar pelos 16 mil milhões, estarmos aqui a falar de uma operação de 8,5 milhões… não faço ideia. Uma coisa digo: não tenho dúvidas de que os procedimentos adotados pelo Montepio, sempre e ao longo do tempo que estive à frente da CEMG, respeitaram as normas regulatórias, os procedimentos internos e estes também respeitam as normas regulatórias.
O Público também avançou que autorizou mais de dez empréstimos ao construtor. Há aqui algum tipo de favorecimento?
Nunca atuei no sentido de favorecer seja quem for.
Nas eleições, uma das promessas das outras listas é baixar os salários na administração. Vai baixar os salários?
Quando alguém diz que vai fazer e acontecer é porque não quer respeitar…, se se sente dotado de um poder que os estatutos não conferem, não respeitando a assembleia geral e a comissão de remunerações. Eu não me atrevo a dizer isso.
Um dos temas que vem sempre à baila é a presença da maçonaria no Montepio. É a maçonaria que manda no Montepio?
Não, quem manda no Montepio são os associados. Se me perguntar se a corrente maçónica tem alguma participação no Montepio, não tenho dúvida de que sim. Todas as correntes de pensamento se manifestam e desenvolvem naquela grande Associação. Se me perguntar se há outras organizações que também têm lá os seus representantes, também existem.
Que outras organizações?
Não sei. Oiço falar em muita gente ligada à Igreja, e ainda bem que participam na vida do Montepio. A única coisa que posso dizer é que eu não sou maçom, ao contrário do que se diz por aí. Nunca fui, mas tenho grandes amigos maçons por quem tenho muita consideração. Também não sou do Opus Dei, mas também tenho grandes amigos. Assim como tenho amigos benfiquistas, sportinguistas,… não sou uma pessoa sectária, trabalho com todos.
Há um blogue que tem agitado as águas nesta campanha, o Albergue Espanhol, que tem feito ataques a jornalistas com algumas acusações. É um blogue considerado pró-Tomás Correia. Conhece este blogue?
Têm-me chegado notícias da existência desse blogue. Admito até que o nome tenha sido suscitado por uma declaração minha. Alguém gostou da expressão e criaram o blogue, mas não sei quem o desenvolve, não participo nas redes sociais, não tenho tempo para isso.
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